Moniz
Bandeira: “Moro e Janot atuam com os Estados Unidos contra o Brasil”
Cientista
político é conhecido por dissecar poderio norte-americano na desestabilização
de países
Por
Eduardo Miranda, no Jornal do Brasil, em 03/12/2016
Respeitado
pela vasta obra em que disseca o poderio dos Estados Unidos a partir do
financiamento de guerras e da desestabilização de países, o cientista político
brasileiro Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira afirma, em entrevista ao
Jornal do Brasil, que representantes da Lava Jato, como o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, e o juiz de primeira instância Sérgio Moro, avançam
nos prejuízos provocados ao país e à economia nacional.
Segundo
o professor, os “vínculos notórios” de Moro e Janot com instituições
norte-americanas explicam a situação atual das empresas brasileiras.
“Os
prejuízos que causaram e estão a causar à economia brasileira, paralisando a
Petrobras, as empresas construtoras nacionais e toda a cadeia produtiva,
ultrapassam, Moniz Bandeira livroem uma escala imensurável, todos os prejuízos
da corrupção que eles alegam combater. O que estão a fazer é desestruturar,
paralisar e descapitalizar as empresas brasileiras, estatais e privadas, como a
Odebrecht, que competem no mercado internacional, América do Sul e África”,
argumenta Moniz Bandeira, que está lançando o livro A Desordem Mundial: O
Espectro da Total Dominação.
Na
entrevista a seguir, o cientista político, que é autor de mais de 20 obras
sobre temas como geopolítica internacional, Estados Unidos, Brasil e América
Latina, faz críticas severas ao presidente Michel Temer, que, segundo ele, “não
governa”, mas segue apenas as coordenadas do ministro da Fazenda, Henrique
Meirelles, “representante do sistema financeiro internacional”.
“Seu
propósito é jogar o peso da crise sobre os assalariados, para atender à
soi-disant, ‘confiança do mercado’, isto é, favorecer os rendimentos do capital
financeiro, especulativo, investido no Brasil, e de uma ínfima camada da
população – cerca de 46 bilionários e 10.300 multimilionários”, critica Moniz
Bandeira.
Confira a
entrevista com o cientista político:
Jornal
do Brasil – Um livro como Quem pagou a conta?, da historiadora britânica
Frances Stonor Saunders, aponta a cultura como estratégia de dominação e força
dos Estados Unidos em relação aos seus artistas e intelectuais e em relação a
outros países durante a Guerra Fria. Essa dominação ainda se dá da mesma forma?
Ela passou por novas configurações?
Moniz
Bandeira - Sim, o inglês é a língua franca e os Estados Unidos ainda possuem o
maior soft power. É através do controle dos meios de comunicação, das artes e da
cultura que influenciam e dominam, virtualmente, quase todos os povos,
sobretudo no Ocidente. E os recursos financeiros correm por diversas fontes.
Jornal
do Brasil – Como o senhor vê o modo como os EUA elegem seu presidente da
República? É um método seguro? A Rússia chegou a anunciar que enviaria fiscais
para acompanhar o processo de votação até a apuração do resultado.
Moniz
Bandeira – Os grandes bancos e corporações, concentradas em Wall Street, são,
geralmente, os grandes eleitores nos Estados. George W. Bush não foi de fato
eleito, mas instalado no governo por um golpe do poder judiciário.
Agora,
porém, a tentativa de colocar na presidência dos Estados Unidos a candidata de
Wall Street e do complexo industrial-militar, a democrata Hillary Clinton,
falhou. Elegeu-se Donald Trump, um bilionário outsider, como franco repúdio ao
establishment político, à continuidade da política de guerra, de agressão.
Trump
recebeu o apoio dos trabalhadores brancos, empobrecidos pela globalização, dos
desempregados e outros segmentos da população descontentes com o status quo. E
o fato foi que mais de 70 milhões de cidadãos americanos (59 milhões em favor
de Trump e 13 milhões em favor Bernie Sanders, no Partido Democrata) votaram
contra o establishment, contra uma elite política corrupta, e demandaram
mudança.
Jornal
do Brasil – De que modo os EUA participaram da destituição da presidente Dilma
Rousseff? Essas intervenções se dão em que nível, quando comparadas às do
período da ditadura militar no Brasil?
Moniz
Bandeira - Conforme o historiador John Coatsworth contabilizou, entre 1898 e
1994, os Estados Unidos patrocinaram, na América Latina, 41 casos de
“successful” de golpes de Estado para mudança de regime, o que equivale à
derrubada de um governo a cada 28 meses, em um século.
Após
a Revolução Cubana, os Estados Unidos, em apenas uma década, a partir de 1960,
ajudaram a derrubar nove governos, cerca de um a cada três meses, mediante
golpes militares, como no Brasil. Depois de 1994, outros métodos, que não
militares, foram usados para destituir os governos de Honduras (2009) e
Paraguai (2012).
