Em
decisão publicada ontem (23/2), a 9ª Vara Federal de Porto Alegre (RS)
determinou a aquisição de uma área de 110 hectares para a construção de
moradias aos membros da comunidade Guarani Acampamento Rio Capivari. União e
Fundação Nacional do Índio (Funai), réus na ação, também deverão fornecer água
potável e implantar sistema de saneamento no local. A sentença, da juíza
federal substituta Clarides Rahmeier, busca garantir condições mínimas de
sobreviência e dignidade ao grupo de indígenas, acampados há cerca de 40 anos
às margens da RS-040 em Capivari do Sul.
A
ação civil pública havia sido ajuizada em 2012 pelo Ministério Público Federal
(MPF), tendo passado por diversas fases desde então. Segundo o autor, as 15
famílias se encontrariam em situação de miserabilidade, alojadas em um trecho
estreito na faixa de domínio da rodovia. O MPF informou que a Funai teria
assumido, em novembro de 2005, o compromisso de instituir grupo de trabalho
para posterior demarcação de terras e regularização da situação, o que não
teria ocorrido até o início da lide. Assegurou, ainda, que a aquisição de
terrenos já teria sido examinada e aprovada pela Advocacia-Geral da União como
medida emergencial em situações semelhantes.
Em
suas defesas, os réus alegaram que o deferimento do pedido implicaria violação
ao princípio da separação dos Poderes. Afirmaram que não caberia ao Judiciário
determinar “o que deve ser feito em favor de uma comunidade específica de
quinze famílias indígenas”. Salientaram, ainda, a existência de inúmeras
demandas similares no país, sendo a fundação incapaz de atendê-las nos prazos.
Cumprimento da
Constituição Federal
Ao
analisar o caso, a magistrada observou que não haveria controvérsia em relação
à vulnerabilidade dos guaranis. “A situação demonstra que não há condições de
reprodução física e cultural da comunidade, infringindo-se o direito à
diversidade cultural e, inclusive, de viver e reproduzir a vida conforme seus
costumes”, disse. “A afirmação de que não há previsão de solução rápida para o
problema e de que há extenso número de casos também sem solução, longe de
demover a conclusão do Juízo quanto à necessidade de medida judicial, confirma-a”,
complementou.
Ela
afirmou conhecer a limitação de recursos disponíveis, mas considerou que houve
omissão por parte do Executivo, já que teriam se passado quase quatro décadas
sem que os índios tivessem garantidos seus direitos constitucionais mais
básicos. “Não se está a dizer que o corpo de funcionários da Funai descumpre
com seus deveres funcionais, mesmo porque, sabidamente, a Funais conta com
efetivo reduzido. Ocorre, no entanto, que os esforços envidados não têm sido
suficientes para salvaguardar a comunidade em questão. E a ausência de
prioridade por parte da Administração Pública não pode durar mais de trinta
anos, mais ainda quando as determinações constitucionais aplicáveis são claras
e diretas ”, explicou.
“Nesse
sentido, quando o Poder Judiciário determina que medidas sejam tomadas pelo
Poder Executivo, não o está fazendo de modo arbitrário ou discricionário: está
apenas determinando a execução daquelas medidas que a Constituição e a lei
determinaram para o caso, sob pena de o próprio Judiciário ver-se tão omisso
quanto o está sendo o Executivo”, ponderou.
No
entendimento da juíza, entretanto, não caberia indenização por danos morais,
tendo em vista que
a
omissão não teria sido direcionada especificamente ao grupo, como forma de
depreciá-lo ou de prejudicá-lo. “Não houve uma conduta por parte da
Administração que ferisse a honra da comunidade, de modo deliberado ou não.
Igualmente, não restou comprovado o sentimento de inferioridade por conta das
omissões do Poder Público, por atos ou omissões específicos”, pontuou.
Condições de
sustento
Clarides
julgou parcialmente procedente a ação e fixou prazo de um ano para que a União
e a Funai adquiram uma área de 110 hecatres para a comunidade Guarani
Acampamento Rio Capivari, com participação dos beneficiados e da fundação ré na
escolha do local. “A extensão da área deve permitir, também, as atividades de
coleta de matérias-primas e de plantio, bem como a instalação de escola e de
posto de saúde”, justificou a magistrada.
Em
até seis meses após a aquisição, deverão ser construídas quinze moradias e
providenciados o fornecimento de água potável e a implantação de sistema de
saneamento. Observados os prazos, o cumprimento das determinações deve ser
imediato, já que o recurso cabível não possui efeito suspensivo.
AÇÃO CIVIL
PÚBLICA Nº 5039462-47.2012.4.04.7100/RS
https://www2.jfrs.jus.br/9a-vara-federal-de-porto-alegre-rs-determina-compra-de-area-de-110-hectares-para-guaranis-acampados-na-rs-040/
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