O
governo federal tem tratado a reforma da Previdência como uma das propostas de
maior importância para o país, sob o fundamento de que o regime geral da
previdência e o regime próprio seriam deficitários. Não obstante, veremos como
a contabilidade do governo é enganosa.
Não
é de hoje que o governo tem “fabricado” artimanhas orçamentárias para
justificar “rombos” na Previdência. Veja-se, como exemplo, a Previdência
Pública (regime geral da Previdência). A Previdência, por natureza, deve ter
caráter contributivo, motivo pelo qual tudo aquilo que não houver uma
retribuição pecuniária para a prestação de um serviço ou benefício não pode ter
natureza previdenciária, mas não é isso o que ocorre na realidade.
Em
verdade, há diversos benefícios pagos pelo governo federal que não possuem
qualquer natureza previdenciária, mas que são orçamentariamente alocados na
conta da Previdência Social. Pode-se citar como exemplo o Benefício de
Prestação Continuada da Assistência Social (BPC-Loas) e os benefícios
destinados ao segurado especial, comumente conhecido como rurícola. Nesses dois
casos o cidadão fará jus a um benefício, desde que cumprido certos requisitos,
sem ter feito qualquer contribuição à previdência. Essa é uma prova cabal de
que há benefícios evidentemente assistenciais que estão sendo pagos pelo caixa
da Previdência Social. Nesse contexto, o suposto déficit seria fabricado, pois
se a Previdência paga rubricas de outras naturezas não há como gerar qualquer
saldo positivo.
Além
do que, destacamos outro mecanismo financeiro fabricado que retira receitas da
previdência, qual seja, a Desvinculação de Receitas da União (DRU), que,
conforme consta das próprias explicações do site oficial do senado,
constitui-se precipuamente de receitas oriundas das contribuições sociais, as
quais integram receitas da Previdência, ou seja, retira-se recursos da
previdência para pagar outras contas, assim[1]:
"A
DRU é um mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% de todos
os tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas. A principal fonte
de recursos da DRU são as contribuições sociais, que respondem a cerca de 90%
do montante desvinculado.
Criada
em 1994 com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE), essa desvinculação foi
instituída para estabilizar a economia logo após o Plano Real. No ano 2000, o
nome foi trocado para Desvinculação de Receitas da União.
Na
prática, permite que o governo aplique os recursos destinados a áreas como
educação, saúde e Previdência Social em qualquer despesa considerada
prioritária e na formação de superávit primário. A DRU também possibilita o
manejo de recursos para o pagamento de juros da dívida pública".
Soma-se
ao exposto os incontáveis incentivos fiscais e isenções concedidas pela União
nos últimos anos, os quais determinaram renúncias de verbas previdenciárias que
somadas ultrapassaram 58 bilhões de reais só no exercício de 2014, segundo
dados do TCU[2].
De
outro lado importante também combater a argumentação de que o regime próprio
dos servidores civis da União seja deficitário. Nesse sentido, o modelo
proposto pelo governo tenta transverter uma lógica privada para o setor
público, que possui diversas peculiaridades, entre elas o fato do empregador
público pagar encargos patronais menores; do servidor público não possuir
direito ao FGTS; do servidor público aposentado ou pensionista, sujeito ao
regime próprio, continuar contribuindo à Previdência, entre outros.
Acresce-se
que a União custeia o pagamento de reformas e pensões dos servidores militares
federais e do Distrito Federal sem que haja uma contrapartida desses.
Importante registrar que esses segmentos representam cerca de 45% dos gastos da
União com aposentadorias e pensões[3], o que não justifica qualquer
desequilíbrio previdenciário imputado aos servidores civis da União.
Após
a reforma da previdência, implementada pela Emenda Constitucional 41/03, a
arrecadação previdenciária dos servidores civis federais tem crescido
anualmente, diminuindo, consequentemente, o aporte de recursos do Tesouro,
demonstrando que já há uma estabilidade no regime em debate. De outro lado, os
gastos da União com o pagamento de aposentadorias e pensões dos servidores do
Distrito Federal tem crescido anualmente, o que, mais uma vez, refuta o
argumento de que a Previdência dos servidores públicos civis federais
acarretaria “sangrias” nas contas da União.
A
grosso modo, e a título exemplificativo, se pegarmos a remuneração de um
servidor público federal que ganha R$ 5.000,00 mensais, e calcularmos os
valores que deveriam ser revertidos para seu regime próprio, considerando uma
alíquota de 11% do servidor (R$ 550,00) e de 22% do empregador público (R$
1.100,00) - para aqueles que entram no serviço público antes da entrada em
vigor do regime da previdência complementar - teríamos o total de R$ 1.650,00
mensais. Dessa forma, se houvesse essa contribuição fixa por 30 anos,
rentabilizando pelo CDB, o servidor somaria um total de R$ 5.786.822,00, o que possibilitaria 360
retiradas mensais de R$ 59.524,00[4]. Fazendo o mesmo cálculo só com as
contribuições do servidor (R$ 550,00), chegaríamos ao montante final de R$ 1.928.941,00,
o que determinaria 360 retiradas mensais de R$ 19.841,00. Observa-se que em
qualquer das hipóteses a rentabilização após sua hipotética aposentadoria seria
muito maior que sua remuneração. Isso sem levar em conta que após a EC 41/2003
os servidores públicos ainda continuam pagando a Previdência após a sua
aposentadoria no regime próprio.
Ante
ao exposto, seja considerando o regime geral da Previdência ou o regime
próprio, somente se o governo fizer malabarismos financeiros é que encontrará
algum déficit.
[1] Disponível
em: < http://www12.senado.leg.br/noticias/entenda-o-assunto/dru> Acesso
em 15.02.2017.
[2] Disponível
em:
Acesso em 15.02.2017.
[3] Disponível
em:
Acesso em 15.02.2017.
[4] Cálculo
feito por meio: Acesso em
15.02.2017.
http://www.conjur.com.br/2017-fev-20/allan-nunes-contrario-dizem-nao-deficit-previdencia
Nenhum comentário:
Postar um comentário