O
Brasil hoje gira em torno das chamadas “delações premiadas” deflagradas no
âmbito da operação Lava Jato. Especialmente o depoimento de Marcelo Odebrecht
chocou o país por mostrar a articulação de décadas entre empresas e políticos
que agiram de forma criminosa e se beneficiaram mutuamente de recursos públicos
para formar fortunas, muitas delas depositadas em contas no exterior.
Porém,
o que mais chocou nesse depoimento não foi exatamente o fato de se descobrir
que há corrupção, e sim a forma descarada, debochada, acobertada com que o
diretor de uma das maiores empresas do país revelou em rede nacional que a
construtora criou um departamento de propina e institucionalizou um esquema de
compra de pareceres com uma espécie de “advocacy” que mais que defender seus
interesses patrocinava vantagens e se aproximava de pessoas a fim de obter
benefícios.
Pelo
que tudo indica desvelou-se uma história de golpes bilionários que teve como
escudo o financiamento privado de campanhas eleitorais, desvirtuado para servir
aos interesses de indivíduos e grupos poderosos. É evidente a relação enraizada
entre a construtora e os políticos do PMDB e do PSDB, que a mídia se esforça
para acobertar, e a amplitude desse esquema, o qual parece impossível de se
realizar sem a omissão deliberad, também, de setores do judiciário.
Os
depoimentos poderiam ser vistos como positivos se a operação comandada pelo juiz
Sérgio Moro confirmasse a intencionalidade de combater a corrupção e fizesse
essa investigação de forma séria, isenta e guiada por objetivos públicos, não
partidários. A farsa da Lava a Jato é tamanha que, enquanto as investigações
estão em curso, as dependências da Polícia Federal, seus agentes e equipamentos
são colocados à disposição de um filme que tem por finalidade promover a
operação e cujos financiadores são mantidos em sigilo.
É
nítida a ausência de compromisso com os fundamentos republicanos e
democráticos, como a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o
pluralismo político em todo esse processo. O que tem caracterizado a “Lava a
Jato” é o populismo e o comportamento autoritário do juiz Sérgio Moro que
desrespeita os direitos e faz a incitação ao ódio.
Isso
se observou na condução coercitiva do ex-presidente Lula, no vazamento seletivo
e ilegal de depoimentos e também na manipulação de delatores com vistas a
proteger o presidente ilegítimo Michel Temer e outras figuras, especialmente do
PSDB, ou forjar provas contra o PT a qualquer custo.
Todos
sabem que os depoimentos de delatores exigem cautela e que a legislação requer
a confirmação com provas, no entanto, a imprensa tradicional, principalmente a
Rede Globo, tratou corruptores como heróis e tornou as peças da investigação um
show midiático. A fórmula encontrada para maquiar as informações foi ungir a
fala dos chefes da construtora com o dom da verdade e criar generalizações
sobre tudo que disseram.
A
Globo cria o estereótipo de que todos os políticos são iguais, oculta quem de
fato beneficia e é beneficiado por essas e outras empresas. Ao mesmo tempo,
esse noticiário perversos mantém ileso o governo ilegítimo que está atolado em
corrupção, incluindo o próprio Michel Temer, que acelera a votação de medidas
que liberam as terceirizações e retiram os direitos previdenciários e
trabalhistas.
A
falsidade da notícia é algo gravíssimo. Um crime contra a democracia. A Rede
Globo é parte desse golpe e sua estratégia de tratar como iguais a quem recebeu
doações legais de campanha, quem recebeu recursos de caixa dois e quem recebeu
propina e se favoreceu de fraudes serve apenas para enfraquecer a política e
minar a possibilidade do país reestabelecer a democracia. Da mesma forma, as
práticas de setores do Ministério Público e da Polícia Federal são não apenas
controversas, mas absolutamente comprometedoras.
Não
há democracia que sobreviva à tirania de um judiciário que se empenha em
arrancar delações contra um líder político como Lula pelo fato dele representar
um projeto de esquerda no país, para tentar calar a sua voz e impedir que seja
eleito, uma vez que detém 45% das intenções de voto, segundo as últimas
pesquisas.
O
teor do comando da “Lava a Jato” se revelou fascista e mostrou que não busca
punir quem fraudou contratos públicos, exigir a devolução integral dos recursos
ilegais ou fechar empresas que formam quadrilha para operar a corrupção. Estão
mais interessados em “caçar as bruxas”, e com apoio da mídia, a irao repor o
selo da honestidade em empresários corruptos, que serão “presos” em suas
mansões e depois vão trocar a fachada de suas construtoras para seguir
operando.
Na
lógica em que se desenrola do golpe no país, contando com a conivência de
grandes empresas, da imprensa tradicional e do judiciário, os partidos de
direita cujos velhos líderes foram pegos em corrupção comprovada vão se
reinventar com outros nomes tidos como “não políticos” para atender aos
interesses do capital que precisa deles e exige que façam a chamada “modernização”.
Enquanto isso os partidos de esquerda terão que lutar para não terminar
criminalizados pelo abuso de poder que se instaurou e que ganha espaço quando
se consegue intimidar os investigados, torturar e destruir suas trajetórias.
Eugenio
Aragão, ex-ministro da Justiça, sintetiza esse mal quando diz que “o mal da
tortura é que não oferece provas sólidas da verdade, mas apenas provas sólidas
da (in)capacidade de resistência do torturado”, lembrando que a tortura que não
é apenas física, do pau de arara, do choque elétrico, mas também é psicológica.
Tem
ficado evidente que esses depoimentos passam por uma combinação prévia sobre o
que interessa ser dito na deleção e para estabelecer a garantia de medidas
especiais de proteção aos delatores, assegurando-lhes uma “nova vida”, sem
máculas, em algum paraíso, de preferência um paraíso fiscal.
É
preciso estar atento, o golpe não chegou com militares dando tiros dentro de um
tanque de guerra. As estratégias do golpe iniciado em 2016 no Brasil são mais
subjetivas e de difícil percepção.
Contudo
alguns líderes de esquerda estão presos, alguns serão injustamente punidos, a
ameaça de jorrar sangue é eminente sempre que a população se organiza e usa o
direito legítimo de se manifestar. A derrubada da Presidenta Dilma era apenas o
início do golpe, e não seu fim, que, entre outros, prossegue com a retirada de
direitos e o uso político do sistema de justiça. Mas, não podemos calar e
submetermo-nos ao regime de força que vem se desenhando, o golpe ainda está em
curso no Brasil e nos precisamos detê-lo.
Por Fernando
Brito · 22/04/2017
http://www.tijolaco.com.br/blog/o-gole-ainda-esta-em-marcha-por-paulo-pimenta/
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