“Certa vez, com mais ou
menos sete anos de idade, enquanto desenhava (belos desenhos, diga-se de
passagem) no chão com palito de fósforo, eu disse à minha mãe que varria, com
uma vassoura de piaçaba, as folhas secas do abacateiro, da jaqueira e do pé de
carambola que faziam sombra no quintal: “Quando eu crescer, eu quero ser
desenhista”. Minha mãe, em meio à amargura que a miséria em que vivíamos lhe
trazia, disse-me: “Sonhar é bom. O problema é que a gente acorda”.
Aquela frase me espetou a
alma como um cravo à mão do crucificado. Senti uma profunda desesperança em
minha ingenuidade infantil. Aos doze anos, eu disse a minha mãe, que mal-dizia
a fome que nos assaltava, que eu nos tiraria daquela miséria, pois, um dia,
faria faculdade de Jornalismo e seria um grande jornalista. Ela me disse outra
vez, com alguma diferença nas palavras: “Sonhar é bom, meu filho, mas acorde
que esse negócio de faculdade não é pra você; é pra filho de rico”. Talvez por
enxergar o ingresso de um filho seu numa instituição de ensino superior algo da
ordem do impossível, é que minha mãe tenha ficado muda por dez segundos ao
telefone (eu ligava pra casa da minha tia que tinha telefone e pedia que
chamasse minha mãe quando eu precisava falar com ela) quando lhe contei – dum
orelhão em Brotas, onde morava minha professora Risonete Batista, que me contou
– que eu passara no vestibular para Jornalismo na UFBA, o terceiro curso mais
concorrido à época.
Bom, estou contando essa
história porque me pergunto: “O que seria de brasileiros e brasileiras que,
como eu, vivem em situação de pobreza, mas almejam sair desta por meio da
educação se o ensino superior no Brasil não fosse gratuito? O que seria da
maioria dos brasileiros e brasileiras? Ora, estaria condenado à imobilidade
social e à subalternidade no mercado de trabalho!”
O editorial de O Globo,
publicando neste domingo, afirmando que é “injusto” o ensino superior ser
gratuito no Brasil é odioso, mas não chega a ser uma surpresa. Certamente para
a família Marinho e os títeres que lhe lambem as botas na editoria do jornal,
“justo” deve ser o fato de ela ter enriquecido desmedidamente à custa da concessão
PÚBLICA de sinais de rádio e tevê, de caríssimos anúncios de estatais
brasileiras (ou seja, de DINHEIRO PÚBLICO) no intervalo de sua programação e
nas páginas de seus jornais e revistas (sim, os Marinho têm mídia cruzada, algo
que deveria ser ilegal e proibido se o Brasil não fosse um arremedo de
democracia!) e de empréstimos a “juros” generosos junto ao BNDES*, sobre cujo
pagamento nada sabemos. Certamente para quem enriqueceu dessa maneira e pôde
bancar seus pupilos em caríssimas universidades fora do país, só pode mesmo ser
“injusta” a gratuidade do ensino superior no Brasil. Para essa gente, ensino
superior deve ser privilégio dos riscos” (Do facebook de jean Wyllys)
http://cartacampinas.com.br/2016/07/o-odioso-editorial-de-o-globo-contra-o-ensino-universitario-publico-e-gratuito/
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