A
1ª Turma do Supremo Tribunal Federal anulou a audiência de instrução e
julgamento e os atos processuais ocorridos posteriormente — inclusive a
sentença condenatória — de um homem que foi mantido algemado durante todo o
procedimento. Segundo o colegiado, a medida não obedeceu aos critérios
estabelecidos pela mais alta corte do país na Súmula Vinculante 11. A decisão
foi publicada nesta terça-feira (7/6).
A
súmula do STF estabelece que o uso de algemas é lícito apenas nos casos de
resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física
própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros. A medida, classificada
como excepcional, deve ser justificada por escrito, sob pena de
responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, assim
como de nulidade da prisão ou ato processual a que se refere.
Acusado
por tráfico de drogas, o réu teve o pedido para retirar as algemas negado pelo
juiz da 1ª Vara Criminal da Comarca de São Gonçalo, no Rio de Janeiro, conta
Valfran de Aguiar Moreira, advogado da causa. A audiência aconteceu em setembro
do ano passado.
Na
justificativa, o juiz afirmou que “obstante não exista relato de violência ou
grave ameaça, cumpre salientar que a eventual prática de crimes desta natureza
não implica em conclusão, no mínimo precipitada, de que a personalidade do réu
não seja violenta ou que não possa ensejar perigo aos presentes ao ato. Com
efeito, o réu se encontra preso e, por tal razão deverá permanecer algemado”.
No
dia 14 de dezembro do ano passado, o ministro Luiz Edson Fachin, por decisão
monocrática, anulou o interrogatório, que antecedeu a audiência de instrução em
julgamento. Na decisão, ele ponderou que, “em decorrência da força vinculante
do verbete, não é dado ao juiz divergir da posição consolidada da suprema
corte”.
Para
o ministro, a decisão do juiz desvirtuou a lógica da súmula. “Compreende que a
infração que motiva a acusação não afasta a periculosidade do agente, partindo
da inconfessada premissa de que o uso de algemas configura regra não afastada
pelo caso concreto. Mas a ótica da súmula é inversa”, afirmou na decisão.
Apesar
disso, a defesa entrou com novo pedido no STF, desta vez solicitando o
cancelamento de todo o procedimento instrutório. Aguiar Moreira também pediu o
relaxamento da prisão do réu em razão do excesso do excesso de prazo, pois a
decretação da nulidade acarretará o prolongamento da ação penal.
O
advogado requereu ainda que a sentença não fosse reformada para pior (princípio
reformatio in pejus), pois foram reconhecidos circunstâncias favoráveis ao
acusado, como a inexistência de reincidência, o que pode autorizar o
cumprimento da pena em regime distinto do fechado.
O
pedido foi julgado pela 1ª Turma do STF no último dia 24 de maio. Fachin
reconheceu que “o reclamante foi submetido ao uso de algemas, sem fundamentação
adequada, em audiência de instrução e julgamento em que, além da realização do
interrogatório, foram colhidos depoimentos de testemunhas”.
Por
isso, na avaliação do ministro, “assiste razão jurídica ao reclamante ao
postular que a declaração de nulidade alcance o ato processual em sua
integralidade, ao invés de limitar-se ao interrogatório, conforme assentado na
decisão recorrida”.
Com
relação aos demais pedidos, o ministro concordou que a nova sentença não pode
reconhecer reincidência, circunstâncias judiciais desfavoráveis ou exasperar a
pena, fixada abaixo de oito anos de reclusão. Contudo, essa decisão deve ser
tomada pelo juiz da causa.
“A
interferência dessa limitação decisória no estado de liberdade do paciente é
tema a ser enfrentado originariamente pelo juiz da causa, descabendo ao Supremo
antecipar-se a referido exame, pena de evidente supressão de instância.
Ademais, não se verifica sequer articulação de ilegalidade ou abuso de poder
imputável, ao menos em tese, a autoridade sujeita diretamente à jurisdição
desta corte. Assim, inexistente hipótese de competência, não se justifica a
prematura manifestação do Tribunal, ainda que sob a ótica da possibilidade de
concessão da ordem de ofício”, justificou Fachin.
Seguindo
o relator, por unanimidade, a 1ª Turma do STF deu parcial provimento ao novo
pedido para “estender a nulidade declarada à integralidade da audiência de
instrução em julgamento em que o reclamante permaneceu algemado sem
fundamentação adequada, com prejuízo dos atos processuais posteriores”.
Por
Giselle Souza
http://www.conjur.com.br/2016-jun-07/stf-anula-julgamento-reu-ficou-algemado-durante-audiencia
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