No
Brasil, o impeachment da presidente Dilma Rousseff constituiu, obviamente, um
golpe de Estado. Houve interesses estrangeiros, elite financeira internacional,
aliados a setores do empresariado, com o objetivo de regime change (mudança de
regime), através da mídia corporativa, com o apoio de vastas camadas das
classes médias, abaladas com as denúncias de corrupção.
Jornal
do Brasil – E qual teria sido o papel norte-americano na destituição?
Moniz
Bandeira – Há evidências, diretas e indiretas, de que os Estados Unidos
influíram e encorajaram a lawfare, a guerra jurídica para promover a mudança do
regime no Brasil.
O
juiz de primeira instância Sérgio Moro, condutor do processo contra a Petrobras
e contra as grandes construtoras nacionais, preparou-se, em 2007, em cursos
promovidos pelo Departamento de Estado. Em 2008, ele participou de um programa
especial de treinamento na Escola de Direito de Harvard, em conjunto com sua
colega Gisele Lemke. E, em outubro de 2009, participou da conferência regional
sobre “Illicit Financial Crimes”, promovida no Rio de Janeiro pela Embaixada
dos Estados Unidos.
A
Agência Nacional de Segurança (NSA), que monitorou as comunicações da
Petrobras, descobriu a ocorrência de irregularidades e corrupção de alguns
militantes do PT e, possivelmente, forneceu os dados sobre o doleiro Alberto
Yousseff ao juiz Sérgio Moro, já treinado em ação multi-jurisdicional e
práticas de investigação, inclusive com demonstrações reais (como preparar
testemunhas para delatar terceiros).
Jornal
do Brasil – O sr. cita também o procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
no desmantelamento de empresas brasileiras…
Moniz
Bandeira - Rodrigo Janot foi a Washington, em fevereiro de 2015, apanhar
informações contra a Petrobras, acompanhado por investigadores da força-tarefa
responsável pela Operação Lava Jato, e lá se reuniu com o Departamento de
Justiça, o diretor-geral do FBI, James Comey, e funcionários da Securities and
Exchange Commission (SEC).
A
quem serve o juiz Sérgio Moro, eleito pela revista Time um dos dez homens mais
influentes do mundo? A que interesses servem com a Operação Lava-Jato? A quem
serve o procurador-geral da República, Rodrigo Janot?
Ambos
atuaram e atuam com órgãos dos Estados Unidos, abertamente, contra as empresas
brasileiras, atacando a indústria bélica nacional, inclusive a Eletronuclear,
levando à prisão seu presidente, o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva. Os
prejuízos que causaram e estão a causar à economia brasileira, paralisando a
Petrobras, as empresas construtoras nacionais e toda a cadeia produtiva, ultrapassam,
em uma escala imensurável, todos os prejuízos da corrupção que eles alegam
combater.
O
que estão a fazer é desestruturar, paralisar e descapitalizar as empresas
brasileiras, estatais e privadas, como a Odebrecht, que competem no mercado
internacional, América do Sul e África.
Jornal
do Brasil – Levando-se em consideração a destruição de empresas de
infraestrutura no país, projetos para acabar com a exclusividade da Petrobras
na exploração da commodity, o senhor acredita na tese de que o cérebro da Lava
Jato está fora do país? Se sim, como se daria isso?
Moniz
Bandeira - Não há cérebro. Há interesses estrangeiros e nacionais que
convergem. Como apontei, os vínculos do juiz Sérgio Moro e do procurador-geral
Rodrigo Janot com os Estados Unidos são notórios. E, desde 2002, existe um
acordo informal de cooperação entre procuradores e polícias federais não só do
Brasil, mas também de outros países, com o FBI, para investigar o crime
organizado. E daí que, provavelmente, a informação através da espionagem
eletrônica do NSA, sobre a corrupção por grupos organizados dentro da
Petrobras, favorecendo políticos, chegou à Polícia Federal e ao juiz Sérgio
Moro.
A
delação premiada é similar a um método fascista. Isso faz lembrar a Gestapo ou
os processos de Moscou, ao tempo de Stálin, com acusações fabricadas pela GPU
(serviço secreto). E é incrível que, no Brasil, um juiz determine, a polícia
faça prisões arbitrárias, ilegais, sem que os indivíduos tenham culpa
judicialmente comprovada, um procurador ameace processá-los se não delatarem
supostos crimes de outrem, e assim, impondo o terror e medo, obtêm uma delação
em troca de uma possível penalidade menor ou outro prêmio.
Não
entendo como se permitiu e se permite que a Polícia Federal, que
reconhecidamente recebe recursos da CIA e da DEA, atue de tal maneira, ao
arbítrio de um juiz de 1ª Instância ou de um procurador, que nenhuma autoridade
pode ter fora de sua jurisdição, conluiados com a mídia corporativa, em busca
de escândalos para atender aos seus interesses comerciais.
