Na
Grã-Bretanha, gasta-se 9,1% do PIB com saúde. Nos Estados Unidos, são 17,1% e
subindo. Mesmo assim, na semana passada, quando a minha mãe sofreu um pequeno
derrame, fiquei bem feliz que ela é inglesa e não americana.
Ela
foi bem e rapidamente tratada no hospital, e a recuperação está sendo
acompanhada por uma equipe de especialistas que visitam a sua casa - sem que
ela desembolse um centavo por tudo isso.
Claro
que nada vem de graça. Alguém tem que pagar. Mas, por enquanto (já que isso é
uma outra história), o país goza de um sistema socializado, financiado
principalmente mediante impostos e sem cobranças, ou com contas pequenas para
remédios.
Nos
Estados Unidos, entretanto, o sistema é fragmentado e particular, visando o
lucro. Os rios de dinheiro gastos não vão fluindo para um resultado eficiente,
a não ser pelos acionistas. A expectativa de vida na Grã-Bretanha é de 81 anos
- e somente 78,9 nos Estados Unidos.
A
ideia de que a iniciativa privada é sempre a melhor e mais eficaz solução é uma
das grandes falácias da nossa época.
Fica
evidente, por exemplo, que o seu modelo de saúde é negativo para o povo dos
Estados Unidos em resultados e, principalmente, em custos.
Cerca
de 35% da sua população já enfrentou dificuldade financeira por causa de contas
médicas. E a busca por lucro traz pressões para aumentar as cobranças para os
saudáveis e limitar os tratamentos aos doentes - a velha história de oferecer o
guarda-chuva quando está fazendo sol e retirá-lo na chuva.
Estima-se
que o aumento de um ano na expectativa de vida é capaz de aumentar o PIB per
capita em 4%, enquanto uma mão de obra mais saudável pode aumentar a
produtividade de uma empresa de 20% a 47%.
Gastos
com saúde, portanto, juntos aos com educação e infraestrutura, não são custos,
mas investimentos. Faz sentido socializá-los até numa lógica puramente
comercial, pois reduzem o custo de fazer negócios e aumentam a competitividade
da economia.
O
oposto acontece quando a iniciativa privada toma conta desses setores. Daí,
haverá uma procura por renda, que faz tudo mais caro, tirando a
competitividade.
Algumas
atividades estratégicas, portanto, deveriam ser feitas pelo Estado - o que
conduz a uma das perguntas mais importantes da atualidade: qual tipo de Estado?
Condições
fundamentais para a iniciativa privada são um Estado de direito e a proteção
dos ganhos, sem as quais ninguém vai investir. Adam Smith, o pai da economia
clássica, sabia disso muito bem, embora muitos de seus chamados discípulos já
tenham se esquecido...
O
governo, escreveu Smith, "é, na realidade, instituído para a defesa dos
ricos contra os pobres ou daqueles que têm alguma propriedade contra aqueles
que não têm absolutamente nada".
Duas
conclusões. Primeiro, quem mais se beneficia das ações do Estado deveria estar
preparado para financiá-lo. A redução de impostos em cima das grandes empresas
e os super-ricos é um grande contrassenso.
Segundo,
o Estado é um ator integral na engrenagem. Qualquer modelo que considera o
Estado uma interferência indesejada fica sem valor, pois postula uma situação
que nunca existiu nem poderia existir.
Uma
das lutas do século 21 é em prol de um Estado democrático, honesto e eficiente
- aquele que criou o sistema de saúde na Grã-Bretanha seria um exemplo.
Foi
um Estado mobilizado por guerra que, depois da vitória sobre os nazistas,
conseguiu se direcionar para o bem comum. Ajudou nas lutas da minha mãe, que
nasceu em pobreza degradante, forneceu para os seus filhos oportunidades
impensáveis pouco tempo antes e agora, embora sob ataque de forças poderosas,
está a ajudando num momento de necessidade.
É
bastante possível que alguém que esteja lendo esse humilde artigo num iPhone -
dos quais os componentes-chave (internet, GPS, tela sensível ao toque e outros)
foram desenvolvidos com dinheiro público e depois entregues numa bandeja para a
iniciativa privada.
O
iPhone é, então, uma buginganga emblemática da época contemporânea.
Fonte: BBC
Brasil
http://www.m.vermelho.org.br/noticia/293753-1
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