sexta-feira, 23 de março de 2018

"DISCREPÂNCIA INJUSTIFICÁVEL". TRF-4 NÃO TEM CRITÉRIOS PARA APLICAR PENAS, AFIRMA DEFESA DE EMPRESÁRIO. Por Tadeu Rover



Como o Tribunal Regional Federal da 4ª Região não obedece a nenhum critério na aplicação das penas aos condenados da operação "lava jato", a execução da prisão deve esperar pelo menos pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça. De acordo com o advogado Antônio Sérgio de Moraes Pitombo, as penas para os mesmos crimes chegam a dobrar a depender do caso, mesmo que os textos das decisões sejam quase idênticos.

Os argumentos estão em Habeas Corpus impetrado pelo advogado em nome de seu cliente, o ex-vice presidente da Engevix Gérson Almada. Ele começou a cumprir a pena por sua condenação na terça-feira (20/3), com base no entendimento do Supremo Tribunal Federal de que as penas podem ser executadas depois do fim da jurisdição de segunda instância.

A prisão foi determinada pelo juiz Sergio Moro após o TRF-4 julgar os recursos do empresário. Moro havia condenado o empresário a 19 anos de prisão por corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Ao julgar os recursos, o TRF-4 aumentou a pena para 34 anos e 20 dias de prisão em regime fechado.

De acordo com Pitombo, a motivação para aplicação da pena foi reproduzida em outros três acórdãos do TRF-4 na operação "lava jato". Mas a mesma argumentação levou a penas completamente diferentes.

Enquanto um dos réus teve a pena base pelo crime de corrupção ativa fixada em 4 anos, Almada teve a sua fixada em 5 anos, e o outro, em 6 anos. "Como é possível que a exata mesma fundamentação seja fornecida para a fixação de penas tão distintas, quantitativamente, umas das outras?"

A defesa de Almada apresentou, junto ao HC, parecer do matemático da USP Sérgio Weschler que concluiu haver "uma severa heterogeneidade entre as sanções penais aplicadas". O professor identifica variação de quase 100% entre a pena mais baixa e a mais alta da "lava jato".

Fora da "lava jato"

A defesa de Almada mostra ainda que as penas aplicadas na operação "lava jato" são bem maiores do que outras definidas pelo TRF-4 e até mesmo pelos tribunais superiores.

No mensalão, José Dirceu foi condenado a quase oito anos de prisão por nove atos de corrupção ativa. Gérson Almada pegou 22 anos por ter cometido o mesmo crime quatro vezes, aponta Moraes Pitombo.

Um dos exemplos citados é a Ação Penal 470, o processo do mensalão, julgado pelo Supremo Tribunal Federal entre 2012 e 2013. O ex-ministro José Dirceu foi quem recebeu a maior pena por corrupção ativa, 7 anos e 11 meses de prisão, por cometer o crime nove vezes. Já no caso de Gérson Almada, o TRF-4 o condenou pelo cometimento de quatro delitos de corrupção ativa a 22 anos e 2 meses de prisão.

"Que sua pena seja mais que três vezes mais alta que a maior pena pelo crime de corrupção aplicada naqueles autos desafia não apenas a lógica, mas as mais basilares garantias constitucionais", diz Pitombo.

A desigualdade entre os dois processos, aponta o advogado, aconteceu também no crime de lavagem de dinheiro. Na AP 470, o empresário Marcos Valério recebeu a pena mais alta por ter praticado o delito 48 vezes: 6 anos e 2 meses de prisão. Almada, por sua vez, foi condenado a 8 anos e 4 meses por 31 atos.

Cartas na mesa

Pitombo utiliza ainda condenações do próprio TRF-4 para mostrar a diferença dada ao caso da "lava jato". O tratamento desigual, em sua opinião, está relacionado à pressão social. "Nunca antes houve, no Brasil, caso criminal acompanhado tão de perto, em seus detalhes, pela sociedade", afirma.

Almada é acusado de ter pagado mais de R$ 15,2 milhões em propina a ex-diretores da Petrobras para viabilizar a contratação de obras em ao menos quatro refinarias da estatal.

No Habeas Corpus, impetrado no STJ, Pitombo afirma que não pretende discutir a decisão do Supremo que permite a execução provisória da pena. O objetivo é mostrar que a condenação de seu cliente não pode ser executada antes de os recursos aos tribunais superiores apontando esse descompasso sejam analisados.

O advogado diz não saber por que o tribunal age dessa forma, mas especula que a corte venha cedendo à pressão social — motivação não prevista em lei. "Os tribunais, em resposta às demandas criadas pela histeria social, flexibilizarem os parâmetros por eles próprios construídos, com o intento de impressionar os espectadores da persecução penal com penas que se aproximam à prisão perpétua", diz o advogado.

"Dolo intenso"

Para apoiar seus argumentos, a defesa de Almada anexou ao HC parecer do professor e ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr. No trabalho, ele afirma que os critérios adotados pelo TRF-4 contrariam a legislação. Um dos exemplos citados por Reale Jr. é o aumento de pena devido ao suposto "dolo intenso" de Almada.

"O dolo constitui dado integrante da ação delituosa e sua intensidade, maior ou menor, não pode ser uma razão em função da qual se reprova mais ou menos, não constituindo um referencial para se aquilatar a reprovabilidade", afirmou Reale Jr.

Tadeu Rover é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2018-mar-22/trf-nao-criterios-aplicar-penas-defesa-empresario

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