A
proposta de reforma trabalhista, encaminhada ao Congresso Nacional pelo governo
ilegítimo de Michel Temer, é a continuidade do golpe contra o povo brasileiro.
Após atacar as políticas sociais com a aprovação da PEC 55/16, que estabeleceu
o teto de gastos e o consequente congelamento dos investimentos em saúde,
educação, assistência social, agricultura familiar, segurança pública, moradia,
entre outras, por 20 anos, o governo se volta contra os direitos trabalhistas e
previdenciários da população, especialmente da mais empobrecida.
A
pretexto de modernizar a legislação, o governo busca o desmonte das conquistas
dos trabalhadores alcançadas nas últimas décadas à custa de muitas lutas. É no
mínimo contraditório promover uma “modernização” por meio de grandes
retrocessos.
Não
sou contra o aperfeiçoamento das leis trabalhistas, mas não é isso o que o
governo quer. Mudanças, quando necessárias, devem ser feitas para aperfeiçoar e
para conceder mais garantias e não para retirar direitos consagrados na
Constituição Federal e na legislação trabalhista. O projeto apresentado pelo
governo interessa apenas a um lado: do empregador.
Tratar
a atual legislação trabalhista, que data da década de 1940, como anacrônica e
defender que ela não condiz com a atualidade são grandes equívocos, pois
negligenciam inúmeras alterações sofridas pela lei ao longo destes mais de
setenta anos. Alterações pontuais até podem ser aceitas, porém desconsiderar a
importância dessas conquistas e de suas simbologias para os trabalhadores é uma
ação que podemos chamar de criminosa.
O
governo age como se a crise econômica fosse culpa dos trabalhadores. As propostas
apresentadas desde maio de 2016 penalizam os mais pobres e beneficiam os
grandes bancos e grupos econômicos.
Sem
realizar uma profunda reforma tributária, uma regulamentação do imposto sobre
as grandes fortunas e sem criar uma sistemática mais eficiente para o pagamento
de tributos, por exemplo, pouco se avançará para a superação da crise
econômica.
O
discurso governista focado nos interesses dos empresários parte da premissa de
que os direitos trabalhistas encarecem a produção, tiram competitividade e
oneram o setor produtivo. Ignora, desse modo, a realidade de que crise
econômica se combate com medidas de fomento à economia, especialmente aos
pequenos negócios, e não com a exploração da força de trabalho. Não há
registro, em nenhum outro país, de que a redução de direitos dos trabalhadores
tenha elevado a geração de empregos.
Outro
argumento utilizado pelo governo para justificar essa proposta é o grande
número de ações trabalhistas que tramitam na Justiça do Trabalho. Segundo
levantamento do Tribunal Superior do Trabalho, as principais causas de ações
judiciais são irregularidades no recolhimento do FGTS, reconhecimento de
vínculo empregatício, verbas de rescisão contratual e não pagamento de horas
extras. Exemplos clássicos de violação de direitos trabalhistas.
É
preciso ficar claro que o aumento do número de ações trabalhistas é causado,
principalmente, pelo descumprimento da legislação por parte das empresas e pelo
agravamento da crise econômica. Ou seja, o número de demandas na Justiça do Trabalho
é diretamente proporcional aos índices de desemprego. De outro lado, muitas
empresas que se encontram endividadas preferem as disputas judiciais como forma
de ganhar tempo e, assim, alongar o prazo para o pagamento das rescisões, que
só ocorrerá ao final da contenda judicial.
Entendemos
que, em vez de reduzir direitos para diminuir as ações trabalhistas, a Justiça
do Trabalho deveria ser fortalecida para tornar mais céleres as ações e mais
eficientes os julgamentos.
Na
visão do governo, o parcelamento das férias em até três vezes é visto como
modernização necessária, com pagamento proporcional aos respectivos períodos,
sendo que uma das frações deve corresponder ao menos a duas semanas de
trabalho. Essa mudança coloca em risco o direito do trabalhador de definir suas
férias, pois numa relação desigual entre as partes o empregador tenderá a
pressionar pelo parcelamento das férias do empregado de acordo com seus
interesses.
Outra
preocupação é a possibilidade de aumento da jornada de trabalho, que poderá
chegar a doze horas diárias, limitadas a 220 horas mensais. Ainda que na lei
esteja colocada como uma possibilidade, sabemos que essa flexibilização se
tornará a regra. Dessa maneira, os trabalhadores serão levados a jornadas mais
longas, porque a pressão que será exercida sobre eles os colocará em posição de
sujeição aos interesses da empresa.
