A
advocacia expôs nesta quinta-feira (25/2) a sua indignação com a decisão do
Supremo Tribunal Federal que abriu precedente para prisão antes do trânsito em
julgado. Durante três horas, grandes nomes da classe criticaram a corte em
evento promovido na sede da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil
para lançar um manifesto contra o entendimento.
As
críticas apresentadas vão desde decisão “tecnicamente infantil” até
“inaceitável e inconstitucional violência” aos preceitos fundamentais da
Constituição Federal. Alguns ministros, principalmente os oriundos da
advocacia, foram citados por advogados como exemplo de decepção em relação à
sentença proferida na semana passada.
A
cada fala, uma forte salva de palmas marcava a resposta do público às palavras
dos discursantes, que reafirmavam a necessidade de a advocacia assumir as
rédeas da situação e mostrar sua resistência frente à atitude da corte. Um dos
presentes chegou a interromper o discurso do ex-presidente da OAB-SP João
Roberto Egydio Piza Fontes para dizer que o Supremo “vomitou” o entendimento
que tem sido tão questionado.
“O
Supremo deve refletir sobre os riscos e caminhos que resolveu trilhar”, disse
Marcos da Costa.
ConJur
Em
suas primeiras palavras, o presidente da OAB-SP, Marcos da Costa, afirmou estar
surpreso com a mudança radical na visão garantista da corte e que, apesar de
muitas conquistas da democracia brasileira terem partido do STF, ele repudia a
decisão sobre o trânsito em julgado. “Está se consolidando um caminho perigoso
em nossa democracia.”
Segundo
Marcos da Costa, a decisão do STF mostrou que não há cláusula pétrea
inafastável. Ele também destacou que a sentença apresentada causa estranheza
porque o próprio Ministério Público não recorreu da sentença anterior que
permitia ao réu recorrer em liberdade, mesmo com a condenação em segundo grau.
Ressaltou ainda que, ao contrário de algumas informações veiculadas na mídia, o
réu do caso analisado pelo Supremo não era rico, e sua defesa foi pro bono.
Ao
ler trecho da decisão que condenou o réu, Marcos da Costa criticou o fato de a
condenação em segundo grau ter sido baseada em citações genéricas, que buscam
mais dar uma resposta à sociedade do que apresentar argumentos jurídicos
sólidos. “O Supremo deve refletir sobre os riscos e caminhos que resolveu
trilhar”, disse.
A
busca em dar respostas à sociedade, que chegou até a ser citada nos votos de
alguns ministros do Supremo, foi mencionada exaustivamente pelos advogados para
mostrar o que eles consideram ser um absurdo. “Até as pedras da Praça dos Três
Poderes sabem que não se deve ouvir os conselhos da voz das ruas”, afirmou
Piza.
Já
o conselheiro federal pela OAB-SP Luiz Flávio Borges D’Urso lembrou que a
"voz das ruas já condenou Cristo e elevou o nazismo". "Quem tem
que ouvir a voz das ruas é o Congresso, o STF tem que ouvir a voz da
Constituição."
Augusto
de Arruda Botelho, presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, foi
mais longe e afirmou que apenas casos notórios, que destoam da realidade
carcerária brasileira, são usados para justificar decisões como a tomada pelo
STF. “Nossa massa carcerária não é formada por 'lava jatos', Abdelmassihs e
Pimentas Neves [...] O Supremo errou feio”, disse.
Para
o presidente do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), Carlos
José, o Cajé, a pressão da opinião pública é o único fator que pode ser usado
como explicação para a mudança repentina de entendimento do STF.
"Raramente o Supremo comete um erro deste tamanho, e este foi
catastrófico." Ele também diz que o placar da votação no caso (7 a 4)
mostra sinais de uma divisão na corte, opondo os garantistas e os que buscam mais
efetividade.
Sanha
punitiva e estado policialesco
Os
advogados presentes no evento também foram unânimes ao afirmar que o STF cedeu
à sanha punitiva que o Brasil tem apresentado nos últimos tempos e que está
sendo formado um Estado policialesco. Para João Piza, esses acontecimentos e as
atitudes resultantes desses atos exemplificam os tempos “sombrios e difíceis”
vividos pela advocacia.
O
presidente da Associação dos Advogados de São Paulo, Leonardo Sica, lembrou que
o o STF sempre funcionou como freio da instabilidade política do país, mas com
essa decisão a corte parece ter assimilado esse problema, que terá efeitos
sobre o sistema de Justiça. "O Supremo abandonou sua função
contramajoritária. Se for assim, podemos substituir os 11 ministros por 11 cidadãos."
Manifesto
destaca que a população "assistiu, perplexa, a surpreendente decisão do
Supremo Tribunal Federal de relativizar a cláusula pétrea da 'presunção de
inocência'".
ConJur
Leonardo
Sica ressaltou ainda que os advogados têm sido xingados e chamados de
defensores de bandidos. Seu desabafo foi, minutos depois, complementado por
D’Urso: “É dever do advogado recorrer”.
O
ex-presidente da OAB-SP Antônio Cláudio Mariz de Oliveira disse que a decisão
do STF representa uma escalada vingativa e punitiva desejada pela população,
que é um sintoma de fuga em relação aos índices de criminalidade. “Mais uma vez
a ordem e as entidades representativas dos advogados se colocam na vanguarda
[por contestarem o entendimento do STF].”
Ainda
nesse sentido, o ex-presidente do Conselho Federal da OAB José Roberto Batochio
lembrou que essa busca por justiçamento, defendida pela população, era uma
forte marca em sociedades menos civilizadas. O advogado destacou também que a
prisão depois da condenação de segunda instância piorará ainda mais o
“dantesco” sistema carcerário brasileiro.
Batochio
afirmou que o STF praticou “inaceitável e inconstitucional violência” ao
alterar o entendimento relacionado à presunção de inocência e que a corte tem
fugido de suas atribuições, passando a atuar como legislador. “Se não for para
interpretar e unificar o Direito nacional, então para que servem? Somente para
sua majestade [...] Nenhuma força pode haver, nem a das armas, que substitua a
Constituição”, disse.
D’Urso,
ao também citar esse tema específico, afirmou que a decisão do Supremo
“representa um retrocesso e um desastre humanitário” que se encontra “na
contramão do Direito Penal mundial”. “Negar a presunção de inocência não é
fechar a porta da impunidade, mas abrir a porta dos erros processuais. Precisa
desenhar?”
Por
Brenno Grillo
http://www.conjur.com.br/2016-fev-25/stf-aderiu-sanha-punitiva-estado-policialesco-dizem-advogados?utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter
Nenhum comentário:
Postar um comentário