A
mais cruel demonstração da justiça iníqua brasileira está no seguinte.
José
Dirceu apodrece na prisão enquanto Eduardo Cunha janta em restaurantes finos no
Rio, em São Paulo e em Brasília.
A
diferença essencial entre eles: Cunha é um serviçal da plutocracia. Ganha
gorjetas para defender criminosamente os superricos. Na Câmara, impediu por
exemplo que fosse discutida a regulação da mídia e deu todo o apoio à
terceirização.
Dirceu,
ao contrário, dedicou a vida a combater os privilégios e as mamatas da
plutocracia. Este foi seu crime real, imperdoável num país cuja elite primitiva
e predadora vive de perseguir os que a desafiam, como Dirceu.
Lembro
de um vídeo em que Moro, com sua voz esganiçada, interrogava Dirceu. Moro
parecia desconhecer que empresas como a Ambev pudessem contratar Dirceu para
ajudá-la a tratar de litígios na Venezuela, onde ele tem bons contatos com o
governo de Maduro.
Numa
outra esfera, a Globo pode fraudar a Receita, sonegar copiosamente, erguer uma
casa suntuosa numa área preservada ambientalmente: nada acontece. É a
plutocracia impune ancestralmente no Brasil. Em vez de punir a Globo, a Justiça
confraterniza com ela. Gilmar Mendes, o descarado, troca telefonemas com Bonner
para combinar pautas no Jornal Nacional na frente de testemunhas.
Gilmar,
privinciano ao extremo, tem ideia do que ocorreria se o editor de um telejornal
de Murdoch fosse apanhado combinando uma pauta com um juiz da Suprema Corte
britânica? Seria demitido, com ignomínia, imediatamente, e não escaparia da
cadeia por ligações intoleráveis.
Eduardo
Cunha é impressionante. Usou até uma igreja evangélica para obter vantagens
pessoais. Tem contas na Suíça comprovadas pelas autoridades locais sem jamais
tê-las declarado. Mentiu numa CPI ao dizer, antes que as contas fossem
conhecidas, que só tinha aquilo que declarara na Receita.
Fez
emendar para favorecer empresas que financiaram sua eleição. Ameaçou, pelos
seus paus mandados, delatores que pudessem citar seu nome em roubalheiras.
Levou uma vida nababesca, ao lado da mulher, Claudia Cruz, absurdamente
incompatível com seus rendimentos de deputado. Uma empresa ligada a ele
depositou quase 600 mil reais na conta de sua mulher.
Com
esta ficha criminosa espetacular, Eduardo Cunha não é sequer cassado. Pôde
conduzir, como se fosse Catão, o processo imundo do qual resultou o afastamento
de Dilma.
Enquanto
isso, Dirceu vai morrendo na cadeia.
A
plutocracia quis acabar com ele. E o PT, acovardado, não o defendeu. Você
conhece aqueles célebres versos de Brecht: primeiro pegam uma turma, e você se
cala. Depois, pegam outra, e você outra vez se cala. Até que pegam você.
A
plutocracia, primeiro pelo Mensalão e depois pelo Petrolão, buscou Dirceu, e o
PT nada fez. Depois foi atrás de Lula e de Dilma.
E
eis então Dirceu, esquecido por todos, às voltas com a vida sombria numa prisão
na qual foi atirado apenas pelo crime imperdoável, no Brasil, de se opor à
plutocracia.
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-maior-demonstracao-da-iniquidade-da-justica-esta-na-liberdade-de-cunha-versus-a-prisao-de-dirceu-por-paulo-nogueira/
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