Apresento
um breve ensaio sobre a organização do movimento operário russo no período
1905-1917. Em 1905 as mobilizações dos operários russos, lutando por melhores
condições de vida e trabalho, avançaram para a formação dos Sovietes (conselhos
operários). Na revolução de 1917 os sovietes ressurgiram com mais força,
estabelecendo duplo poder na Rússia, dualidade esta que se estende até 25 de
outubro de 1917, data que marca o inicio da implantação do governo soviético. O
texto será dividido em duas partes, a primeira sobre a revolução de 1905 e a
segunda sobre o processo revolucionário de 1917.
INTRODUÇÃO
A
Rússia do final do século XIX já possuía um grande contingente populacional,
sendo que "seu primeiro senso data de 1897 - conta com 129 milhões de
habitantes. Em 1914 são mais de 160 milhões". (BROUÉ, 2005, p. 9). Era um
país eminentemente rural, mas portador de um importante setor industrial, que
concentra cerca de um milhão e meio de operários em 1900 saltando para três
milhões em 1912. (IDEM, p. 13). A concentração populacional nas cidades
aumentava constantemente, o censo de 1897 apontava que a população das cidades
somava 16.289.000 pessoas, aproximadamente 13% da população total da Rússia
(Trotsky, 1971). Ainda, conforme complementa o historiador Victor Serge (1993):
"este proletariado de oficinas e de fábricas, concentrado em alguns grandes
centros, forma uma massa de 1.691.000 de homens (1904)". (SERGE, 1993, p.
40). O velho tzarismo convive com a indústria moderna. De acordo com Serge:
"Criada
recentemente, a indústria russa se desenvolve vigorosamente em condições muito
peculiares. As fontes de mão de obra são ilimitadas, mas a mão de obra
qualificada é rara e não há aristocracia operária privilegiada. A técnica dessa
indústria de um país agrícola é, na maioria das vezes atrasada: é fácil fazer
bons negócio. Em contrapartida, sua concentração atinge, sob influência do
capital estrangeiro um grau ainda mais elevado que a indústria alemã. Este
capitalismo, de estrutura moderna, é entravado por instituições retardatárias
de mais de um século em relação a ele." (SERGE, 1993, p. 40).
A
industrialização do país foi fomentada com grande ajuda do Estado em aliança
com o capital financeiro internacional, o que Lênin chamou de “via prussiana de
desenvolvimento do capitalismo”. Desta forma, o período do "boom"
industrial russo (1893-1902) foi também um período de imigração acelerada do
capital europeu.
Enquanto
o proletariado concentrava-se em contingentes enormes nas cidades, a burguesia
era numericamente e politicamente fraca, isolada do povo, semi-estrangeira, sem
tradições históricas, e inspirada pela possibilidade de lucro certo e rápido. A
classe operária vivia sob regimes despóticos na produção, com baixíssimos
salários, muitas horas de trabalho e autoritarismo patronal. Embora a indústria
estivesse em expansão, tal processo decorria sem melhora significativa das
condições de vida e trabalho da população trabalhadora. Conforme apontou Serge,
a classe operária não podia contar com "Nenhuma legislação trabalhista,
nenhum sindicato; nenhum direito de associação, de reunião, de greve ou de
palavra. Os operários, em suma não têm direito algum. A jornada de trabalho
varia entre 10 a 14 horas". (SERGE, 1993, p. 40).
1905: A
PRIMEIRA REVOLUÇÃO RUSSA
"A
Revolução de 1905 veio a ser não apenas o "ensaio geral" de 1917, mas
também o laboratório onde foram elaborados todos os agrupamentos fundamentais
da vida política e onde se pronunciaram todas as tendências e matizes do
marxismo da Rússia. No âmago dos debates e divergências, estava, é escusado
dizer, a questão relativa à natureza histórica da Revolução Russa e do seu
desenvolvimento posterior." (TROTSKY, 1980)
Em
1905, o proletariado urbano deflagrou a primeira revolução russa. Esta foi um
produto direto das condições sócio-materiais e políticas geradas durante o
período da guerra russo-japonesa que se iniciou em 1904. A guerra levou
milhares de soldados ao front para não os trazer de volta, somaram-se 15
milhões de mortos e feridos. (TROTSKY, 2007a). A escassez de alimentos elevou
os preços e expandiu a penúria no país. A degradação das condições de vida
gerava descontentamento com o governo e a guerra. A combinação destes fatores
fragilizou o tzarismo preparando o terreno para a revolução de 1905.
Em
9 de janeiro de 1905 os trabalhadores russos, decidem entregar uma petição ao
tzar, reivindicando melhores condições de vida e trabalho. A principal
liderança era o padre Gueórgui Gapone, que, de acordo com Isaac Deutscher,
havia criado "sua própria organização trabalhista para combater o
socialismo clandestino". (DEUTSCHER, 2005).
Padre Gaponi
Conforme
Serge (1993): "Gapone é uma figura singular. Parece ter acreditado
sinceramente na possibilidade de conciliar verdadeiros interesses dos operários
e as boas intenções das autoridades". (SERGE, p. 41). A passeata dirige-se
ao Palácio de Inverno, morada do Tzar. Segundo o autor:
"(...)
A petição dos operários de Petersburgo a Nicolau II, redigida por Gapone e
aprovada por dezenas de milhares de proletários, foi ao mesmo tempo uma
dolorosa suplica e uma reivindicação audaciosa. O que, exatamente, ele pedia?
Jornada de 8 horas, reconhecimento dos direitos dos operários, uma constituição
(responsabilidade dos ministros perante a nação, separação entre a igreja e o
Estado, liberdades democráticas)." (SERGE, 1993, p. 41).
Assim,
"De todos os pontos da capital, os peticionários, carregando ícones e
cantando hinos religiosos, puseram-se em marcha sobre a neve, numa manhã de
janeiro para ir até o "paizinho tzar" (Idem).
Porém,
ao invés da audiência com o imperador, "O tzar recusou-se a receber os
manifestantes e mandou que os soldados que montavam guarda no Palácio
disparasse contra a multidão. Isso provocou a explosão revolucionária".
(DEUTSCHER, 2005, p. 148). De acordo com Victor Serge:
"Em
todas as esquinas havia emboscadas. A tropa os metralhou, os cossacos
descarregaram as armas. "Tratem-nos como insurretos", havia dito o
imperador. A fuzilaria foi particularmente intensa sob as janelas do Palácio de
Inverno. Centenas de mortos, centenas de feridos, este foi o balanço da
jornada. Esta repressão absurda e criminosa, dá inicio a primeira revolução
russa. Este foi também - com 12 anos de antecedência - o suicídio da
autocracia." (SERGE, p. 41).
Este
dia ficou marcado na história da Rússia como o Domingo Sangrento. As
conseqüências de tal ataque seriam mais profundas do que o tzar poderia
calcular. Lênin, em seu Relatório sobre a revolução de 1905 registrou os acontecimentos
do Domingo Sangrento:
"Milhares
de operários, não social-democratas, mas crentes, súbditos fiéis do czar,
conduzidos pelo padre Gapone, encaminharam-se de todos os pontos da cidade para
o centro da capital, em direção à praça do Palácio de Inverno, para entregar
uma petição ao czar. (...). A tropa foi alertada. Ulanos e cossacos descarregam
sobre a multidão com armas brancas; disparam contra os operários desarmados que
ajoelhados suplicam aos cossacos que lhes permitam aproximar-se do czar.
Segundo os relatórios da polícia, houve nesse dia mais de um milhar de mortos e
mais de dois mil feridos. A indignação dos operários foi indescritível."
(LENIN, 2007).
De
acordo com Lênin, as reivindicações dos trabalhadores no 9 de janeiro eram:
“anistia, liberdades cívicas, salário normal, entrega progressiva da terra ao
povo, convocação de uma Assembléia Constituinte eleita por sufrágio universal e
igual”. (IDEM). Os trabalhadores russos reivindicavam o que a classe
trabalhadora de outros países já haviam conquistado há anos. Em um trecho da
petição levada ao tzar, os operários suplicam para que intervenha nas relações
capital-trabalho contra o despotismo patronal:
"Nós,
operários, habitantes de Petersburgo, dirigimo-nos a Ti. Somos escravos
miseráveis, humilhados; somos subjugados pelo despotismo e o arbítrio. Com a
paciência esgotada, cessamos o trabalho e pedimos aos nossos patrões que nos
dessem pelo menos aquilo sem o qual a vida não passa de uma tortura. Mas isso
foi-nos recusado; dizem os industriais que não está conforme com a lei. Somos
milhares e, tal como todo o povo russo, estamos privados de todos os direitos
humanos. Os Teus funcionários reduziram-nos à escravatura." (Apud LENIN,
2007).
A
petição é concluída com um apelo ultimo ao tzar:
Senhor!
Não recuses ajudar o Teu povo! Derruba a muralha que Te separa do Teu povo!
Ordena que seja dada satisfação aos nossos pedidos, ordena-o publicamente e
tornarás a Rússia feliz; se não, estamos prontos a morrer aqui mesmo. Só temos
dois caminhos: a liberdade e a felicidade ou o túmulo. (Idem).
Segundo
a análise de Lênin, os trabalhadores, por meio de um ato de “retidão de gente
despertada pela primeira vez para a consciência política”, acreditavam que o
tzar poderia se contrapor ao patronato e a burguesia nascente da Rússia em
favor do povo. Segundo o autor:
"Os
operários pouco conscientes da Rússia de antes da revolução não sabiam que o
czar era o chefe da classe dominante, mais precisamente a dos grandes
proprietários fundiários, já associados à grande burguesia por milhares de
laços e prontos a defenderem pela violência, por todos os meios, o seu
monopólio, os seus privilégios e os seus lucros." (LENIN, 2007).
