“Canalha,
canalha, canalha!”
Tancredo
Neves no momento em que Auro de Moura Andrade, presidente do Senado, declarou
vaga a presidência da República quando João Goulart estava em território
nacional; apud Roberto Requião na sessão do Senado que votou o impeachment da
presidente constitucional.
Sete pontos
e quatro conclusões
Ponto 1. Michel Temer pretende enviar ainda
este mês ao Congresso a proposta de reforma da Previdência. Prevê-se idade
mínima para aposentadoria de 65 anos. Em várias regiões do Brasil vive-se em
média 65 anos. O que significa que milhões de brasileiros morrerão trabalhando.
Também se cogita a elevação da alíquota da contribuição previdenciária dos
servidores para 20%. Com isso, um servidor que ganha 4.000 mil reais (4,5
salários-mínimos) será sangrado em 27,5% para o Imposto de Renda e 20% para a
previdência.
Ponto 2. A PEC 241, em tramitação, estabelece
teto para despesas com saúde e educação. Nos próximos 20 anos não poderão ser
maiores do que a inflação do ano anterior, ou seja, congeladas em termos reais.
Uma noção do que representa isso. Se implantada no período 2006 – 2015,
significaria uma diferença de 290 bilhões na saúde e 384 bilhões na educação.
Na área da saúde é um genocídio anunciado. Dor, sofrimento e morte para milhões
de brasileiros que dependem dos serviços públicos de saúde. E haverá mais 20
milhões de brasileiros ao longo dos próximos 20 anos.
Ponto 3. Comissão da Câmara acaba de aprovar
a projeto do senador Serra que altera as regras do pré-sal. Retira a
obrigatoriedade de participação da Petrobrás, o que ao fim e ao cabo entregará
fabulosa riqueza às companhias petrolíferas internacionais. Não há uma razão
plausível para isso. Pura, simples e vil traição aos interesses nacionais. As
ações da Petrobras são muito bem negociadas nos EUA (o que significa que é
forte e tem credibilidade) e ela tem a mesma possibilidade de investir e, se
necessário, captar recursos que qualquer grande companhia petrolífera do mundo.
Ponto 4. Comissão mista do Congresso
modificou, a pedido de Temer, o texto do projeto da Lei de Diretrizes
Orçamentárias para retirar as expressões “distribuição de renda”,
“fortalecimento de programas sociais” e “políticas sociais redistributivas”.
Ponto 5. O Estado brasileiro não tem mais uma
Constituição efetiva em pontos essenciais. Decisão do Tribunal Regional Federal
da 4ª. Região no caso Moro afirmou que qualquer juiz pode deixar de aplicar
direitos e garantias fundamentais em “situações excepcionais”, embora
pensássemos todos nós (inocentes…) que as garantias existissem exatamente para
isto, proteger os cidadãos de “situações excepcionais”. Fundamentou a decisão a
doutrina de Carl Schmitt, (“envernizada” por Eros Grau), o teórico que deu
suporte à destruição da Constituição de Weimar por Hitler.
Ponto 6. Nenhuma medida atinge a elite do país,
aqueles que poderiam de fato arcar com tais ônus. Não se cogita de imposto
sobre grandes fortunas, não se cogita de elevar as alíquotas de Imposto de
Renda para as faixas de altos salários, não se cogita de uma CPMF, imposto
impossível de sonegar para o grande capital, não se cogita de modificar o
imposto sobre heranças, praticamente simbólico no país. Todo o ônus recairá
sobre a imensa parcela miserável da população.
Ponto 7. Esse conjunto de torpezas destina-se
a garantir o pagamento da dívida pública, que ganha preferência absoluta diante
das necessidades do povo. Visa assegurar a renda dos especuladores dos títulos
públicos, que abocanham cerca de 40% do orçamento da União.
Conclusão 1. O governo brasileiro foi aparelhado
por uma quadrilha de canalhas a serviço do grande capital, que, em dois meses,
em uma blitz fulminante, está destruindo o Estado, a Constituição e condenando
a décadas de sofrimento a maior parte da população para permitir ao grande capital
apropriação de renda e patrimônio.
Conclusão 2. É hora de relembrar, mais do que
nunca, a frase de Marx no Manifesto Comunista:
“A
burguesia, afinal, com o estabelecimento da indústria moderna e do mercado
mundial, conquistou para si própria no Estado representativo moderno autoridade
política exclusiva. O Poder Executivo moderno não passa de um comitê para
gerenciar os assuntos comuns de toda burguesia.”
Conclusão 3. Está insustentável continuar a
reduzir a luta social à política institucional e aos parlamentos e persistir na
renúncia à organização e conscientização do povo e às reais formas de lutas
populares. Está insustentável não denunciar os limites da democracia burguesa e
a falácia da “representação política”, esta particularmente abrindo caminho
para a barbárie social.
Conclusão 4. Ou morremos de pé ou vivemos de
joelhos. Diante desta situação, a única resposta possível é a greve geral. Esta
que se anuncia e se prepara; outra, se esta fracassar; e mais outra, e quantas
forem necessárias, até que se consiga impedir o genocídio social que se anuncia
no Brasil. As forças e movimentos populares tem uma responsabilidade grave.
Deixar-se levar por mesquinharias, conflitos, ressentimentos e pequenos
interesses e recusar a unidade será apequenar-se de tal modo que somente lhes
restará a lata de lixo da História; porque deles será cobrada a
responsabilidade de não travar a luta contra os canalhas. De viver de joelhos
em vez de morrer de pé.
Márcio Sotelo Felippe é
pós-graduado em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São
Paulo. Procurador do Estado, exerceu o cargo de Procurador-Geral do Estado de
1995 a 2000. Membro da Comissão da Verdade da OAB Federal.
http://justificando.com/2016/10/08/sobre-canalhas-e-greve-geral/
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