“Se
não há dúvida que Gilmar Mendes é um sedicioso, conspirando inclusive junto com
o presidente ilegítimo, os demais juízes precisam também explicitar as suas
posições e definir se estão ao lado da democracia ou se querem ter suas biografias
irremediavelmente manchadas pelo golpismo”, diz professor da Escola de
Sociologia e Política de São Paulo
Por
Aldo Fornazieri, no Jornal GGN
Numa
democracia séria, a cúpula do PMDB, incluindo Temer, Eduardo Cunha, Sarney,
Romero Jucá, junto com Aécio Neves e outros personagens sombrios do
conglomerado que se articula em torno do PSDB estariam presos e julgados por
conspiração contra o Estado e contra a democracia. Até mesmo juízes do STF e o
Procurador Geral da República estariam sendo investigados e sob o risco de
prisão por conspiração. As gravações de Sérgio Machado não deixam dúvidas de
que houve uma ampla e criminosa conspiração contra o Estado e contra a ordem
democrática. Se não forem derrubados e presos nos próximos meses em
consequência da luta política e da desobediência civil em curso terão que ser
presos e julgados num futuro governo democrático.
Não
se poderá incorrer no mesmo erro que se incorreu com aqueles que cometeram
crimes no regime militar. Nenhuma anistia futura deverá livrar os golpistas de
hoje de condenações amanhã, quando a normalidade democrática e constitucional
for restabelecida. O ativismo político e social progressista e os intelectuais
honestamente comprometidos com o Estado de Direito devem defender abertamente e
cobrar das autoridades a necessidade de deter e julgar os golpistas. É até
mesmo conveniente que se instaure um tribunal popular, dado o possível
comprometimento do STF com o golpe, para que os conspiradores sejam julgados
num ato de julgamento cívico e político.
A
Constituição brasileira alude à existência de crimes políticos no Artigo 109,
embora não os defina. É de competência da justiça federal julgá-los. Por
decorrência lógica e exegética deve se entender que crime político é aquele
perpetrado contra a essência do Estado consubstanciada no seu ordenamento
democrático, republicano e federativo. Não resta dúvidas de que os sediciosos
conspiraram contra o ordenamento democrático do Estado, movidos por duas
motivações: assaltar o poder ao arrepio do mandato popular e proteger uma ampla
organização criminosa dos riscos de ser desmantelada e presa com os avanços das
investigações de corrupção.
O
Brasil está mergulhado numa grave crise institucional, pois além de ter um
governo golpista e ilegítimo, um presidente da Câmara suspenso, um Senado
eivado de denunciados e investigados e uma presidente legítima afastada, agora
se sabe que a Procuradoria Geral da República e o Supremo Tribunal Federal, que
deveriam ser os guardiões maiores da Constituição, estão sob a gravíssima
suspeita de terem participado do golpe ou, no mínimo, de terem se omitido
criminosamente em face de informações que detinham acerca do andamento da
sedição. O crime político dos sediciosos, perpetrado sob a aparência do
impeachment, violou a soberania popular e a estrutura constitucional do regime
político democrático. Os crimes cometidos pelos golpistas estão mais claramente
tipificados na Lei de Segurança Nacional (Lei N. 7.170), herança do entulho
autoritário, particularmente nos artigos 1º e 2º.
A
ordem democrática mostra-se frágil no Brasil em face dos ataques de grupos
sediciosos das elites. É preciso, assim, que se busque aprovação de uma lei de
defesa do Estado Democrático de Direito e da ordem constitucional. Cabe lembrar
que o pai do liberalismo político, John Locke, e a Constituição alemã de 1949,
defendiam o direito de rebelião popular quando a ordem legal e o Estado
Democrático de Direito fossem violados, como ocorre no Brasil no presente
momento.
Resistir
ao golpe e levar os conspiradores a julgamento
Hoje
cresce em todo o Brasil a resistência e a repulsa ao golpe. Os mais diferentes
setores sociais encontram formas de manifestar-se, mesmo sem uma direção
unificada. Ampliar essa resistência e fortalecer as manifestações e os
protestos é um dever demandado pelos compromissos com a democracia.
Por
paradoxal que possa parecer, os parlamentares progressistas e comprometidos com
a democracia, precisam demandar uma investigação acerca da conspiração na
Câmara dos Deputados e no Senado. Além do embate e do constrangimento
políticos, essa medida servirá para uma profilaxia política contra golpes
futuros. Os golpistas precisam ter medo da ordem democrática. Ademais, é
preciso comprometer cada vez mais as biografias dos golpistas. Eles não poderão
ter a anistia da história. Os principais órgãos da imprensa americana e
europeia não têm dúvida de que o afastamento de Dilma por um condomínio de
corruptos foi ilegal.
Os
juristas e advogados precisam demandar uma investigação no STF, por mais
comprometido que este esteja, acerca da conspiração e dos conspiradores. As
petições devem deixar claro que os golpistas precisam ser detidos e julgados.
Os juízes do STF estão sob graves suspeitas, pois as gravações dos
conspiradores deixam claro que o STF não agiu de forma isenta como guardião da
Constituição. Tanto o STF quanto a PGR, no mínimo, omitiram-se e prevaricaram
na posse de informações estarrecedoras que detinham. Se não há dúvida que
Gilmar Mendes é um sedicioso, conspirando inclusive junto com o presidente
ilegítimo, os demais juízes precisam também explicitar as suas posições e
definir se estão ao lado da democracia ou se querem ter suas biografias
irremediavelmente manchadas pelo golpismo. Sob pena de agravamento da crise, o
STF e a PGR precisam se explicar à sociedade brasileira e retomar o seu papel
precípuo de defesa da Constituição.
O
que está ficando cada vez mais claro para a maior parte da sociedade é que o
governo Temer – ilegítimo e golpista – é um governo contra os pobres, contra os
direitos sociais, contra os programas sociais, contra a cultura, contra a
educação, contra a saúde, contra as mulheres e contra os direitos das minorias.
As medidas econômicas anunciadas não tirarão o Brasil da crise. Pelo contrário,
a agravarão. As medidas não enfrentam o déficit público e o governo se prepara
para jogar seu brutal peso, se Dilma for definitivamente afastada, nos ombros
dos trabalhadores e dos mais pobres. Se o governo golpista for derrubado é
preciso que seus líderes sejam presos e julgados.
Esses
líderes estão sendo cada vez mais sitiados por cidadãos irados nas ruas. Essa
ira é santa, pois a sociedade aprendeu que a democracia, mesmo que imperfeita,
é um dos fundamentos imprescindíveis por uma sociedade justa e livre. A
sociedade percebeu também o conluio criminoso de corruptos orquestrado por
estes que estão hoje no poder. Muitos daqueles que queriam a saída de Dilma
sentem-se hoje enganados, traídos e envergonhados.
O
fato é que o golpe despertou vontades e energias de luta que estavam adormecidas.
Desencadearam forças democráticas e progressistas que lutarão contra os
retrocessos e saberão lutar pelos seus direitos e pela democracia. Assim,
convém lembrar as sábias palavras de Maquiavel: “Bendita é a guerra, quando
necessária, e piedosas são as armas quando só nas armas reside a esperança”. A
guerra hoje é a luta contra o governo ilegítimo e as armas são os protestos, os
debates, as ocupações dos espaços públicos e a hostilização pública dos
golpistas.
Aldo
Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
http://www.revistaforum.com.br/2016/05/30/aldo-fornazieri-a-conspiracao-e-o-golpismo-do-stf-e-da-pgr/
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