Por
isso, quando os trabalhadores se contrapunham à burguesia industrial e aos
grandes proprietários fundiários, contrapunham-se imediatamente aos interesses
do tzar, que por sua vez transformou um ato pacífico dos trabalhadores em um
banho de sangue. Para Lênin, o operariado tirou lições importantes daquela
experiência, pois o evento explicitou as relações entre o absolutismo,
proprietários fundiários e a nascente burguesia. Neste processo, o operariado
tomou consciência de sua força coletiva. Como respostas aos fuzilamentos, uma
onda potente de greves explodiu a partir de janeiro, milhares vão às ruas,
dão-se novos confrontos. Lênin escreveu, no 10 de janeiro de 1905, um texto
intitulado “A Revolução na Rússia” onde apontou que com o Domingo sangrento
abriam-se novas expectativas para o jovem proletariado da velha Rússia:
"A
insurreição estalou. A força responde à força. Combate-se nas ruas, levantam-se
barricadas, os tiros crepitam, os canhões troam. Por todo o lado, rios de
sangue; a guerra civil pela liberdade teve início. Moscou, o Sul, o Cáucaso e a
Polônia estão prontos para se juntarem ao proletariado de Petersburgo. A
palavra-de-ordem dos operários passou a ser: a morte ou a liberdade! Muitas
coisas ficarão decididas hoje e amanhã. A situação evolui de hora a hora. O
telégrafo traz notícias exaltantes e as palavras parecem incapazes de dar conta
da intensidade dos acontecimentos vividos. Cada um deve estar pronto a cumprir
o seu dever de revolucionário e de social-democrata. Viva a revolução! Viva o
proletariado insurrecto!" (LÊNIN, A Revolução na Rússia, 10/01/1905).
Três
dias depois, em 12 de janeiro de 1905, Lênin publica o texto O começo da
revolução russa, onde denúncia a brutalidade com que as tropas atacaram os
operários e suas famílias, segundo o autor a “tropa venceu os operários, as
mulheres e as crianças desarmados. A tropa venceu o inimigo, metralhando os
operários que jaziam por terra”. (O começo da revolução russa, 12/01/1905).
Porém,
mesmo com centenas de trabalhadores tombando por força das metralhadoras, os
operários não recuaram, para a maior preocupação do tzar e das classes
dominantes, verifica-se a disseminação do vigor insurrecional entre o
proletariado fabril, que cada vez ganha maior apoio popular.
Erguem-se
os operários de Kólpino. O proletariado arma-se e arma o povo. Os operários
apoderam-se, segundo se diz, do depósito de armas de Sestroretsk.
Os
operários munem-se de revólveres, forjam armas das suas próprias ferramentas,
conseguem bombas para a desesperada luta pela liberdade. A greve geral
estende-se às províncias. Em Moscou, 10.000 pessoas já abandonaram o trabalho.
Está marcada para amanhã (quinta-feira 13 de Janeiro) a greve geral em Moscou.
Rebentou uma revolta em Riga. Manifestam-se os operários de Lodz, prepara-se a
insurreição de Varsóvia e realizam-se manifestações do proletariado em
Helsingfors. Em Baku, Odessa, Kiev, Kharkov, Kovno e Vilno cresce a
efervescência entre os operários e amplia-se a greve. Em Sebastopol ardem os
depósitos e o arsenal do departamento da marinha, e a tropa nega-se a abrir
fogo contra os marinheiros sublevados. Greve em Revel e em Sarátov. Choque
armado entre a tropa e os operários e reservistas em Radom. (Idem).
O
desgaste do governo frente aos operários e o povo russo é crescente. De acordo
com Lênin, até mesmo Gapone, depois do Domingo sangrento, chegou à conclusão de
que “Já não temos tzar. Um rio de sangue separa o tzar do povo. Viva a luta
pela liberdade!”. Lênin destacou como o ânimo do proletariado transformara-se
de forma crescente de 9 de janeiro em diante:
(...)
em poucos meses, as coisas mudaram completamente. As centenas de
social-democratas revolucionários passaram “subitamente” a milhares, e estes
milhares tornaram-se chefes de dois a três milhões de proletários. A luta
proletária suscitou uma grande efervescência, até mesmo em parte um movimento
revolucionário, no fundo da massa de cinquenta a cem milhões de camponeses; o
movimento camponês teve repercussão no exército e deu origem a revoltas
militares, a choques armados entre as tropas. Assim um imenso país com 130 milhões
de habitantes entrou na revolução; assim a Rússia adormecida se tornou a Rússia
do proletariado revolucionário e do povo revolucionário (...). (LENIN, 2007).
