"Em
teoria - todos e todas nós sabemos - o SUS é um dos melhores planos de saúde
pública do mundo, mas, na prática, ele deixa muito a desejar. O atendimento é
extremamente deficitário e, na maioria das vezes, de péssima qualidade",
escreve Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em
Teologia Moral (Assunção - SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG.
Eis o
artigo.
No
dia 16 de maio do corrente ano, o ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP-PR), do
governo do “golpista interino” Michel Temer, em entrevista à Folha de S. Paulo,
afirmou que o país precisa rever o direito de acesso universal à saúde pública
e a outros direitos constitucionais. É um “golpe dentro do golpe”.
Diz
o ministro: “Nós não vamos conseguir sustentar o nível de direitos que a
Constituição determina”. E ainda: “Não adianta lutar por direitos que não
poderão ser entregues pelo Estado. Temos que chegar ao ponto de equilíbrio
entre o que o Estado tem condições de suprir e o que o cidadão tem direito de
receber”. Que retrocesso!
Em
outro ponto da entrevista, o ministro afirma: “Infelizmente, a capacidade
financeira do governo para suprir todas essas garantias que tem o cidadão não
são suficientes. Não estamos em um nível de desenvolvimento econômico que nos
permita garantir esses direitos por conta do Estado”.
Ao
invés de defender - como ocorre em outros países - um SUS de qualidade, público
e gratuito para todos e todas, que acabe aos poucos com os planos particulares
de saúde, o ministro se posiciona a favor de uma privatização cada vez maior da
saúde, declarando: “Quanto mais gente puder ter planos (de saúde), melhor,
porque vai ter atendimento patrocinado por eles mesmos, o que alivia o custo do
governo em sustentar esta questão” (Folha de S. Paulo, 17 de maio de 2016, p.
B1). Que vergonha para o Brasil!
O
ministro deveria lembrar os altos tributos que os trabalhadores e trabalhadoras
pagam. “Brasileiro trabalha 151 dias para pagar tributos, que comem 41,4% do
salário”. “A conta inclui todos os tributos (impostos, taxas e contribuições)
cobrados pelo Governo Federal, Estados e Municípios. São itens como Imposto de
Renda, IPTU, IPVA, PIS, Cofins, ICMS, IPI, ISS, contribuições previdenciárias,
sindicais, taxas de limpeza pública, coleta de lixo, iluminação pública e
emissão de documentos”.
Só
para pagar a contribuição previdenciária, o trabalhador ou trabalhadora com
carteira assinada que ganha o salário mínimo (R$ 880,00), gasta por ano quase
um mês de trabalho (R$ 844,80). Imaginem o dinheiro que entra nos cofres da
Previdência!
Portanto,
ministro Ricardo Barros, o atendimento na saúde pública já é muito bem
“patrocinado” pelos trabalhadores e trabalhadoras. Não é um presente do Estado,
mas um direito universal e inalienável de todo trabalhador e trabalhadora.
Quem
sonega impostos - um verdadeiro crime contra a vida do povo - não são os
trabalhadores e trabalhadoras, mas os ricos.
“No
Brasil, o 1% mais rico da população controla uma renda equivalente à dos 50%
mais pobres. Considerando o patrimônio, vê-se que 10% da população detém 75,4%
de toda a riqueza nacional. A concentração de renda é agravada pelo sistema
tributário, por baixos salários e pela falta de investimento em serviço público
(educação e saúde)”. É uma desordem estabelecida! É uma verdadeira iniquidade
institucionalizada!
A
desculpa para justificar a privatização da saúde é sempre a mesma: o Estado não
tem recursos financeiros para atender ao direito do povo a uma saúde pública de
qualidade e a outros direitos constitucionais. Pergunto: por que o Estado
sempre tem recursos para o superfaturamento de obras públicas e para a prática
da corrupção por parte de políticos e governantes?
Ministro
Ricardo Barros, para que o direito de acesso universal à saúde pública de
qualidade e os outros direitos constitucionais sejam cumpridos, a solução é
muito simples:
1º
- Acabar com a corrupção e a roubalheira generalizadas de políticos e
governantes, colocando na cadeia todos os corruptos e ladrões de “colarinho
branco” (hoje as cadeias estão cheias de “ladrões de galinhas”).
2º
- Exigir dos políticos e governantes corruptos e ladrões - verdadeiros
assaltantes dos cofres públicos - a devolução do dinheiro roubado, com juro e
correção monetária.
3º
- Acabar com a sonegação de impostos dos ricos e poderosos, cobrando - também
com juro e correção monetária - todos os impostos atrasados.
4º
- Taxar as grandes fortunas, as fabulosas heranças e os lucros exorbitantes dos
bancos.
Ministro,
é esse o caminho para tornar o Brasil um país decente e merecedor de respeito.
Em
teoria - todos e todas nós sabemos - o SUS é um dos melhores planos de saúde
pública do mundo, mas, na prática, ele deixa muito a desejar. O atendimento é
extremamente deficitário e, na maioria das vezes, de péssima qualidade.
Cito,
como exemplo, o caso da saúde pública em Goiás. “Menos leitos, mais dor e
aflição”. “Goiás perdeu 1.461 vagas de internação de 2010 a 2015”. “Seis
cidades goianas perderam 285 leitos conveniados ao SUS”.
“O
dia se divide entre a cadeira de rodas e a cama. ‘Grito de dor’. A doméstica
Ivani Gonçalves tem 59 anos. ‘Não consigo vaga para cirurgia’. Vive presa
dentro do barracão onde mora, no Jardim Liberdade, na Região Noroeste de
Goiânia. A doméstica é uma das pessoas castigadas pela redução de 1.461 leitos
do SUS, em Goiás, entre 2010 e 2015, como aponta levantamento do Conselho
Federal de Medicina (CFM), divulgado na última semana. A queda no Estado
(11,5%) é a sexta maior do país” (O Popular, 23 de maio de 2016, p. 12-13).
Ouça
o desabafo de dona Ivani: “Tomo cinco remédios diferentes por dia para tentar
suportar a dor. A prótese está solta dentro do meu corpo. Dói demais” (Ib.).
Que situação lamentável! Essa é uma das inúmeras situações que encontramos todo
dia!
Apesar
de tantas deficiências, o SUS precisa ser sempre defendido, revisto e
melhorado, no sentido de ampliar, em número e qualidade, suas ações, em favor
de uma saúde pública gratuita e de qualidade.
Para
que isso aconteça, precisamos acabar com a corrupção - muitas vezes legalizada
- e banir da vida pública toda a cambada de políticos e governantes
oportunistas e aproveitadores do povo, que - infelizmente - são hoje a maioria.
Um outro Brasil é possível e necessário! Lutemos por ele!
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/555715-em-defesa-do-sus-contra-um-golpe-dentro-do-golpeq
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