O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, requereu ao Supremo Tribunal
Federal, no dia 14, a abertura de 83 inquéritos decorrentes das delações de
executivos e ex-dirigentes da construtora Odebrecht.
Em
nota, o procurador-geral afirmou não ser possível a divulgação de detalhes dos
procedimentos, uma vez que o tema estava sob segredo de Justiça. O segredo de
Justiça decorre da lei, não consiste em opção do Ministério Público.
Por
isso, pleiteou ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, a
suspensão parcial do sigilo, sob o argumento "de promover transparência e
garantir o interesse público". O ministro ainda não decidiu.
Não
obstante, veículos da mídia (Folha, "O Estado de S. Paulo", "O
Globo" e sites) divulgaram os mesmos 16 nomes de políticos citados na
lista dos pedidos de inquérito.
A
coincidência fez com que a ombudsman da Folha, Paula Cesarino Costa,
pesquisasse a origem de tais reportagens.
Em
sua coluna publicada nesta Folha no dia 19, a ombudsman relata que "a
divulgação da chamada segunda lista de Janot se deu por meio do que, no mundo
jornalístico, se convencionou chamar de 'entrevista coletiva em off'".
"Após
receberem a garantia de que não seriam identificados, representantes do
Ministério Público Federal se reuniram com jornalistas, em conjunto, para
passar informações sobre os pedidos de inquérito, sob segredo, baseados nas
delações de executivos da Odebrecht."
A
ombudsman lança então as seguintes indagações: "Qual o sentido de se
deixar conhecer só alguns dos envolvidos? Qual a estratégia dos procuradores,
parte interessada do processo, ao divulgar uns e omitir outros? Por que não
liberar, por exemplo, os que estão nos pedidos de arquivamento?".
E
conclui: "Para o leitor, resulta em história contada pela metade.
Informação passada a conta-gotas tira o entendimento do todo e levanta a
desconfiança de manipulação".
Uma
questão básica precede as formulações da ombudsman. O procurador-geral
reconheceu e afirmou que os pedidos de inquérito estão sob segredo de Justiça,
mas ainda assim procuradores teriam divulgado parte do material, sem aguardar a
decisão do STF.
O
Estatuto do Ministério Público da União veda essa conduta. O artigo 246 impõe
aos membros da instituição, "em respeito à dignidade de suas funções e à
da Justiça", "guardar segredo sobre assunto de caráter sigiloso que
conheçam em razão do cargo" e "desempenhar com zelo e probidade as
suas funções".
A
demissão é a penalidade imposta pelo estatuto em tais casos de revelação de
assuntos sigilosos.
No
caso concreto, é fato inconteste que alguém vazou os nomes para a imprensa.
Também é fato que todo jornalista tem o direito ao sigilo da fonte resguardado
pela Constituição.
Respeitado
o princípio constitucional, faz-se necessário saber se a informação revelada
pela ombudsman é verdadeira. O objetivo não é emitir juízos para invalidar as
delações, mas atribuir as devidas responsabilidades pelo ato.
Vazamentos
devem ter o mesmo tratamento, sem distinções, seja quem for o seu autor.
Na
última terça (21), o juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná,
determinou a condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães, que edita o
"Blog da Cidadania".
Determinou
ainda "a apreensão de quaisquer documentos, mídias, HDs, laptops, pen
drives, arquivos eletrônicos" que teriam sido utilizados por Guimarães.
Tudo
porque o blogueiro antecipou, em fevereiro do ano passado, informações
sigilosas da Operação Lava Jato sobre a condução coercitiva do ex-presidente
Lula, que ocorreu em março.
Na
época o Ministério Público reclamou que o fato atrapalhara a investigação, o
que deu origem ao procedimento judicial.
Num
primeiro momento, o juiz Moro considerou que Guimarães não era jornalista e,
portanto, não estaria protegido pela regra constitucional de sigilo da fonte.
Após
protestos de associações da classe, o juiz recuou e cancelou as provas obtidas
em quebra de sigilo.
É
admissível o tratamento diverso a situações iguais? Nada será investigado e
nada acontecerá a respeito dos vazamentos das delações da Odebrecht?
Há
também a questão penal da violação de sigilo profissional, em que Protógenes
Queiroz foi condenado à perda do cargo de delegado da Polícia Federal por vazar
informações da operação satiagraha.
Artigo
publicado na edição deste domingo (26/3) da Folha de S.Paulo
http://www.conjur.com.br/2017-mar-26/nelson-jobim-quem-vaza-informacao-sigilosa-responsabilizado
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