A
entrevista do diretor-geral da PF, Rogério Galloro, ao Estado de S. Paulo
revelando que sofreu pressões de Sérgio Moro, alerta da procuradora-geral da
República, e ordem verbal do presidente do TRF-4, Thompson Flores, para
desobedecer a legítima decisão judicial de soltar Lula, bem como a nota na
revista Veja que menciona declaração do desembargador Gebran Neto a amigos,
dizendo ter agido “fora da letra fria lei” para “evitar o mal maior que seria
soltar Lula”, são reveladoras do alto grau de politização do Judiciário e do
Estado de exceção seletivo que se criou no Brasil pós-golpe.
Para
prender e manter o principal candidato popular na cadeia criou-se um vale-tudo,
o qual inclui condenação sem provas, o atropelamento de prazos processuais e de
direitos fundamentais, manobras no STF, a espionagem de escritórios de
advocacia, o descumprimento de decisões legais e até “ordens” dadas por
telefone. Prevê-se que, em breve, o nosso sistema judicial, quando convier
politicamente, funcionará com base no whatsapp.
Entretanto,
como diria o shakespeariano Polônio, há método nessa loucura jurídica, nesse
faroeste legal.
E
o método parece importado.
Há
muito se sabe que a operação Lava Jato sofre influência destacada de
autoridades norte-americanas. Nada contra uma cooperação saudável, simétrica e
transparente entre países para combater a corrupção. Aliás, foram os governos
do PT que deram maior ensejo a essa cooperação internacional.
Contudo,
há algo de estranho nessa cooperação específica com os EUA.
Ao
contrário do que determinam o texto do acordo de cooperação Brasil /EUA nessa
área e os princípios do nosso direito, tal cooperação vem se dando muitas vezes
de modo informal, conforme as idiossincrasias de procuradores de ambos os
países.
Aparentemente,
muita coisa se resolve com base em telefonemas e contatos pessoais, como no
caso das manobras para impedir a libertação de Lula.
Não
se trata de devaneios paranoicos surgidos da URSAL. Isso foi dito publicamente
por altas autoridades norte-americanas envolvidas nessas atividades.
Tais
“confissões” mostram não apenas que as regras do acordo vêm sendo
desrespeitadas, mas também que as autoridades norte-americanas conduziram a
construção da Lava Jato e o processo relativo ao apartamento triplex.
Com
efeito, em manifestações públicas proferidas em 19 de julho de 2017, o Sr.
Kenneth Blanco, então Vice-Procurador Geral Adjunto do Departamento de Justiça
dos Estados Unidos (DOJ), e o Sr. Trevor Mc Fadden, então Subsecretário Geral
de Justiça Adjunto Interino daquele país, explanaram sobre cooperação baseada
em “confiança” e, por vezes, fora dos “procedimentos oficiais”, realizada entre
as autoridades norte-americanas e os Procuradores da República da Lava Jato.
Afirmou
o procurador Blanco que “tal confiança” permite que promotores e agentes tenham
comunicação direta quanto às provas.
“Dado
o “relacionamento íntimo” entre o Departamento de Justiça e os promotores
brasileiros, não dependemos apenas de procedimentos oficiais como tratados de
assistência jurídica mútua, que geralmente levam tempo e recursos consideráveis
para serem escritos, traduzidos, transmitidos oficialmente e respondidos”,
afirmou.
O
pior é que tal cooperação baseada em “relacionamento íntimo”, que geram atalhos
processuais à margem do que dispõe a letra fria do acordo de cooperação e das
leis, estão cercadas de providencial sigilo.
O
ex-presidente argentino Menem talvez dissesse que o tal “relacionamento íntimo”
poderia incluir “relaciones carnales”, as quais se dariam em sombras jurídicas
e zonas cinzentas processuais.
Para
desfazer essas pertinentes inquietações, alguns parlamentares da oposição,
entre os quais o combativo Deputado Paulo Pimenta, prepararam uma série de
requerimentos de informação e pedidos de acesso à informação, com base na Lei
de Acesso à Informação, no intuito de jogar um pouco de luz nos obscuros e
tortuosos meandros de tal cooperação.
Em
vão. Boa parte dos requerimentos não obtiveram resposta e os que foram
respondidos encaminharam informações incompletas e evasivas.
No
caso do Ministério da Justiça, por exemplo, que é a Autoridade Central
brasileira que deveria coordenar a cooperação entre e EUA em matéria penal, a
resposta afirma que “a Autoridade Central para a Cooperação Jurídica
Internacional, não pode manifestar-se, inclusive sobre a mera existência ou não
de pedido de cooperação jurídica internacional em determinado caso, porque
poderá por em risco uma fiscalização ou investigação em andamento, sem que as
autoridades competentes por tais procedimentos tenham autorizado”.
Além
disso, o MJ afirma ainda que a Autoridade Central não tem condições materiais
ou competência (atribuição legal) para analisar o mérito das informações
contidas nas medidas, não lhe competindo, por conseguinte, classificar
determinada informação como sigilosa ou considerá-la pública.