A
quem servem? Combater a corrupção é certo, mas o que estão a fazer é destruir a
economia e a imagem do Brasil no exterior.
E
em meio à desestruturação da Petrobras, das empresas de construção e a cadeia
produtiva de equipamentos, com o da “lawfare”, da guerra jurídica, com a
cumplicidade da mídia e de um Congresso quase todo corrompido.
O
bando do PMDB-PSDB apossou-se do governo, com o programa previamente preparado
para atender aos interesses do sistema financeiro, corporações internacionais e
outros políticos estrangeiros.
Jornal
do Brasil – O economista Bresser-Pereira, ex-ministro de FHC, afirma, na
apresentação de A Desordem Mundial, que os EUA, segundo a tese do senhor,
passaram por um processo de democracia para a oligarquia. Que paralelo se pode
fazer com o Brasil nesse sentido, tomando como base as últimas três décadas? O sr.
acredita que passamos brevemente por um momento de democracia e agora voltamos
à ditadura do capital financeiro/oligarquia?
Moniz
Bandeira – Michel Temer, que se assenhoreou da presidência da república, não
governa. É um boneco de engonço.
Quem
dita o que ele deve fazer é o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, como
representante do sistema financeiro internacional. E seu propósito é jogar o
peso da crise sobre os assalariados, para atender à soi-disant, “confiança do
mercado”, isto é, favorecer os rendimentos do capital financeiro, especulativo,
investido no Brasil, e de uma ínfima camada da população – cerca de 46
bilionários e 10.300 multimilionários.
Jornal
do Brasil – O senhor afirma que onde quer que os EUA entrem com o objetivo de
estabelecer a democracia, eles entram na verdade por interesses políticos e
econômicos. É esse o caso da aproximação dos norte-americanos com Cuba? Fidel
Castro é um dos que compartilhavam dessa visão de interesse.
Moniz
Bandeira – Sim, havia forte pressão de empresários americanos para o
restabelecimento de relações com Cuba, por causa de seus interesses comerciais.
Estavam a perder grandes oportunidades de negócios e investimentos devido ao
embargo econômico, comercial e financeiro imposto a Cuba desde fins de 1960,
portanto mais de 50 anos, sem produzir a queda do regime instituído pela
revolução comandada por Fidel Castro.
Era
um embargo de certa forma inócuo, uma vez que outros países, como o Brasil,
estavam a investir e fazer negócios com Cuba. A construção do complexo-industrial
de Mariel, pela Odebrecht, com equipamento produzidos pela indústria brasileira
e o apoio do governo do presidente Lula, contribuíram, possivelmente, para a
decisão do presidente Barack Obama de normalizar as relações Cuba.
Essa
Zona Especial de Desarrollo de Mariel (ZEDM), 45 quilômetros a oeste de Havana,
tende a atrair investimentos estrangeiros, com fins de exportação, bem como
opção para o transbordo de contêineres, a partir da ampliação do Canal do
Panamá, ao permitir a atracagem dos grandes e modernos navios de transporte
interoceânicos. Tenho um livro sobre as relações dos Estados Unidos com Cuba
(De Martí a Fidel – A Revolução Cubana e a América Latina).
Jornal
do Brasil – O processo de apoio financeiro de instituições políticas às
religiões cristãs de direita, tal como o senhor descreve ao tratar do governo
Bush, se assemelha de alguma forma ao contexto do Brasil, levando-se em conta o
crescimento da bancada evangélica no Congresso Nacional e a conquista de cargos
do Poder Executivo por representantes da Igreja?
Moniz
Bandeira - Sim, o processo é secreto. Ocorre através de ONGs, muitas das quais
são financiadas pela USAID, National Endowment for Democracy, conforme
demonstro em A Segunda Guerra Fria e A desordem mundial, bem como através de
outras agências semi-oficiais e privadas.
Essas
igrejas também coletam muito dinheiro dos crentes, acumulam fortunas. E as
bancadas de deputados recebem dinheiro de empresas não nacionais, mas de
grandes empresas estrangeiras, muitas das quais apresentam no Brasil balanços
com prejuízos, conquanto realizem seus lucros nas Bahamas e em outros paraísos
fiscais.
Tais
empresas multinacionais não foram investigadas pelo juiz Sérgio Moro, o
procurador-geral Rodrigo Janot e a força-tarefa da Operação Lava-Jato et
caterva.
A
quem eles servem? Racine, o dramaturgo francês, escreveu que “não há segredo
que o tempo não revele”. Não sabemos exatamente agora, porém podemos imaginar.
http://www.viomundo.com.br/politica/moniz-bandeira-moro-e-janot-atuaram-e-atuam-com-instituicoes-dos-estados-unidos-contra-o-brasil-e-as-empresas-brasileiras.html
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