A
greve política de massas, em janeiro de 1905, atingiu a cifra de 440.000
grevistas (Lênin, 2007). Trotsky, com dados oficiais do governo russo, afirmou
que até o final do ano chegou-se a mais de 1.800.000 grevistas (TROTSKI,
2007a). São Petersburgo, Riga e Varsóvia, são as cidades com número
incomparavelmente mais elevado de grevistas. Lênin destacou que: "A greve
de massa foi o seu agente mais poderoso. A originalidade da revolução russa
está em que foi democrático-burguesa pelo seu conteúdo social, mas proletária
pelos seus meios de luta". (2007). Segundo o autor, embora fosse uma revolução
dirigida pelo proletariado, com "greve política de massas" e poder
operário:
"Foi
uma revolução democrática burguesa porque o fim a que aspirava no imediato e
que podia alcançar no imediato, pelas suas próprias forças, era a república
democrática, a jornada de oito horas, a confiscação das imensas propriedades
fundiárias da alta nobreza, tudo medidas realizadas quase inteiramente pela
revolução burguesa em França em 1792 e 1793. Mas a revolução russa foi em
simultâneo uma revolução proletária, não só porque o proletariado era então a
força dirigente, a vanguarda do movimento, mas também porque o instrumento de
luta específico do proletariado, a greve, constituiu a alavanca principal para
pôr em movimento as massas e o fato mais característico da vaga crescente dos
acontecimentos decisivos." (LENIN, 2007).
O OPERARIADO
RUSSO CRIA OS SOVIETS
Em
meio à onda grevista de 1905, nos bairros operários, eram constantes as
reuniões e assembléias. No mês de julho viveu-se a revolta dos marinheiros do
Encouraçado Potemkin. Em outubro surgem os sovietes de operários, segundo
Deutscher: "Com o desenvolver da greve nasceu uma instituição criada na
essência da Revolução Russa: o primeiro conselho ou soviete dos Representantes
dos Trabalhadores". (DEUTSCHER, 2005, p. 166). O soviete nasceu como um
organismo de auto-organização para coordenar as lutas em curso, sendo que o
núcleo do soviete: "foi constituído pelos grevistas de cinqüenta oficinas
tipográficas que elegeram delegados e lhes deram instruções para formar um
conselho. A eles juntaram-se logo delegados de outras indústrias".
(DEUTSCHER, 2005, p. 166). Esses representantes operários orientaram os demais
trabalhadores para que enviassem delegados para apresentar suas reivindicações
na primeira assembleia do soviete que seria realizada em 13 de outubro de 1905.
De acordo com Broué:
"Desde
o ponto de vista dos historiadores, o fato capital da história da revolução
russa é, sem dúvida alguma, o surgimento dos sovietes, graças aos quais
triunfaram, em 1917, tanto a revolução proletária como o partido bolchevique."
(BROUÉ, 2005, p. 80).
Por
meio dos sovietes, o proletariado afirmou-se como um sujeito político coletivo,
estabeleceu o duplo poder político e social na Rússia. Os sovietes afirmaram-se
como uma forma de auto-governo dos trabalhadores que por sua vez, isolava-se do
poder do tzar. Enquanto existiram, os sovietes controlavam a segurança publica,
algumas linhas ferroviárias, portavam armas, faziam seus próprios decretos e só
obedeciam as assembléias dos sovietes. Então, em sua prática política efetiva,
os sovietes disputavam o poder político com as forças do tzar. Nessa disputa
residiu o duplo poder, na democracia operária contra o absolutismo tzarista. O
duplo poder tende a decidir-se em favor de um dos grupos. Assim, esta forma de
auto-governo dos operários, que desautorizava o poder tzarista manteve-se por
50 dias.
Trotsky,
que em 1905 foi presidente do Soviete de São Petersburgo (que a partir de 1914
passa a se chamar Petrogrado), no livro Balanço e perspectivas (1971),
considerou que os sovietes “eleitos pelas massas e responsáveis perante elas, são
incontestáveis instituições democráticas, fazendo a mais resoluta política de
classe no espírito do socialismo revolucionário”. (TROTSKY, 1971). Os
trabalhadores e trabalhadoras criavam órgãos importantes de contra-poder e
assim estabeleceram bases orgânicas para uma força revolucionária ativa e
progressiva, isto colocava o proletariado como vanguarda objetivamente autônoma
em combate aos limites político-sociais impostos pelo tzarismo e a burguesia.
Em A revolução de 1905, Trotsky analisou que:
"Depois
do 9 de Janeiro a revolução demonstrou que controlava a consciência das massas
trabalhadoras. A 14 de julho, por meio da insurreição a bordo do Potemkin
Tavritcheski, a revolução demonstrou que podia tornar-se uma força material.
Mediante a greve de outubro demonstrou que podia desorganizar o inimigo,
paralisar sua vontade e reduzi-lo à mais completa humilhação. Por último,
organizando sovietes de trabalhadores em todo o país, a revolução demonstrou
que era capaz de criar órgãos de poder. O poder revolucionário só pode se
apoiar numa força revolucionária ativa. Quaisquer que sejam os pontos de vista
quanto ao desenvolvimento posterior da revolução russa, o fato é que nenhuma
classe social, salvo o proletariado, mostrou-se até hoje capaz e disposta a
apoiar o poder revolucionário." (TROTSKY, 1975).
Os
sovietes afloraram nos bairros proletários, sendo que o soviete mais importante
foi o de São Petersburgo, cidade com grande concentração operária, mas sua
influência direta e indireta estendia-se ainda sobre outras frações importantes
do proletariado, como operários da construção, garis, trabalhadores
não-profissionalizados, cocheiros etc. Também frações da classe média e da
intelectualidade tornaram-se simpáticos aos sovietes. No dia 13 de outubro de
1905 foi realizada a primeira Assembléia Constituinte do Soviete de São
Petersburgo. Conforme se lê em A revolução de 1905:
"À
primeira reunião assistiram umas poucas dúzias de pessoas; na segunda metade de
novembro o número de deputados se havia elevado a 562, incluindo seis mulheres.
Essas pessoas representavam 147 fábricas e usinas, 34 oficinas e 16 sindicatos.
O núcleo principal de deputados - 351 pessoas - pertencia aos trabalhadores
metalúrgicos, que desempenharam um papel decisivo no Soviete. Havia 57 deputados
da indústria têxtil, 32 das indústrias de artes gráficas e de papel, 12 dos
atendentes do comércio e 7 dos escritórios e do comércio farmacêutico. O comitê
executivo agia como ministério do Soviete. Formou-se a 17 de outubro e estava
composto por 31 pessoas: 22 deputados e 9 representantes de partidos (6 das
duas facções social-democratas e 3 dos socialistas revolucionários)."
(TROTSKY, 1975).
Durante
50 dias (de 13 de outubro a 6 de dezembro de 1905) os sovietes controlam
bairros inteiros. Trotsky analisando o significado dos sovietes considerou que
“era verdadeiramente um governo dos trabalhadores em embrião”. Isso porque: “O
Soviete organizou as massas trabalhadoras, dirigiu as greves e manifestações
políticas, armou os trabalhadores e protegeu a população contra os pogroms”.
(Idem, 1975). Assim, esse organismo de auto-organização:
"(...)
Na luta pelo poder aplicou métodos naturalmente determinados pela natureza do
proletariado como classe: seu papel na produção, seu amplo número, sua
homogeneidade social. Mais ainda, o Soviete coordenou sua luta pelo poder como
cabeça de todas as forças revolucionárias, dirigindo a atividade de classe
espontânea das massas trabalhadoras de muitas maneiras diferentes; não só
estimulou a organização de sindicatos, como interveio em disputas entre
trabalhadores individuais e seus patrões. Precisamente porque o Soviete - o
corpo democrático representativo do proletariado num momento de revolução - se
situou no ponto de encontro de todos seus interesses de classe, imediatamente
ficou sob a influência determinante do partido social-democrata."
(TROTSKY, 1975).
As
greves gerais políticas criaram fatos políticos importantes que avançaram para
além do local de trabalho. Envolvendo amplas massas na cidade o proletariado
auto-organiza-se em direção ao controle da produção social, buscam controlar as
fábricas, o local de trabalho, e os bairros, local de residência dos
trabalhadores, que em circunstancias comuns também é organizado pelas classes
dominantes.
Mediante
a pressão da greve o Soviete ganhou a liberdade de imprensa. Organizou
patrulhas de rua regulares para garantir a segurança dos cidadãos. Em maior ou
menor medida tomou em suas mãos os serviços postais e telegráficos e as
estradas de ferro. Interveio com autoridade em disputa de caráter econômico
entre trabalhadores e capitalistas. Realizou uma tentativa de introduzir a
jornada de trabalho de oito horas mediante uma pressão revolucionária direta.
Ao paralisar a atividade do Estado autocrático mediante a greve insurrecional,
introduziu sua própria ordem democrática livre na vida da população urbana
trabalhadora. (TROTSKY, 1975).
Centrado
na organização operária de base, os sovietes constituíam o primeiro experimento
democrático do proletário russo. Por meio das assembléias e plenárias como a
eleição direta de delegados revogáveis, praticava-se a “democracia autêntica”.
Segundo o autor:
"Com
o Soviete vemos pela primeira vez o aparecimento do poder democrático na
história russa moderna. O Soviete é o poder organizado da própria massa sobre
suas partes separadas. Constitui a democracia autêntica, sem uma câmara alta e
uma câmara baixa, sem uma burocracia profissional, mas com o direito dos
votantes de trocar seus deputados a qualquer momento. Através de seus membros -
deputados eleitos diretamente pelos trabalhadores o Soviete exercita a
liderança direta de todas as manifestações sociais do proletariado como
totalidade e de seus grupos individuais, organiza suas ações e lhes proporciona
um lema e uma bandeira." (TROTSKY, 1975).
Mesmo
a burguesia liberal se viu obrigada a apoiar os sovietes "Colaboraram em
greves e manifestações, adotaram uma atitude amistosa em relação aos
revolucionários, só os criticaram morna e cautamente”. (1975). Esse apoio dura
apenas até 17 de outubro. Após esta data, a burguesia busca unificar-se contra
os sovietes. O patronato criou a "União Anti-Revolucionária do 17 de
outubro". Porém a disposição dos Sovietes estava evoluindo em sentido
contrário aos desejos da burguesia. O proletariado confiscou armas e
suprimentos para sustentar os sovietes, e assim assegurar a manutenção das
posições já conquistadas, de acordo com Trotsky,
Nas
estações de Moscou vimos os operários tomar armas que estavam sendo
transportadas para algum teatro de operações distante. Ações similares
ocorreram em muitos lugares. Na região do Kuban os cossacos insurgentes
interceptaram um transporte de rifles. Soldados revolucionários entregaram
munições aos insurgentes, etc. (TROTSKY, 1975).
Por
meio dos sovietes, o proletariado russo provou-se capaz de aglutinar em torno
de si, não apenas multidões de trabalhadores das cidades, mas também camponeses
e estudantes. Assim, o operariado russo se fez vanguarda sócio-política na
prática. De acordo com Broué:
Para
todos os social-democratas russos, a revolução de 1905 foi uma revolução
burguesa quanto a seus principais objetivos, a saber, a eleição de uma
assembléia constituinte e a instauração de liberdades democráticas. Porém, fica
evidente que tal revolução burguesa foi levada a cabo integralmente pela classe
operária, com seus instrumentos de classe, suas manifestações de rua e suas
greves, sendo o resultado da insurreição dos operários de Moscou. (...).
(BROUÉ, 2005, p. 77).
Para
Lênin, isto confirmava a força do proletariado do país e a sua capacidade de
hegemonizar a luta sócio-política: "Os melhores elementos da classe
operária marchavam à cabeça, arrastando os indecisos, despertando os
adormecidos e galvanizando os fracos". (LENIN, 2007). No entanto, no dia 3
de dezembro de 1905 as tropas do governo cercaram uma reunião do Soviete, que
resistiu durante 9 longos dias. De acordo com Lênin, em Moscou:
"(...)
um pequeno número de insurrectos, operários organizados e armados – não eram
mais de oito mil – resistiu durante nove dias ao governo do czar. Este não se
podia ficar na guarnição de Moscou; pelo contrário, teve de mantê-la fechada, e
foi só com a chegada do regimento Semionovski, chamado de Petersburgo, que pôde
reprimir o levantamento." (LENIN, 2007).
A
partir disto, o governo avançou progressivamente na batalha para destruição de
todas as organizações revolucionárias criadas entre outubro e novembro, até a
derrota da revolução. Os revolucionários sobreviventes lotaram a Prisão de
Pedro e Paulo. De acordo com Serge (1993): "A primeira revolução russa
custou ao povo russo cerca de 15.000 mortos, mas de 18.000 feridos e 79.000
prisioneiros. (Idem, p. 46). Ainda, segundo o autor:
"A
autocracia foi salva, em 1905, pelas hesitações e pelo espírito reacionário da
burguesia liberal, as hesitações das classes médias revolucionárias, a
inexperiência e a falta de organização do proletariado (nem devotamento nem a
solidariedade puderam substituí-la), a fraqueza do partido proletário, o
caráter elementar dos movimentos no campo, a fidelidade relativa da tropa e a
intervenção do dinheiro francês." (SERGE, 1993, p. 46).
Como
saldo positivo, a revolução de 1905 contribuiu para dissipar ilusões do
proletariado com o regime tzarista. Assim: "A derrota da primeira
revolução russa estava longe de ser completa. As massas operárias e camponesas
tinham perdido o respeito pela autocracia e prendido a se confrontar com a
opressão". (Idem, 1993, p. 46). As experiências vividas, percebidas e
compartilhadas pelo proletariado russo possibilitou um cumulo político
importantíssimo tanto para o operariado como para o Partido Bolchevique.
Mesmo
depois da repressão tzarista, as greves políticas continuaram eclodindo na
Rússia, ainda que de forma decrescente, até 1910. Trotsky, no livro A história
da Revolução Russa (2007a), reuniu dados do governo russo sobre as greves,
segundo o autor, a repressão foi implacável e continua de 1905 a 1907. Com
isso, o número de greves políticas diminuiu vertiginosamente até 1910. A partir
deste ano inicia-se outro ciclo de massificação das greves políticas
progressivo até 1914.
Trotsky
considerava, que a revolução de 1905 cumpriu papel essencial para o
desenvolvimento da classe operária russa e para todo o proletariado mundial. A
nascente classe operária russa, que fizera sua primeira experiência política
independente naquele ano ainda era muito fraca para tomar o poder, porém esta
revolução teria sido um ensaio geral para a revolução de 1917. Nas palavras do
autor: "O proletariado chegou ao poder em 1917 com a ajuda da experiência
adquirida pela geração de 1905". (TROTSKY, 1971). Lênin expressa opinião
similar em março de 1917, na primeira Carta de longe:
"Sem
os três anos de formidáveis batalhas de classe e a energia revolucionária do
proletariado russo, em 1905-1907, seria impossível uma segunda revolução tão
rápida, no sentido de ter concluído a sua etapa inicial em poucos dias. A
primeira revolução (1905) resolveu profundamente o terreno, arrancou pela raiz
preconceitos seculares, despertou para a vida política e para a luta política
milhões de operários e dezenas de milhões de camponeses, revelou umas às
outras, e ao mundo inteiro, todas as classes (e todos os partidos principais)
da sociedade russa na sua verdadeira natureza, na verdadeira correlação dos
seus interesses, das suas forças, das suas formas de ação, dos seus objetivos
imediatos e futuros. A primeira revolução, e a época contra-revolucionária que
se lhe seguiu (1907-1914), revelaram toda a essência da monarquia tzarista, levaram-na
até o “último limite”, puseram a nu toda a podridão e infâmia, todo o cinismo e
corrupção da corja tzarista com esse monstro, Raspútine, à frente, toda a
brutalidade da família Románov (...)." (LENIN, Carta I, 2005).
IMPACTOS DA
REVOLUÇÃO DE 1905 SOBRE O POSDR
O
Partido Operário Social Democrata Russo (POSDR), que em 1905 contava com cerca
de 13.000 membros (SERGE, 1993, p. 46), era o partido dos marxistas russos,
frente à conjuntura e o desenvolvimento social do país diagnosticava a
inevitabilidade da insurgência de um processo revolucionário na Rússia
tzarista.
Colocava-se
ao Partido, em um marco estratégico, qual papel a revolução deveria cumprir na
Rússia, e ainda, em quais alianças de classe se deveria apoiar a revolução
democrático-burguesa. Três posições se chocavam dentro do Partido: a da
corrente Menchevique, a dos Bolcheviques e a de Trotsky. Lembremos, conforme
denotou Broué, que Trotsky, foi presidente do soviete de Petrogrado em 1905 e o
único dirigente do POSDR que desempenhou papel importante na revolução de 1905.
(2005, p. 79).
Para
os mencheviques a burguesia liberal é que deveria dirigir a revolução, com
apoio do proletariado e dos camponeses. Dever-se-ia lutar contra o inimigo
comum: o tzarismo e os elementos feudais. De acordo com Deutscher, os
mencheviques defendiam que, "como a revolução tinha caráter burguês,
dirigida contra o absolutismo e os restos do feudalismo, e não visando o
socialismo, a burguesia, e não o proletariado, era o herdeiro legitimo do
poder". (DEUTSCHER, 2005, p. 149). Nesse cenário, os mencheviques, por
fora do governo burguês, pressionariam para que realizasse as reformas
democráticas. (BROUÉ, 2005, p. 83: DEUTSCHER, 2005, p. 149). Então, para os
mencheviques, em 1905: "Os socialistas (...) não podiam participar de
nenhum governo burguês, nem mesmo no governo nascido de uma revolução. Sua
tarefa era defender, na oposição, os interesses da classe operária".
(DEUTSCHER, 2005, p. 149).
Com
isto, se poderia criar condições mais favoráveis para a luta do proletariado,
nas palavras de Trotski em As três concepções da revolução russa, para os
mencheviques o proletariado deveria conquistar sua "liberdade política
juntamente com a burguesia liberal. Então, após muitas décadas, num alto nível
de expansão capitalista, entraria no rumo da revolução socialista em conflito
direto com a burguesia". (TROTSKY, 1980).
A
segunda concepção sobre a revolução era a dos bolcheviques, estes recusavam
firmemente admitir que a burguesia russa fosse capaz de levar a cabo a sua
própria revolução, ainda, defendiam que a burguesia russa era hostil a
expropriação da terra sob posse da aristocracia fundiária. Por isso, para os
bolcheviques, a tarefa central era lutar por um governo de trabalhadores e
camponeses que pudesse impor uma revolução democrática contra a monarquia e os
resquícios feudais. De acordo com Deutscher: "Lênin concordava que a
revolução era burguesa na medida em que não podia visar o socialismo. Não
acreditava, porém na missão revolucionária da burguesia". (DEUTSCHER,
2005, p. 149). Lênin destacava que a burguesia liberal, uma vez chegando ao
poder, não realizaria as demandas dos camponeses pobres e do proletariado
industrial. Segundo Serge:
"(...)
Os bolcheviques censuravam seus adversários por se colocarem a reboque das
classes ricas; o proletariado, diziam eles, deveria se colocar no comando da
sublevação popular; a revolução burguesa somente se completaria pela
"ditadura democrática dos operários e camponeses", cujas conquistas
permitiriam ao proletariado caminhar, em seguida, em direção ao socialismo. A
idéia central de Lênin era que não poderia mais haver uma revolução puramente
burguesa, dada a existência de um proletariado numeroso, poderoso e consciente.
(...)." (SERGE, 1993, p. 43).
Para
Lênin, apenas uma ditadura democrática do proletariado e dos camponeses
possibilitaria quebrar a resistência dos nobres, da grande burguesia e do
tzarismo, minando com isto as forças contra-revolucionárias, e assim, realizar
transformações profundas na sociedade russa. De acordo com Trotsky: “À idéia
plekhanovista de união entre o proletariado e a burguesia liberal, Lênin
contrapunha a idéia de união entre o proletariado e o campesinato”. (TROTSKY,
1980).
Lênin
destacava que os camponeses pobres, proletários do campo, constituíam a maioria
no país e viviam em condições paupérrimas, por isso eram aliados estratégicos
no processo revolucionário. (LENIN, 1980: 1980b). Nesta “fórmula algébrica da
revolução”, apontava que, sem dividir o poder com os camponeses, a base
proletária do processo revolucionário seria muito reduzida.
A
terceira concepção acerca da revolução era a de Leon Trotsky, embora
considerasse que “A concepção de Lênin representava um passo formidável para
frente, partindo, como o fazia, da transformação agrária e não das reformas
constitucionais, como tarefa central da Revolução, indicando a única combinação
realista de forças sociais capaz de levá-la a efeito”. (TROTSKY, 1980), Trotsky
insistia que a revolução deveria ser realizada com a direção do proletariado
das cidades, apoiado pelos camponeses. A ditadura deveria ser do proletariado,
e não operária-camponesa. O operariado deveria tomar o poder e realizar as
demandas democráticas burguesas de forma permanente, transformando a revolução
democrática em revolução socialista. (TROTSKY, 1980). Nesse sentido, Deutscher
destacou que Trotsky:
"(...)
Concordava com os bolcheviques em que a burguesia russa era incapaz de
liderança revolucionária e que a classe trabalhadora industrial era talhada
para o papel. Foi então mais longe ainda e argumentou que a classe trabalhadora
seria obrigada, pela sua supremacia política na revolução, a levar esse
movimento da fase burguesa para a socialista antes mesmo que a comoção social
tivesse começado no Ocidente. Seria esse um dos aspectos da
"permanência" da revolução - seria impossível confinar a comoção aos
limites burgueses." (DEUTSCHER, 2005, p. 195).
Por
isso, para Trotsky, apenas o "proletariado podia dar aos camponeses um
programa, uma bandeira e uma direção". (TROTSKY, 2007a, p. 28).
Problematizando a questão, argumentava que se deveria levar em conta: a
dispersão territorial dos camponeses, sua dificuldade de auto-organização em
organismos democráticos independentes dos camponeses ricos, a dependência em
relação às cidades e também as relações dos camponeses com a propriedade
privada (como produção particularizada). Destacou que Partido Camponês,
Socialista Revolucionários - SR - (1901-1923), era dirigido pelos camponeses
ricos e intelectuais pequeno-burgueses.
O
fato dos camponeses não se auto-organizarem também obrigava-os a seguir as
classes que se auto-organizavam. Assim, necessariamente, seguiria a burguesia
ou o proletariado. Os kulaks (camponeses ricos) defendiam aliança com a
burguesia liberal, enquanto os camponeses pobres pautavam-se tendo como
horizonte o proletariado urbano. Para Trotsky, “Nestas circunstâncias, o
campesinato, como um todo, seria incapaz de empurrar as rédeas do governo”.
Posto tudo isso, para Trotsky, o aliado estratégico do proletariado russo não
era outro senão o proletariado europeu (confira: TROTSKY, 1971: TROTSKY, 1980).
Estas três concepções da revolução russa foram postas a prova durante os
processos revolucionários de 1917.
http://www.esquerdadiario.com.br/O-movimento-operario-russo-e-suas-revolucoes-a-estrategia-de-1905-e-1917
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