Estávamos na Cinelândia, há
pouco mais de um mês, num dos eventos contra o golpe, eu já tinha tomado
algumas cervejas, e disse ao amigo, que ouviu com olhos horrorizados, que eu
não estava lendo mais nada da imprensa brasileira.
"Estou relendo
Shakespeare", eu disse.
Diante do pesadelo que se
tornou a política brasileira, ou melhor, diante do pesadelo que se tornou o
noticiário político nacional (que é diferente da política propriamente dita), a
melhor maneira de entender a conjuntura é simplesmente não ler e não ver nada
produzido pela grande imprensa corporativa.
Explico melhor: o Brasil
está mergulhado na guerra híbrida. É uma guerra eminentemente semiótica,
sofisticada, e que vitima, assim como uma praia perigosa, os melhores
nadadores, ou seja, os leitores mais vorazes da mídia.
A imprensa brasileira se
tornou, definitivamente, radioativa: ela não apenas te desinforma, ela deprime,
te deixa doente, te transforma num zumbi.
E não é com esse estado de
ânimo que você conseguirá analisar objetivamente a conjuntura política
nacional.
Quando eu lembro que
ministros do STF, incluindo aí os que achávamos os melhores (já devíamos ter
desconfiado), como Ricardo Lewandowski, telefonavam para... Merval Pereira,
para se justificar em relação a um pronunciamento, uma decisão, então a gente
entende muito bem porque houve esse golpe.
O STF foi completamente
contaminado pela radiotividade midiática.
Veja a nossa próxima
presidente do STF, Carmen Lúcia, recebendo o prêmio Faz Diferença das mãos de
José Roberto Marinho.
É como um ministro da
suprema corte americana, num governo democrata, receber prêmio da Fox...
Prêmios para juízes viraram
moda. É uma forma moderna de propina, bem típica da nossa era midiática. Vale
mais que dinheiro, porque, de posse de um prêmio desses, você pode sair por aí
vendendo palestras.
Não entendo como não se
proíbe juiz de ganhar prêmio!
Prêmio para juiz é a coisa
mais antirrepublicana, mais antidemocrática, mais amoral que eu posso imaginar!
Sergio Moro também ganhou o
Faz Diferença, claro. E, recentemente, ganhou um prêmio da revista Time, que se
teve alguma importância, num passado distante, hoje é um sub-Veja americana,
decadente e degenerada, submissa ao que há de mais podre, corrupto e brutal na
política dos Estados Unidos.
Não é que você não precisa
ler. Ao contrário. Nunca foi tão importante, como hoje, acumular uma boa
bagagem de leitura. A informação, hoje, é a única arma à disposição dos povos
sob ataque das guerras híbridas.
Mas você precisa ler as
fontes certas.
O Brasil, repito, tornou-se
agora o epicentro da guerra híbrida mundial, que é baseada sobretudo em
manipulação das notícias, objetivando produzir consenso social em favor dos
interesses do imperialismo.
Em países com governos
fortes, como China e Rússia, a guerra híbrida tem mais dificuldade de ser bem
sucedida.
O Brasil é o terreno
perfeito.
O governo era fraco. A
presidenta, ruim de comunicação pessoal. A esquerda, ingênua e desorganizada.
E a grande mídia
corporativa, decadente, abraçou entusiasticamente a oportunidade de vender
barato o seu próprio país.
Vejam o caso da Lava Jato.
É incrível como ela consegue
pautar todo o espectro midiático nacional.
Quando as acusações contra
seu partidarismo começam a se avolumar demais, ela começa a vazar delações
contra caciques do PSDB.
É um jogo que ela vem
fazendo desde o seu início.
Nada muito explosivo, que
possa destruir o PSDB, mas apenas para desmoralizá-lo e intimidá-lo um pouco
também, para que ele possa se manter obediente ao núcleo de poder principal: a
dupla mídia & Lava Jato.
E também para empoderar a
própria operação, preparando o terreno para ataques mais ousados - e mais
absurdos, como prender Lula.
É sempre o mesmo método. A
esquerda cai como um patinho. Delações contra Serra, Aloysio Nunes, mais uma
contra Aécio?
Pronto, viramos todos zumbis
de Sergio Moro, entusiastas da Lava Jato.
A Lava Jato, arma principal
da guerra híbrida, transformou a opinião nacional inteira, da direita à
esquerda, num exército de patetas repetindo suas descobertas.
José Roberto Barroso, em
entrevista à Globo, elogiou a Lava Jato nesses termos:
"a melhor coisa que os
rapazes de Curitiba fizeram foi oferecer um bom exemplo.
(...) uniram-se membros do
Ministério Público, Polícia Federal e a magistratura em um pacto de seriedade,
de qualidade técnica, de trabalho de patriotismo, para ajudar a enfrentar um
problema brasileiro, que é a corrupção".
Pacto de patriotismo? Viajar
aos EUA, às expensas públicas, para entregar informações contra a Petrobrás ao
Departamento de Estado americano?
Destruir as maiores
indústrias de engenharia do país?
Atacar o centro de pesquisas
da Petrobrás?
Paralisar a fabricação do
nosso submarino nuclear?
Isso é pacto de patriotismo?
Além do mais, Barroso sabe
muito bem que PF, judiciário e MP não podem "se unir". A luta nunca
pode ser apenas contra a corrupção, e sim contra o autoritarismo, que se
infiltra o tempo inteiro no aparelho do Estado. Para isso existe separação de
poderes. Senão não havia sentido existir um Judiciário, uma PF e um MP:
podíamos ter um órgão só, como na Pérsia de Xerxes.
É impressionante a
pusilanimidade, a covardia, de nossos ministros do STF. Quando penso nisso,
entendo melhor o golpe: quem mandou o PT nomear esses covardes?
O Instituto dos Advogados
Brasileiros divulgou uma nota de repúdio.
Mas não é suficiente.
Qual o resultado da Lava
Jato? 1) golpe de Estado; 2) um novo governo infinitamente mais corrupto, cheio
de ministros investigados; 3) vitória dos partidos e parlamentares mais
corruptos e reacionários; 4) vitória da mesma mídia nascida do mesmo status quo
que gerou toda essa corrupção; 5) desorganização de setores estratégicos da
economia nacional, como petróleo, energia nuclear, hidrelétricas, etc; 6)
aumento no desemprego provocado pela desorganização desses setores; 7)
desmoralização do partido político que sempre apresentou os menores índices de
corrupção parlamentar, o PT, um dos partidos trabalhistas mais importantes do
mundo.
A lista de irregularidades
da Lava Jato é gigantesca. O ministro Barroso será um dos que irão julgar os
recursos. O mínimo que ele podia fazer é se abster de elogios levianos contra
uma operação que tanto mal causou o país.
Barroso também fala que as
empresas "pensarão duas vezes" antes de fazer caixa 2 nas próximas
eleições. Ora, Barroso! Tanto estudo para retrocedermos a Lei de Talião... Olho
por olho, dente por dente?
As declarações de Barroso
cumprem, naturalmente, um objetivo: blindar-se, abrigar-se junto ao quentinho
da mídia, e da própria Lava Jato: afinal, a aliança entre Lava Jato e mídia é o
núcleo de poder mais importante no Brasil hoje.
Quem pode, pode, quem não
pode, se sacode.
Há outras fontes importantes
de poder, mas essa é, com certeza, a mais perigosa: qualquer autoridade,
jornalista, cidadão, que ousar criticar a Lava Jato se torna, automaticamente,
alvo da operação.
Até mesmo delegados da
polícia federal, como se viu na última etapa da Lava Jato, destinada
especificamente a intimidar qualquer setor de dentro da própria PF que ouse
criticar a operação.
Vejam o caso do juiz do STJ,
Marcelo Navarro Ribeiro Dantas. Foi a melhor nomeação de Dilma para o STJ. Um
juiz garantista, corajoso, respeitoso da constituição, disposto a enfrentar o golpe.
Foi o bastante para se
tornar alvo do mais violento ataque midiático jamais visto a um ministro do
STJ.
Nenhum outro ministro do STJ
ou do STF foi em sua defesa.
As acusações eram as mais
ridículas possíveis, mas com linguagem incrivelmente pesadas: Navarro teria
sido nomeado para "soltar empreiteiros", estaria "envolvido na
Lava Jato"...
Como de praxe, nenhuma
prova.
Os próprios ministros do STF
também foram vítimas da Lava Jato. Alguns vazamentos envolvendo-os tinham
objetivo claro de intimidar a corte. E conseguiram.
Em seguida, Sergio Moro vaza
- ilegalmente - áudios em que Lula diz que o STF estaria acovardado. O que faz
o STF? Ao invés de reagir duramente à pistolagem de Sergio Moro, critica...
Lula, que fez uma crítica à corte num telefonema privado...
Ora, STF não apenas está
acovardado, ele se tornou delinquente, golpista. Essas entrevistas de Barroso à
Globo, o prêmio da Globo à Carmen Lúcia, a postura de Toffoli chancelando o
golpe no Jornal Nacional...
Nojo!
Por que o STF removeu Cunha
da presidência da Câmara apenas depois da votação do impeachment na Câmara?
Pensar a política brasileira
se tornou um exercício duro demais, por isso o meu cuidado para evitar a
contaminação radioativa da mídia.
No blog Cafezinho:
http://altamiroborges.blogspot.com.br/2016/07/a-midia-e-o-jogo-malandro-da-lava-jato.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário