Desde
2008 o Brasil assumiu a liderança mundial no uso de agrotóxicos para a produção
de alimentos. Hoje, 64% de todos os alimentos produzidos no Brasil está
contaminado por agrotóxicos, segundo dossiê elaborado pela Associação
Brasileira de Saúde Coletiva - Abrasco. As consequências desse modelo de
produção alimentícia significam uma verdadeira catástrofe do ponto de vista
ambiental, social e, especialmente, para a saúde da população.
Antes
mesmo de ser registrado o uso por primeira vez de agrotóxicos nas lavouras
brasileiras, na década de 60, já estava aceso o alerta sobre suas consequências
a médio e longo prazo. Hoje, estudos indicam que a maioria da população já
enxerga os perigos desse modelo de produção de alimentos. Ainda assim, o
Governo Federal parece caminhar na contramão da luta pela vida.
Com
a mudança de governo em 2016, depois do golpe de estado contra a presidenta
Dilma Rousseff, a situação só se agravou. “No governo Dilma este processo já
ocorria, mas de forma lenta, porque avançava contra a vontade de boa parte dos
agentes de governo. Havia uma maior possibilidade de influência das
organizações sociais, dos conselhos, das comissões com representação da
sociedade organizada”, destaca o engenheiro agrônomo, Leonardo Melgarejo.
Segundo
ele, as medidas do governo Temer vão na direção contrária do interesse público
e da posição historicamente defendida pela sociedade civil organizada. “Hoje,
parece que há uma interpretação generalizada de que escutar a sociedade, além
de não interessar, atrapalha. Parece haver uma única convicção: a de que
atender de forma atabalhoada as demandas empresariais garantirá a realização de
expectativas confusas, levando a algo obscuro por eles imaginado como sendo do
interesse nacional. Não há nada mais claro no programa deste governo do que a
pressa em demonstrar sua aptidão a uma posição de subserviência aos interesses
do mercado”, assegura.
Amparado
no apoio legislativo da chamada ‘bancada ruralista’, o novo governo já deu
claras demonstrações de que atenderá aos interesses do agronegócio. No dia 10
de janeiro de 2017, o Ministério da Agricultura (Mapa), já sob comando do
ruralista Blairo Maggi, aprovou o registro de 277 novos agrotóxicos, sendo 161
deles, chamados ‘genéricos’. O número representou um crescimento de 374%, se
comparado aos registros realizados durante todo o ano de 2015.
Para
Nívia Regina da Silva, da Direção Nacional do MST, as ações do governo Temer
visam garantir a “flexibilização dos marcos legais, a inflexão dos marcos
regulatórios de avaliação e monitoramento já existentes, o enfraquecimento das
agências reguladoras, como a Anvisa, esvaziando seu papel no cuidado com a
saúde pública e atendendo aso interesses das empresas, a descontinuidade do
PARA (Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos), com
divulgação de dados menos precisos e a aprovação de novas variedades
Transgênicas sem os devidos estudos de impactos a saúde e ambiente”.
Sobre
o caso específico da Anvisa, Nívia denuncia que, nos últimos meses, a agência
tem cumprido um desserviço para a regulamentação de agrotóxicos no Brasil.
“Depois do golpe, ficou ainda mais escancarado que a Anvisa virou um balcão de
negócios, onde as empresas transnacionais tencionam por seus interesses e abrem
consultas públicas com vistas a facilitar ainda mais os registros de novas
substâncias e favorecer o agronegócio. Desrespeitam a contribuição técnicas dos
pesquisadores da área da toxicologia, ignoram a agricultura familiar e
desconsideram o princípio da precaução, legitimando o golpe também no prato de
comida dos brasileiros”, afirma.
Além
da liberação do uso de novos venenos, segundo Melgarejo, “no Brasil,
infelizmente, são raros e muito lentos os casos de reavaliação dos agrotóxicos,
e a situação tende a piorar com mudanças legislativas em curso”. Ele lembra que
“tramita na Câmara em caráter de prioridade o PL 3200/2015, do Deputado Federal
Luis Antonio Franciscatto Covatti (PP-RS), e que é repudiado até pelo
Ministério Público Federal, pois substitui a nomenclatura agrotóxico por “fitossanitário”.
Além disso, cria uma Comissão Técnica Nacional de Fitossanitários (CTNFito),
controlada pelo Mapa, sem representação da Anvisa e do Ibama”. E completa:
“Para piorar, foram apensados a esse PL outros 17 projetos que afrouxam as
normas para toda a cadeia do veneno e praticamente revogam a atual lei dos
agrotóxicos. É o chamado ‘Pacote do Veneno’”.
Nívia
Regina explica que "o Pacote do Veneno restringe a competência dos estados
e municípios para legislar no tema dos agrotóxicos e proíbe os estados de
restringir o alcance dos registros federais de agrotóxicos, a menos que seja
para atender uma particularidade regional ou local devidamente justificada”.
Além disso, segundo ela, “flexibiliza a regulamentação da propaganda de
agrotóxicos, permite a venda de agrotóxicos sem receita agronômica, em casos
excepcionais a serem definidos na regulamentação da lei, altera o procedimento
para registro de agrotóxicos equivalentes e genéricos. deixa de exigir estudos
toxicológicos, agronômicos e ambientais para a produção de agrotóxicos
destinados exclusivamente à exportação”, entre outras medidas que têm
despertado a indignação dos grupos sociais que debatem os efeitos dos
agrotóxicos.
Para
Melgarejo, “qualquer iniciativa ou metodologia simplificadora, destinada a
facilitar o comercio de venenos, deve ser recusada” pela sociedade.
Na
contramão do projeto golpista, o MST realiza por todo o país Jornadas de
Agroecologia, Feiras da Reforma Agrária, Jornadas de Alimentação Saudável, com
o objetivo de ampliar com toda a sociedade o debate sobre a necessidade de uma
Reforma Agrária Popular, que garanta o direito à terra aos produtores e
produtoras rurais, uma alimentação de qualidade para toda a sociedade, livre de
venenos, em benefício da saúde pública e do meio ambiente.
Entre
os dias 4 e 7 de maio de 2017, o Parque da Água Branca, na zona oeste de São
Paulo, será o cenário para uma das mais importantes materializações da luta do
povo Sem Terra: a 2ª Feira Nacional da Reforma Agrária. Além disso integra a
Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida que recentemente, junto a
outros segmentos da sociedade, lançou a plataforma #ChegadeAgrotóxicos que
defende a aprovação da Lei que institui a Política Nacional de Redução de
Agrotóxicos (PNaRA) e barra o Projeto de Lei (PL) 6299/2002, conhecido como
“Pacote do Veneno”.
*Editado por
Iris Pacheco
http://www.mst.org.br/2017/03/30/a-pressao-do-agronegocio-para-manter-o-veneno-na-mesa-do-povo-brasileiro.html
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