domingo, 29 de abril de 2018

SÓ FALTA UM CADÁVER. Por Helena Chagas


Sempre odiei os arautos do caos, os profetas da catástrofe, as cassandras – como se dizia antigamente – que ficavam vendo crises institucionais e golpes em cada esquina. Estão quase sempre errados, ainda bem, e podemos dormir tranquilos porque a nossa democracia é forte. Que Deus nos ouça. Só que, a esta altura do campeonato, depois dos tiros disparados contra o acampamento da turma do Lula em Curitiba, e de alguns outros sinais de radicalização daqui e dali, não há como evitar certa  inquietude.

Parece que alguém está querendo um cadáver, e pode ser que, até outubro, consiga. Algo está muito errado na hora em que a política começa a ser feita com tiros –  e esta não foi a primeira vez nos últimos tempos, se lembrarmos dos ataques à caravana lulista há algumas semanas. Os tiros paranaenses deste fim de semana feriram uma pessoa gravemente e uma outra de forma mais leve. Ninguém morreu, ainda bem, e se as investigações seguirem o roteiro habitual não se saberá de onde, nem de quem, partiram os disparos. A vida seguirá até o próximo ato.

Há poucas dúvidas de que haverá um próximo ato, sabe-se lá onde e contra quem. De repente, temos a sensação de estar dentro de um paiol de pólvora, com todas as autoridades e instituições junto. E agora?

As autoridades da Lava Jato e do Judiciário perceberam que prender o ex-presidente da República e maior líder de massas da história recente não foi exatamente um passeio. Sobretudo num momento em que tantos outros, acusados de crimes envolvendo importâncias milhares de vezes maiores e flagrados em cenas vexatórias ligadas a pacotes e malas de dinheiro e a contas no exterior, continuam livres e soltos. Agora, o pessoal de Curitiba não sabe bem o que fazer com Lula – que, encarcerado, continua liderando as pesquisas.

No paiol, surgem outros focos de incêndio. Num deles, o Judiciário se estapeia a ponto de deixar a platéia confusa. Enquanto os ministros do STF se agridem, o juiz da primeira instância se coloca abertamente contra a decisão de instâncias superiores, às vezes sem cumpri-las. O fim de semana trouxe também uma nota indignada do desembargador Ney Bello, do TRF1, criticando o juiz Sergio Moro por se negar a cumprir habeas corpus por ele concedido suspendendo a extradição do empresário português Raul Schimidt.

Tão grave quanto gente levando tiros a esmo em acampamentos, juízes trombando e descumprindo decisões superiores é o bate-bocas entre o presidente da República investigado por corrupção – e chamando as investigações de perseguição – e os delegados da Policia Federal. A instituição foi desmoralizada e ofendida por seu chefe maior, associações de delegados responderam duramente ao presidente e fica tudo por isso mesmo.

Sem querer parecer cassandra nem dar razão aos catastrofistas que tanto detesto, isso não é normal…

Da jornalista Helena Chagas, no site Os Divergentes:


http://www.tijolaco.com.br/blog/so-falta-um-cadaver-por-helena-chagas/

Nenhum comentário: