Em
manifesto divulgado nesta quarta-feira, 13, movimentos sociais denunciaram
"ataques orquestrados bancada ruralista no Congresso" aos direitos
dos conquistados pelos movimentos.
"Membros
desse parlamento brasileiro que usam indevidamente as estruturas do Estado e o
instrumento da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para obterem benefícios
próprios e retirarem direitos inalienáveis a nós assegurados", diz o
texto, assinado por entidades como Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
(APIB), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG),
Coordenação Nacional Quilombola (CONAQ), Federação dos Trabalhadores na
Agricultura Familiar (FETRAF) e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST).
"O
governo interino e golpista de Michel Temer assevera este processo de opressão
e conflito, quando modifica em seu governo, a condução política dos órgãos
responsáveis pelas políticas territoriais entregando-os aos partidos políticos
conservadores e com vínculos fáticos com o agronegócio e com a bancada
ruralista", diz o texto.
Leia a
carta na íntegra.
"Carta
dos Movimentos Sociais do Campo contra os golpes da bancada ruralista no
Congresso Nacional”
Nós,
as organizações e movimentos sociais abaixo assinados, que integram a
articulação unitária dos povos do campo, da floresta e das águas, perante os
ataques orquestrados bancada ruralista no Congresso Nacional contra os nossos
direitos, estamos por meio desta carta, denunciando os membros desse parlamento
brasileiro que usam indevidamente as estruturas do Estado e o instrumento da
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para obterem benefícios próprios e
retirarem direitos inalienáveis a nós assegurados.
Em
outubro de 2015, por iniciativa de parlamentares vinculados aos interesses do
agronegócio, foi criada uma Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, para
supostamente investigar a atuação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a respeito da
demarcação das terras indígenas e da titulação dos territórios dos remanescentes
de quilombos, entre tantas outras questões de fato.
Esta
denúncia se embasa no fato de que a criação e o funcionamento desta CPI negam
todo e qualquer princípio constitucional, legal, jurídico e normativo, não se
amparando em fatos determinados e nem em justificativas de fundamento. Com uma
participação majoritária, os membros da bancada ruralista, utilizam-se de
inúmeros expedientes para aprovarem ou rejeitarem apenas as matérias que
atendem aos seus próprios interesses e constroem situações que extrapolam, em
muito, um papel regular que deveria ter uma CPI. Os parlamentares concentram os
principais esforços da CPI para tentar desmoralizar e criminalizar membros dos
movimentos sociais, estudiosos, trabalhadores rurais, indígenas e quilombolas
que lutam pelo direito a terra e ao território. Da mesma forma, atacam
instrumentos, políticas e as instituições públicas que têm por finalidade
jurídica atendar a estes povos.
A
realidade de desmando e autoritarismo que ora denunciamos e que é vivenciada
nesta CPI, demonstra que a democracia representativa no Brasil ainda precisa
avoluir para se consolidar. E para que isto ocorra, é fundamental a realização
de uma ampla reforma do sistema político e, também, de políticas estruturais
que alterem a brutal concentração da propriedade da terra e do poder, indo além
do que foi possível com a retomada do processo democrático no Brasil, pós golpe
militar realizado em 1964 e que perdurou até 1985. Aparentemente, nossa
democracia seguia um curso de consolidação em nosso país, com os percalços
evidentes de sua jovialidade e de um sistema político baseado na força do poder
econômico.
Com
a Constituição Federal de 1988 e a inclusão na Carta Magna de preceitos
fundamentais da participação popular, da busca pelo estado de bem estar e
justiça social e da afirmativa de garantias fundamentais às minorias, afirma-se
o Brasil como um Estado democrático de direito, apoiado em fundamentos, tais
como a dignidade da pessoa humana (art.1º), em objetivos como a construção de
uma sociedade livre, justa e solidária, erradicando a fome e combatendo o
preconceito (art. 3º) e dando a todos os cidadãos, a igualdade perante a lei
(art.5º).
No
meio rural, mesmo não havendo um processo de ampliação da reforma agrária e da
regularização fundiária de áreas ocupadas por povos e comunidades tradicionais,
foi possível nos anos recentes, algumas melhorias significativas na qualidade
de vida do povo, deflagrado, conjuntamente com políticas de estruturação
econômica, de financiamento rural, de participação social, afirmativo na busca
da igualdade de raça, etnia, geração e de gênero.
