quarta-feira, 10 de agosto de 2016

INFÂMIA. Por Fernando Brito

Num ato que talvez tenha vindo do que lhe restou de digno dentro de si, o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, aceitou uma única questão de ordem apresentada pelos adversários do golpe.

Ele acolheu o protesto da senadora Vanessa Grazziotin para que não se retirassem das notas taquigráficas da sessão de ontem as palavras infâmia e fraude.

Porque, no exame que os tempos farão sobre o que se passou ontem, a palavra infâmia será indispensável.

A política – e nossa habilidade ou inabilidade ao fazê-la – dissolve-se no tempo. O significado de nossos atos, não.

Aceitem-se todas as “acusações” políticas que se faz a Dilma – ingenuidade, vacilações, inapetência pelo jogo parlamentar –  mas pondere-se que, no seu segundo mandato, o comando da Câmara foi assumido pelo mais poderoso gangster da política brasileira nas últimas décadas, Eduardo Cunha.

Também se leve em conta que só tenha se dado conta da degola para a qual caminhava quando o  clima de perseguição instaurado no país já não lhe permitia uma mudança efetiva, embora desejada, como ficou claro com a demorada e bloqueada indicação de Lula para a Casa Civil.

Nas artes sombrias da política, isso explica o que se passou ontem.

Fora delas, nada explica o restante: um processo aberto por um ladravaz como Cunha, a admissão da acusação numa sessão que mais parecia um circo de loucos, a designação do pupilo do candidato derrotado, Aécio Neves, como relator do processo no Senado e um julgamento onde não vieram ao caso os fatos, apenas as opiniões.

Por último, ver o presidente do Supremo Tribunal Federal reduzido à condição de “mestre-de-cerimônia” do terrível arremedo de julgamento, se é que este nome pode merecer, em lugar do linchamento que foi.

É só o que explica que Lewandowski tenha, num último espasmo  de sua dignidade e consciência jurídica tenha preservado o registro da palavra infâmia.

Afinal, se ele não poderia ser julgador de tantos que a praticavam, ao menos restava-lhe o direito de julgar aquilo do qual ele próprio participava.

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