Seminário
promovido pelo IHU e PPG em Saúde Coletiva da Unisinos evidenciou o impacto do
uso de agrotóxicos no ambiente e toda a lógica que sustenta o sistema apoiado
no agronegócio.
“Sem
agrotóxico se compromete a produção em larga escala de diversas culturas”. “As
sementes transgênicas – e o uso de agrotóxicos implicado no seu cultivo –
aumentam a produtividade”. Essas duas frases materializam o que pesquisadores
chamam de inverdades acerca do assunto agrotóxico. Elas mascaram uma realidade,
em detrimento do interesse econômico. É a lógica do capital sendo atualizada no
agronegócio, que subverte a lógica natural. Essa foi a perspectiva que permeou
o Seminário Agrotóxicos: Impactos na Saúde e no Ambiente, realizado na segunda-feira,
24-08.
O
evento, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU e pelo Programa de
Pós-graduação em Saúde Coletiva, reuniu pesquisadores, técnicos e profissionais
de dentro e fora da universidade para debater os reais impactos do uso desses produtos
tóxicos. E, no horizonte, tentar entender por que é tão difícil enfrentar essa
lógica que estimula o seu uso. Lógica essa que faz dos agrotóxicos algo
impregnado na sociedade, muitas vezes sendo naturalizado pelo ser humano.
Como
professora do curso de Nutrição da Unisinos, Regina Alcântara estava atenta ao
debate acerca dos efeitos nos alimentos. “Para se pensar em qualidade do
alimento é fundamental discutir o uso de agrotóxicos”, disse. Sua colega, a
professora Vanessa Backes, destaca que o assunto é estrutural para o conceito
de segurança alimentar. “Até bem pouco tempo, segurança alimentar era
quantidade de alimento”, destaca, ao perceber que é por aí que entram os
argumentos para justificar usos de químicos. “Só que, felizmente, estamos percebendo
que discutir a qualidade do alimento é mais importante para a segurança
alimentar do que a quantidade. Precisamos de alimentos que realmente nos nutram
e promovam nosso desenvolvimento por inteiro”, completa.
Na
luta contra o inimigo, barata morta só no chinelo
O
agrotóxico faz mal ao ambiente e a nós mesmos. Todos sabem disso, mas poucos
conseguem perceber o quanto ele faz parte da vida cotidiana. Não precisa ser
produtor rural ou consumidor de hortifrutigranjeiros para se expor aos
agrotóxicos. “Eu, por exemplo, tento espantar a barata. Se ela não fugir, mato
só no chinelo”, diz a biomédica e professora da Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz
e da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UniRio Karen Friederich. É uma
caricatura que faz, ao destacar que dentro do inseticida doméstico há elementos
tóxicos, os chamados agrotóxicos urbanos. É um produto de uso doméstico que nem
associamos aos agrotóxicos. Inseticidas usados como bloqueador epidemiológico
pelo próprio poder público vão na mesma linha. Por exemplo, os fumacês no caso
da Dengue.
E
como tais substâncias são liberadas pelas autoridades? Karen destaca que, tanto
para usos domésticos como para agricultura, os registros para liberação são
baseados em testes que não levam em conta a complexidade das substâncias. “São
testes em condições laboratoriais onde cobaias são expostas a um determinado
agrotóxico e por uma só via. No ambiente, somos expostos a vários tipos de
agrotóxicos. Isso gera efeitos acumulativos e essa combinação pode gerar
consequências, como predisposições cancerígenas. Além do mais, também podemos
absorver agrotóxicos por mais de uma via. Os efeitos podem surgir a muito longo
prazo”, explica.
É
por isso que órgãos como Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa têm
a missão de regulamentar, analisar, controlar e fiscalizar agrotóxicos. Mesmo
os que já têm seu registro homologado. “Essa revisão é importante, pois surgem
novas pesquisas que aprofundam o conhecimento sobre as substâncias. Além disso,
há de se avaliar tanto efeitos agudos da exposição – quando se percebe um
efeito de imediato, pouco tempo depois do contato – quanto crônicos – aqueles
que podem se manifestar muito depois”, completa.
Atualmente,
a grande preocupação dos pesquisadores é com relação à liberação da nova geração
de transgênicos, resistentes ao agrotóxico 2,4-D. “Esse agrotóxico tem em sua
composição substâncias que faziam parte do Agente Laranja, usado na Guerra do
Vietnã”, explica. Por isso, o produto está na lista da Anvisa para reavaliação,
assim como o Glifosato. “A liberação de sementes resistentes ao Glifosato
aumentou em muito seu consumo. Tememos que isso ocorra com o 2,4-D, que tem um
impacto ainda maior”, alerta Karen.
E
como fugir dos agrotóxicos? Para o agrônomo Leonardo Melgarejo, integrante da
Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural – Agapan, é preciso romper
com a lógica do agronegócio. Produzir mais alinhado com princípios da
agroecologia. Mas para isso é preciso consumir mais alimento agroecológico. O
estímulo para isso passa por políticas públicas. É esse o objetivo do Plano
Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – Planapo. Para fazer este plano
funcionar é necessária a implementação de outro, o Programa Nacional de Redução
de Agrotóxicos – Pronara. “Diminuindo o uso de agrotóxicos, caminhamos para
outros sistemas produtivos como a produção orgânica”, destaca.
O
problema é que a pressão do agronegócio pesa sobre o poder público. Assim, os
planos acabam patinando. “Mas nós, enquanto sociedade, temos nosso papel.
Devemos lutar contra essa maquiagem de informação e não aceitar o retrocesso. A
retirada da indicação da presença de alimentos transgênicos no rótulo de
alimentos é isso. Sonega uma informação e limita o poder de escolha do
consumidor”. O caminho, para Melgarejo, é buscar fóruns em que se possa fazer
pressão. Defende que é preciso saber o que está sendo discutido sobre a
legislação de agrotóxicos e transgênicos para buscar a implementação dos
planos, rompendo a cadeia do agronegócio. “A informação é a chave. Ela nos dá protagonismo.
Para isso podemos buscar entidades que nos auxiliam”, provoca, ao estimular a
plateia a buscar informação e cobrar ações, por exemplo, de senadores gaúchos a
respeito da mudança na legislação sobre rotulagem de alimentos transgênicos.
“Informação, participação e controle social. É o que precisamos”.
Por
João Vitor Santos
Da
IHU-Online
http://www.mst.org.br/2015/08/26/agrotoxico-o-inimigo-entre-nos.html
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