O
ponto mais controverso diz respeito à prevalência do negociado sobre o
legislado. A Constituição Federal, em seu artigo 7º, já dispõe sobre o
negociado com força de lei para aquele grupo de trabalhadores abrangidos pelo
acordo coletivo apenas quando se tratar de benefícios acima do piso legal, isto
é, não pode haver acordo em desfavor do trabalhador, exatamente o oposto do que
propõe o governo, que é permitir a redução de direitos.
Para
fundamentar a proposta, o governo utiliza a noção de que a medida valoriza a
organização sindical e a autonomia coletiva de trabalhadores, o que levaria a
acordos que traduziriam os interesses da coletividade. Ora, tal visão não leva
em consideração que a legislação permite a criação de organizações sindicais
sem a devida representatividade ou legitimidade, não podendo se fiar nessa
organização como organismo capaz de decidir direitos da coletividade,
modificando, inclusive, aqueles constitucionalmente garantidos.
Além
disso, mesmo em se tratando de uma organização de representação coletiva, a
força na mesa de negociação é desproporcional, sendo os empregadores muito mais
fortes, especialmente em épocas de crise, quando o principal objetivo dos
trabalhadores é a manutenção de seus postos de trabalho, e o do empregador, a
redução de gastos.
O
resultado das modificações propostas pelo projeto de lei será a precarização
das relações de trabalho, uma vez que os empregados perderão sua proteção
básica, ficando sujeitos aos humores do mercado para terem seus direitos mais
ou menos respeitados. Haverá a perda da segurança garantida em lei, podendo
tudo ser relativizado conforme o interesse do empresariado.
A
proposta atenta contra preceitos constitucionais, colocando o acordo coletivo
acima de determinações. Ao se permitir a majoração da jornada de trabalho além
das oito horas diárias, a flexibilização das férias, a desconsideração do
deslocamento e do intervalo intrajornada, por exemplo, rumaremos à deterioração
dos direitos de trabalhadores e trabalhadoras, especialmente aqueles com menor
qualificação.
Devemos
lembrar também que o princípio da ultratividade pode se tornar um duro golpe
contra os empregados, pois por meio desse conceito as normas coletivas são
incorporadas aos contratos individuais e, mesmo que o acordo coletivo termine
sua vigência, suas repercussões individuais permanecem e devem ser respeitadas
até que haja um novo acordo ou convenção coletiva que o modifique ou o suprima.
A
proposta do governo passa a valorizar o tempo parcial de trabalho hoje tido
como contrato excepcional para determinados serviços, colocando-o como
alternativa à jornada integral. Na prática, isso consiste em vantagem para o
empregador, afiná-lo mesmo diminuirá seus custos em relação aos salários, que
poderão ser reduzidos, bem como a base de incidência de contribuições, sem que
haja redução substancial das horas trabalhadas.
O
projeto também admite o uso de horas extras e a venda das férias, permitindo
jornadas mais longas e exaustivas para trabalhadores, o que pela legislação
atual é vedado na jornada parcial. Sem contar que isso não implicará melhoria
salarial, tampouco irá gerar novos postos de trabalho.
Além
de todos esses ataques, o governo avança nas articulações para aprovar o
projeto de lei nº 4.302/1998, que regulamenta a terceirização de todas as
atividades privadas, incluindo a administração pública. Essa modalidade de
contratação fragiliza ainda mais as relações de trabalho ao retirar direitos
fundamentais de trabalhadores, tornando os contratos precários e suscetíveis a
desrespeitos e rescisões unilaterais por parte do empregador.
A
quem interessa a reforma trabalhista proposta pelo governo de Michel Temer?
Certamente não é ao trabalhador brasileiro. O PL nº 6.787/16 que tramita na
Câmara dos Deputados a passos largos propõe alterações que desconstroem os
direitos históricos da classe trabalhadora no Brasil sob o pretexto de
modernizar a legislação e de ajudar o país a sair da crise econômica.
A
oposição defende na Comissão da Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados a
rejeição da proposta. É preciso mais cautela no estudo da matéria e mais tempo
para aprofundar o debate com as entidades dos trabalhadores, patronais e com os
especialistas.
Não
podemos permitir que uma matéria tão importante como essa tenha uma tramitação
acelerada e seja votada de maneira açodada. A comissão composta por maioria
governista imporá dificuldades à oposição para barrar o atropelo e o assalto
aos direitos do trabalhador brasileiro.
A
hora é de grande mobilização nacional. Somente com a união dos trabalhadores
teremos condições de derrotar o governo e sua base aliada que atuam a serviço
das elites econômicas e contra o povo brasileiro. É preciso resistir contra a
agenda do golpe!
*
Helder Salomão é deputado federal (PT-ES).
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