O
instituto da delação premiada/colaboração é um instituto bom, democrático,
virtuoso e estratégico. A defesa deve valer-se da delação como um modo de
defender seu cliente. Porém, ela tem sido aplicada de modo perverso na operação
"lava jato".
Quem
afirma é do advogado David Teixeira de Azevedo, que participou nesta sexta-feira
de um painel sobre colaboração premiada durante o VII Encontro Anual da
Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp), em Campinas (SP). "Há uma
aplicação perversa que chamo de maldição jurídico-político-democrática da 'lava
jato'. Nela, impera uma ética pragmática e consequencialista em que os fins
querem justificar os meios", afirmou.
Para
ele, a delação tem sido aplicada de uma forma perigosa e não há mais
investigação, apenas quebra de sigilos e delações. "Quem disse que a 'lava
jato' não teria o alcance sem a 'lava jato'? No mensalão, não houve nenhum
decreto torto para determinar prisão, e os crimes foram descobertos e houve as
devidas punições."
Em
sua palestra, Teixeira de Azevedo concordou que é possível que uma pessoa presa
firme acordo de delação premiada. Isso porque, segundo o advogado, para ser
válido, o acordo precisa apenas de voluntariedade. Entretanto, ele contesta as
delações firmadas com investigados presos na operação "lava jato".
Para ele, não há voluntariedade em uma situação de prisão decretada ilegalmente
como, diz, acontece na operação.
"Existe
manifestação de vontade valida de uma prisão ilegalmente? É o que acontece na
'lava jato'? Talvez 80% das prisões ali decretadas não apresentam fundamento
processual idôneo. As prisões decretadas na 'lava jato' o foram para encaminhar
a uma delação. E não vale o argumento de que muito dos delatores não estavam
presos. É verdade, mas quem esteve próximo sabe que estavam sob a ameaça da
prisão com promessas de penas altíssimas. Mas o Tribunal Regional Federal da 4ª
Região reconheceu isso? Não. O Supremo Tribunal Federal vai reconhecer isso?
Não. Se reconhecer acaba a 'lava jato', as delações não vão valer como meio de
indicação de prova", explicou.
Outra
questão relevante registrada por Teixeira de Azevedo é a possibilidade de o
cidadão abrir mão de direitos e garantias sem a intervenção do Judiciário. Para
exemplificar sua preocupação, ele aponta o modo como hoje são homologadas as
delações, em que os termos do acordo de colaboração e o anexo, no qual são
feitas as declarações, são enviados ao mesmo tempo para o juiz. "A
intervenção do Judiciário é posterior a abertura de mão dos direitos. E se o
juiz não homologa? Todos os anexos, confissão, indicação de provas contra si e
terceiros, tudo isso já estará lá", contou.
O
advogado também questiona o trecho da lei que diz que o juiz poderá fazer a
adequação do termo de delação às suas finalidades. "É um cláusula genérica
que não se consegue entender qual é o alcance disso. Não haveria ai uma
permissão para o juiz imiscuir-se na delação? Esse é o problema da lei",
complementou.
Outro
problema da legislação está no artigo 4º, que, para Teixeira de Azevedo, é
praticamente um estelionato judicial. O parágrafo 6º, conta o advogado, afirma
que o juiz que homologou a delação sob o aspecto formal não está adstrito ao
acordo, podendo afastá-lo considerando a personalidade do réu, repercussão
social do fato e as consequências do delito.
Para
Teixeira de Azevedo, o caminho hermenêutico para tentar dar alguma segurança
jurídica, seja ao MP, seja à defesa, de que o acordo será cumprido está no
artigo que diz que o Ministério Público, no curso da ação penal, determinará ao
magistrado que aplique o perdão judicial, trazendo a ideia de vinculação do
magistrado ao pedido do MP. "Na extensão hermenêutica, podemos entender
que não só esse pedido de perdão judicial, mas todos os termos do acordo,
vinculariam o magistrado de algum modo", disse.
No
entendimento de Teixeira de Azevedo, a delação de Paulo Roberto Costa contém
problemas importantes a respeito deste instituto. "Pode o cidadão abrir
mão do direito de recorrer? Isso está lá consignado. Além disso, foi criada a
cláusula suspensiva de prescrição de direito material. Isso não é
possível!" Para o advogado, essas questões levam à perversão do instituto
da colaboração premiada.
Instituto
virtuoso
David
Teixeira de Azevedo afirmou durante o evento que a colaboração premiada é um
instituto virtuoso, que pode ser estratégico para a defesa e o cliente. Em sua
opinião, trata-se de um instituto ético, e não de traição de seus comparsas.
"Toda ação que prestigia bens jurídicos é uma ação positiva. E o que é a
delação senão a ação relevante de bens jurídicos", justifica.
Na
visão de Teixeira de Azevedo, a delação premiada nada mais é do que a
antecipação final da punição. "Depois de aplicar a pena, fazê-la cumprir,
o que se espera é que o homem reformule os seus valores. É isso que a delação
premiada busca. O homem que delata reformula os seus valores. Quer pôr-se na ordem
nas pautas sociais relevantes", conclui.
Por
Tadeu Rover
http://www.conjur.com.br/2016-abr-29/delacao-sido-aplicada-forma-perversa-afirma-davi-teixeira
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