O
princípio do interesse da criança deve nortear a condução de processos que
tratam do reconhecimento de multiparentalidade. A decisão é da 3ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça ao negar recurso de uma mãe que pretendia
assegurar que sua filha tivesse os pais socioafetivo e biológico reconhecidos
concomitantemente no registro civil.
A
multiparentalidade é uma possibilidade jurídica, mas, mesmo havendo exame de
DNA que comprovava o vínculo biológico, os ministros entenderam que essa não
seria a melhor solução para a criança.
O
relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, afirmou que concomitância de
partenalidades não é uma regra. Segundo ele, só possível o reconhecimento
quando houver circunstâncias fáticas que a justifique, "não sendo
admissível que o Poder Judiciário compactue com uma pretensão contrária aos
princípios da afetividade, da solidariedade e da parentalidade responsável”.
Acompanhado
de forma unânime pelo colegiado, o voto do relator levou em conta as conclusões
das instâncias de origem acerca do estudo social produzido durante a instrução
do processo. A ação, proposta em nome da filha menor representada por sua mãe,
pretendia a retificação do registro para inclusão do pai biológico. A menina
havia sido registrada pelo homem que vivia em união estável com a mãe, o qual,
mesmo sem ter certeza da paternidade, optou por criá-la como filha.
De
acordo com o estudo social, o pai biológico não demonstrou nenhum interesse em
registrar a filha ou em manter vínculos afetivos com ela. No momento da
propositura da ação, a mãe, o pai socioafetivo e a criança continuavam morando
juntos. Além disso, ficou comprovado no processo que o pai socioafetivo
desejava continuar cuidando da menina.
Conforme
a conclusão das instâncias ordinárias, a ação foi movida unicamente porque a
mãe pretendia criar uma aproximação forçada com o pai biológico.
Ao
analisar o caso, o ministro Bellizze mencionou precedente do Supremo Tribunal
Federal segundo o qual “a paternidade socioafetiva, declarada ou não em
registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação
concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências
patrimoniais e extrapatrimoniais”.
No
entanto, observou o relator, esse reconhecimento concomitante é válido desde
que prestigie os interesses da criança, o que não ficou demonstrado no
processo. “O melhor interesse da criança deve sempre ser a prioridade da
família, do Estado e de toda a sociedade, devendo ser superada a regra de que a
paternidade socioafetiva prevalece sobre a biológica, e vice-versa”.
Bellizze
destacou que a doutrina e a jurisprudência preconizam que a prevalência do
interesse da criança é o princípio que deve nortear a condução dos processos em
que se discute o direito à manutenção dos vínculos afetivos ante o direito ao
estabelecimento da verdade biológica.
Segundo
o ministro, as instâncias ordinárias entenderam que a demanda foi proposta
exclusivamente no interesse da mãe. “Assim, reconhecer a multiparentalidade no
caso em apreço seria homenagear a utilização da criança para uma finalidade
totalmente avessa ao ordenamento jurídico, sobrepondo o interesse da genitora
ao interesse da menor”, disse Bellizze.
O
relator destacou, porém, a possibilidade de que a própria filha reivindique na
Justiça o reconhecimento da multiparentalidade no futuro, caso o deseje:
“Deve-se ressalvar o direito da filha de buscar a inclusão da paternidade
biológica em seu registro civil quando atingir a maioridade, tendo em vista que
o estado de filiação configura direito personalíssimo, indisponível e
imprescritível, que pode ser exercitado, portanto, sem nenhuma restrição,
contra os pais ou seus herdeiros.”
Com
informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista
Consultor Jurídico
https://www.conjur.com.br/2018-abr-26/reconhecimento-multiparentalidade-depende-interesse-crianca
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