A constante exigência de
adequação formal da tutela jurisdicional e de seus respectivos instrumentos ao
seu escopo afigura-se, em época presente, exaltada em razão da inevitável
intempestividade do resultado do processo, a qual, embora também verificada em
outros sistemas, repercute negativamente na efetividade daquele, determinando a
criação de inúmeros mecanismos tendentes à atenuação desse indesejado fenômeno,
já que muito distante a sua eliminação.
No novo CPC, ao lado dos
denominados procedimentos especiais, o exemplo mais significativo do desejo de
superar as agruras das sucessivas fases do procedimento comum é a nova
configuração, no artigo 294 e seguintes, da denominada “tutela provisória”, que
disciplinam a tutela de urgência (cautelar e antecipada) e a tutela de
evidência, que propiciam, no plano teórico, o acesso a uma Justiça efetiva a
todos os jurisdicionados.
Infere-se realmente que o
aperfeiçoamento dessa técnica continua sendo devido às contingências peculiares
à universalização do procedimento comum (inevitável demora) e ao número sempre
crescente de demandas.
Não obstante, o respectivo
pronunciamento judicial antecipatório continua sendo proferido no âmbito de
cognição sumária e caracterizado pela provisoriedade, uma vez que fica na
dependência de posterior confirmação, no bojo de ato decisório de mérito, para
que seus efeitos se produzam, depois do trânsito em julgado, de forma
definitiva.
Dentre as novidades
inseridas sobre essa temática no novel diploma, o artigo 304, alterando a técnica
do diploma de 1973, estabelece a denominada “estabilização da tutela
antecipada”, caso o requerido não interponha agravo de instrumento (ou mesmo
apresente contestação[1]), situação que implica a extinção do processo, com a
ratificação do provimento antecipatório, sem contudo enfrentar o mérito.
Ademais, a teor do disposto
no parágrafo 5° da apontada norma legal, extingue-se o direito de ajuizar ação
autônoma, visando a “rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada”, após o
transcurso de dois anos, a partir da intimação da decisão que pôs fim ao
processo. Esse lapso temporal tem natureza decadencial, de sorte que futura
demanda ajuizada além desse prazo está sujeita à extinção do processo com
fundamento no artigo 487, inciso II (CPC/2015).
Trata-se, como se observa,
de técnica análoga àquela que se verifica no procedimento monitório, com a
inversão do ônus de demandar. Com efeito, uma vez expedido o mandado de
pagamento ou de entrega de coisa móvel, não opostos os embargos no prazo legal,
a decisão liminar torna-se definitiva.
Nota-se que, diante desse
contexto, o efeito ou efeitos antecipados se estabilizam por força de presumido
conformismo das partes. Contudo, exatamente por não alcançar a imutabilidade e
a indiscutibilidade, atributos reservados à coisa julgada material, o fenômeno
que aqui se observa não se subordina a qualquer eficácia preclusiva, podendo a
questão litigiosa ser reexaminada em futuras demandas entre as mesmas partes.
Nesse sentido, Heitor Sica
escreve, de forma clara, que a decisão estabilizada não parece ter a função
positiva (típica da coisa julgada material) de influir sobre a sentença a ser
proferida em processo futuro, instaurado entre os mesmos litigantes[2].
Por fim, cabe enfatizar que,
não produzindo coisa julgada material, a tutela antecipada já estabilizada não
é passível de ser atacada por meio de ação rescisória. Essa conclusão não causa
qualquer perplexidade, até porque a parte que deixou transcorrer o prazo de
dois anos para ajuizar ação autônoma de impugnação da decisão estável não
poderia mesmo ser premiada com mais um biênio para tentar rescindi-la:
dormientibus non sucurrit ius!
[1] Embora a lei não faça
referência à contestação, entendo que o juiz não pode desprezar a resposta do
réu e simplesmente extinguir o processo se não for interposto o recurso
cabível. Ademais, escapa da eficácia preclusiva decorrente do transcurso
in albis do prazo para a interposição do recurso, a teor do artigo 485,
parágrafo 3º, do novo CPC, a matéria relativa aos pressupostos processuais e às
condições de admissibilidade da ação por extravasarem do poder de disposição
das partes, subordinando-se à investigação de ofício pelo juiz, ainda que se
constate o silêncio do demandado.
[2] Doze problemas e onze
soluções quanto à chamada “estabilização da tutela antecipada”, Revista do
Ministério Público do Rio de Janeiro, 55(2015):94.
http://www.conjur.com.br/2015-dez-01/paradoxo-corte-codigo-processo-civil-traz-mudancas-tutela-antecipada?utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter
Nenhum comentário:
Postar um comentário