Imagino
que poucos tenham sido os que perderam tempo de sono assistindo à encenação
barata levada a cabo no Senado da República na madrugada desta quinta-feira, 12
de maio de 2016. Este blogueiro não esteve entre esse bando de crédulos, por
óbvio. Pouco importou o que disse este ou aquele senador. As cartas estavam
marcadas.
Não
aconteceu nada de relevante no Plenário do Senado. Todos sabiam que nada havia
a esperar. Nenhuma defesa de Dilma, por mais brilhante que fosse, mudaria o
rumo das coisas. Nenhuma acusação que coonestasse o que lá ocorria veio nos
salvar da confirmação de que a democracia estava sendo violentada com requintes
de crueldade – pela capa torturante de “legalidade” (mal) estendida sobre o
processo de impeachment de Dilma Vana Rousseff.
O
impeachment, pode-se dizer, ocorreu sob amplo constrangimento dos seus autores,
dos seus executores e da assistência no entorno.
Residente
no coração do tucanistão (a região da avenida Paulista), esperava ser
infernizado por panelaços, rojões, enfim, por toda aquela parafernália golpista
que a direita vinha usando para perpetrar o crime de lesa-pátria que acaba de
ser cometido pela maioria esmagadora dos senadores da República. Mas qual nada,
um silêncio sepulcral se estendeu sobre o país.
A
repercussão internacional extremamente negativa estabelecida contra o golpe no
Brasil finalmente foi percebida pelos golpistas e, desse modo, eles trataram de
se comportar com um pouco mais de pudor – para consumo externo, claro, porque,
na intimidade, engalfinham-se em uma fétida suruba político-institucional pela
divisão do butim (Houaiss, substantivo masculino, 1836, acepção 2: produto de
roubo ou de pilhagem).
Mas
há um outro fator que explica o maior comedimento do show golpista. Um fator
que atende por nome pronunciado aos sussurros e com voz trêmula por todos os
mistificadores, manipuladores, mentirosos, enganadores, falsários,
estelionatários da fé alheia que já pisaram neste mundo: REALIDADE!
Matérias
jornalísticas sobre o ânimo beligerante que se apoderou das vítimas do golpe
paraguaio desfechado nesta quinta-feira cinzenta não explicam o motivo da
preocupação que se estabeleceu na seara golpista.
Alguns
golpistas creem na repressão como solução do descontentamento popular – e
descobrirão que até a força bruta tem limite de eficácia –, mas os mais
cerebrais sabem que essa é uma ilusão, que não haverá repressão que dê conta se
a maioria entender que foi vítima de um conto do vigário.
A
maioria esmagadora deste povo – tragicamente, uma maioria pobre, inculta e
despolitizada, mas que, na década passada, melhorou drasticamente de vida –
assistiu a crise política se desenrolar nos últimos anos tomada por um misto de
desalento, decepção, medo e insegurança quanto ao que fazer.
Desorientada,
com medo do desemprego e da volta ao passado anterior à chegada do PT ao poder,
essa maioria cedeu aos “doutores” que ignorara ao longo de quatro eleições
presidenciais seguidas – movida pelos ganhos que auferia sem parar – e,
finalmente, aceitou declarar que queria Dilma fora do cargo.
Enquanto
para a turminha fascistinha de camisetinha da Seleção e para os anônimos que
representam essa turminha na internet a decisão que o Legislativo e o
Judiciário tomaram se basta, para o povo brasileiro mesmo essa decisão não
representou nada além da possibilidade de virar esse jogo, de reverter a ameaça
de desemprego e de perda de poder aquisitivo.
Ao
contrário do que pensam os golpistas, porém, a sociedade não irá se contentar
com migalhas. A ideia deles era a de que fariam a situação piorar tanto que
depois que soltassem o garrote que puseram na economia qualquer melhora tênue
já contentaria as massas.
Dançaram.
O povo experimentou por mais de uma década o que é melhorar mesmo de vida,
adquirir propriedades, bens culturais (escolaridade), enfim, o povo
experimentou o direito e a possibilidade de sonhar muito além do que tantos
jamais haviam sonhado.
Eis
a situação que ainda vige no Brasil, mas que começou a mudar com a chegada do
PT ao poder.
Se
eu tivesse que escolher um símbolo para a era petista, pois, escolheria a
adoção pelos governos Lula e Dilma da política de cotas “raciais” nas
universidades federais e em várias universidades estaduais pelo Brasil afora.
Uma
geração de médicos negros brasileiros – coisa que não existia no Brasil antes
da chegada de médicos cubanos, mas eles são estrangeiros – será vista nos
próximos anos, mesmo que os golpistas cumpram a promessa de acabar com cotas
para negros nas universidades. A revogação dessa importante política pública
não impedirá que os que conseguiram estudar ao longo dos governos do PT exerçam
sua profissão, afrontando e espantando uma elite étnica que não concebe ou
aceita que negros possam chegar tão longe.
Eis
a realidade que os golpistas não querem ver. Eles estão se esquecendo desse
fator vital que lhes permitiu estabelecer tal fúria popular contra Dilma
Rousseff: o desejo de continuar sonhando.
Eis
que chega a realidade para os golpistas. Eles vão ter que devolver a esse povo
o que ele tinha até um par de anos atrás e que quer a todo custo voltar a ter:
condições de sonhar.
Os
golpistas vão tentar, sim, fazer o povo sonhar, mas o sonho que os governos do
PT ensinaram o povo a sonhar não é aquele que os novos donos do poder sempre
tentaram empurrar às massas empobrecidas, o sonho virtual. O povo quer sonhar
por ter começado a melhorar, não por promessas de que irá melhorar.
Em
resumo: o povo quer ver coisas acontecendo para voltar a sonhar. E o que verá
acontecendo, a partir deste 12 de maio de 2016, será bem diferente do que
pensou que veria quando acreditou que, expurgando Dilma Rousseff do cargo,
teria de volta o que ela e Lula haviam dado aos brasileiros.
Eu
não gostaria de estar na vossa pele, golpistas, quando o povo descobrir que
vocês o enganaram. Divirtam-se com o produto do assalto à democracia. Enquanto
podem.
http://www.blogdacidadania.com.br/2016/05/chegou-a-hora-da-verdade-golpistas/
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