Mas
o sistema político não foi alterado e a concentração da riqueza e do poder não
foi enfrentado a contento. No meio rural, continua o Brasil a ter uma das
estruturas fundiárias mais concentradas do mundo, com forte correlação entre o
latifúndio e o poder econômico e político, onde impera a violência e o conflito
fundiário como forma de intimidação social e de classe. Ainda não nos livramos
da existência do trabalho escravo, há grupos e milícias armadas bancadas pelos
setores conservadores do meio rural que promovem o terror e a morte, consumimos
mais agrotóxicos que qualquer outro país e caminhamos para ser os primeiros em
produção transgênica de grãos.
O
processo de demarcação de áreas indígenas e quilombolas conduzido pelo Governo
Federal, nos anos recentes, só ocorreu por conta de muita mobilização social,
pois seguiam em ritmo de paralisia. Os orçamentos destinados para a FUNAI e
para o INCRA sofreram fortes ajustes, reduzindo drasticamente a capacidade de
ação. Na reforma agrária, o mesmo processo estava em curso, redução no número
de famílias assentadas e a invisibilidade do tema agrário na agenda do Governo
Federal.
Há
uma casta ruralista que exerce seu poder por diferentes matizes. Com a bancada
ruralista no Congresso Nacional, com mais de 200 representantes, exercem o
poder político. Com as vinculações ao empresariado conservador, reforçam os
preceitos do capitalismo, pela exploração da mão de obra e dos recursos
naturais na sua exaustão. E com forte vinculação econômica com as
multinacionais do agronegócio, estabelecem a promiscua relação patrimonialista
sobre o Estado.
Esta
casta atuou fortemente no processo golpista em curso no Brasil, que afasta
momentaneamente, a Presidenta Dilma do cargo de Presidenta da República.
Seguindo
propósitos semelhantes e complementares, a bancada ruralista se mobilizou para
criar a Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a atuação da
FUNAI e INCRA na demarcação de terras indígenas e de remanescentes de quilombos
(CPI FUNAI/INCRA), atropelando a Constituição Federal e inobservando a
exigência do fato determinado, utilizando a CPI como instrumento de luta
política para acirrar os conflitos no campo.
A
Constituição Federal assegurou aos povos indígenas o direito originário e o uso
exclusivo de suas terras tradicionais, às suas crenças, tradições e língua; às
comunidades quilombolas, a preservação da cultura afro-brasileira e o
reconhecimento de serem parte do patrimônio cultural brasileiro; e a destinação
para a reforma agrária dos imóveis rurais que não cumprem sua função social.
Mesmo
com estes direitos assegurados, os territórios ocupados pelos povos e
comunidades tradicionais seguem sendo violados, invadidos e apropriados pelo
agronegócio, pelos madeireiros e garimpeiros, que usurpam os recursos naturais
e utilizam da violência costumeira para exercer o domínio da terra.
São
estes os direitos que estão sendo ameaçados e que a bancada ruralista procura
enfrentar por meio desta CPI. Além dos povos e comunidades tradicionais, a CPI
procura constranger os servidores públicos do INCRA e da FUNAI e destruir suas
competências.
O
governo interino e golpista de Michel Temer assevera este processo de opressão
e conflito, quando modifica em seu governo, a condução política dos órgãos
responsáveis pelas políticas territoriais entregando-os aos partidos políticos
conservadores e com vínculos fáticos com o agronegócio e com a bancada
ruralista.
Por
toda esta situação aqui exposta, é que os movimentos sociais rurais, que
representam os assentados pela reforma agrária, os povos e as comunidades
tradicionais, decidiram denunciar nacional e internacionalmente, os interesses
dos ruralistas na condução desta CPI, usando as estruturas do Estado, para
retirar direitos sagrados.
Esperamos
contar com a solidariedade de todas as organizações sociais e dos mais
diferentes setores da sociedade que também lutam por direitos e justiça, para
que possamos construir uma forte rede nacional e internacional de apoio à causa
dos povos indígenas, povos e comunidades tradicionais do Brasil, pressionando
as instituições para que façam prevalecer seus direitos a suas terras e
territórios.
PELO
RESTABELECIMENTO DA ORDEM INSTITUCIONAL
PELA
DEFESA DA DEMOCRACIA
FORA
TEMER
Brasília,
13 de julho de 2016"
Articulação
dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)
Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG)
Coordenação
Nacional Quilombola (CONAQ)
Federação
dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (FETRAF)
Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/243767/Movimentos-denunciam-golpes-da-bancada-ruralista.htm
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