A
resposta do Ministério Público às indagações vai à mesma linha.
Questionado
sobre a presença de procuradores norte-americanos no Brasil, o Ministério
Público Federal reconheceu, em sua resposta, que o Departamento de Justiça dos
Estados Unidos da América formulou pedidos de cooperação ao Brasil, vinculados
a investigações sigilosas ocorridas em seu território, relacionadas à empresa
Odebrecht e a atos de corrupção transnacional sujeitos à sua jurisdição e que
nas mencionadas solicitações de assistência, foi requerida a presença de
agentes públicos estadunidenses em território brasileiro durante a realização
das diligências rogadas.
Porém,
a resposta afirma que cumpre asseverar que a identidade dos agentes
estrangeiros e o conteúdo dos pedidos de cooperação estavam revestidos de
sigilo.
Ou
seja, não podemos saber nada de significativo sobre tal cooperação.
Tais
respostas parecem não levar em consideração que, no caso dos requerimentos de
informação, devidamente aprovados pelo Congresso Nacional ou suas comissões,
trata-se de atribuição constitucional do Poder Legislativo, que que não pode
ser limitada por outro poder.
De
fato, o artigo 50, § 2º, da CF, que regulamenta esse poderoso instrumento de
controle, tem a seguinte redação:
2º As Mesas da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal poderão encaminhar pedidos escritos de informação a Ministros de
Estado ou a qualquer das pessoas referidas no caput deste artigo, importando em
crime de responsabilidade a recusa, ou o não-atendimento, no prazo de trinta
dias, bem como a prestação de informações falsas.
Ora,
a Constituição não delimita que as informações requeridas por esse instrumento
sejam apenas informações públicas ou desclassificadas. Se assim fosse, tal
instrumento constitucional seria inteiramente desnecessário.
Bastariam
consultas ao Diário Oficial para o Congresso Nacional exercer seu dever
constitucional de controlar o Poder Executivo.
Na
realidade, pelo instrumento constitucional do requerimento de informação, os
outros poderes estão obrigados a enviar
toda e qualquer informação requisitada, mesmo que sigilosa.
Assim,
o Congresso Nacional já recebeu inúmeras vezes informações sigilosas
requisitadas ao Poder Executivo. Nesses casos, o detentor de mandato popular e
o Congresso Nacional se comprometem, obviamente, a não torná-las públicas.
Portanto,
o sigilo não pode ser alegado para sonegar informações ao Congresso Nacional,
em seu exercício constitucional de controle e fiscalização do Poder Executivo.
Essa
preocupação em cercar de sigilo a cooperação entre Brasil e EUA em matéria
penal só aumenta a suspeita de que tais atividades possam estar sendo
conduzidas com motivações geopolíticas e servindo a interesses que não são
propriamente os interesses nacionais.
Trata-se,
a bem da verdade, de uma cooperação que foi construída essencialmente por
interesses norte-americanos, conforme evidenciam informações provenientes dos
EUA.
De
fato, numa relação informal, feita sem a devida supervisão efetiva de
autoridades centrais, acabam predominando inevitavelmente os interesses da
Parte mais preparada, experiente, e que dispõe de maiores recursos.
Observe-se,
além disso, que, no campo econômico, tal operação contribuiu objetivamente para
destruir a cadeia de petróleo e gás, ensejou a venda, a preços aviltados, das
reservas do chamado pré-sal, solapou a nossa competitiva construção civil
pesada e comprometeu projetos estratégicos na área da defesa, com o relativo à
construção de submarinos.
O
enfraquecimento de empresas brasileiras, como a Petrobras, a Odebrecht, a
Embraer e outras favorece objetivamente interesses norte-americanos e de seus
aliados, quer pela eliminação de concorrentes, quer pela perspectiva de compra
facilitada de ativos estratégicos, como petróleo e gás, gasodutos, terras,
água, empresas de energia, empresas de alta tecnologia etc.
Já
no campo político, a operação Lava Jato demonstra ter tido papel significativo
no lamentável golpe parlamentar de 2016, que depôs a presidenta Dilma Rousseff,
sem a devida comprovação do cometimento de qualquer crime de responsabilidade,
como exige a Constituição brasileira de 1988.
Ademais,
tal operação vem tendo destaque na denominada guerra judicial (lawfare) contra
o ex-presidente Lula, a qual visa o objetivo claramente político de impedir a
sua candidatura para as eleições de 2018.
Saliente-se
que a candidatura de Lula é a que tem maior potencial para deter a implantação
do projeto neoliberal e antinacional do golpe, que favorece interesses
estrangeiros e agride frontalmente a soberania nacional.
No
mundo inteiro, cresce a convicção de que o ex-presidente sofre clara perseguição
política, juridicamente infundada. Trata-se de fato que está se tornando claro
para todos. Lula é preso político.
O
que ainda não está claro é: Lula é um preso político do Brasil ou dos EUA?
http://www.contextolivre.com.br/2018/08/lula-e-preso-politico-do-brasil-ou-dos.html
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