O
município de Rio Claro e o Arquivo Público e Histórico foram condenados ao
pagamento de indenização por danos morais a dois empregados cujas mensagens
eletrônicas foram acessadas pela superintendente da autarquia. Os ministros
consideraram abusiva a conduta, que violou o sigilo da correspondência e o
direito à intimidade dos trabalhadores assegurados no artigo 5º, incisos X e
XII, da Constituição Federal. A determinação foi da 1ª Turma do TST.
O
abuso de autoridade que justificou o reconhecimento do direito à indenização
constituiu-se no ato de acessar um dos computadores utilizados no ambiente de
trabalho e divulgar as mensagens trocadas pelo programa de mensagem instantânea
MSN entre uma analista cultural e um auxiliar administrativo, sem a autorização
deles. Nos textos, eles faziam críticas à administração do órgão.
De
acordo com o relator do processo, ministro Hugo Carlos Scheuermann, o empregador
está autorizado a adotar medidas que garantam a proteção de sua propriedade e
tem a prerrogativa de compelir seus empregados ao cumprimento do trabalho.
Todavia, os meios utilizados devem observar os direitos fundamentais do
trabalhador, dentre os quais se inclui o direito à intimidade.
Os
autores da ação relataram que as desavenças tiveram início ao final de 2005,
quando a superintendente da autarquia responsabilizou a analista cultural pelo
fracasso de uma campanha de lançamento da agenda cultural de 2006. Na
discussão, a superiora teria desqualificado um projeto que estava sendo
desenvolvido pela analista, que indagou o que fazer com o trabalho já iniciado.
Após a resposta de que fizesse o que achasse melhor, a empregada apagou o
arquivo do computador.
No
dia seguinte, a superintendente determinou a contratação de técnico de
informática para a recuperação do documento. Durante a varredura no computador,
foram identificadas mensagens trocadas entre a analista e o assistente, nas
quais expressavam críticas aos colegas de trabalho. Os trabalhos técnicos
perduraram por três dias consecutivos, e o acesso às mensagens só foi possível
após algumas tentativas na simulação de senhas, com a utilização, inclusive, de
dados do filho da analista.
Na
sentença, a juíza da Vara de Rio Claro (SP), após apreciar os pedidos de
reintegração, transferência do local de trabalho, anulação das punições e
reparação por danos morais, considerou ilícita a obtenção das provas por parte
da empresa e determinou o retorno dos trabalhadores ao trabalho e o pagamento
de 30 salários mínimos para cada um. Inconformados, o Município e o Arquivo
Histórico recorreram ao Tribunal do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP), que
reformou a sentença. O entendimento foi que o direito ao sigilo da
correspondência não pode servir de pretexto para a utilização indevida, entre
colegas de trabalho, do equipamento público, já que este equipamento é posto à
disposição para a atividade profissional, e não para o lazer durante a jornada
de trabalho.
No
TST, o recurso de revista dos trabalhadores foi provido para restabelecer a
condenação. De acordo com os integrantes da Primeira Turma, a comunicação via
MSN, mesmo no horário de trabalho e em computador fornecido pela empresa, tem
caráter pessoal e, por isso, é inviolável, não sendo permitido ao empregador
qualquer tipo de controle relativo ao seu conteúdo.
Durante
o julgamento, o ministro Lelio Bentes Corrêa lembrou que o caso julgado era
diferente de outros nos quais não se considerou violação de direito íntimo o
monitoramento de acesso de e-mail corporativo. A primeira decisão que firmou
esse posicionamento foi proferida em 2005, pela própria Turma, que seguiu o
voto do então presidente daquele colegiado, ministro João Oreste Dalazen. Ele
ratificou a justa causa aplicada pelo Banco HSBC a um trabalhador que fez uso
impróprio do e-mail corporativo para enviar a colegas algumas fotos
pornográficas. As provas de conduta ilícita foram obtidas pelo HSBC ao rastrear
o e-mail do bancário, que havia admitido que a ferramenta era de utilização
restrita a assuntos e matérias afetas ao serviço (RR-61300-23.2000-5-10.0013).
À
época, Dalazen enfatizou que os direitos do cidadão à privacidade e ao sigilo
de correspondência, constitucionalmente assegurados, restringem-se à
comunicação estritamente pessoal. O e-mail corporativo, concluiu, é cedido ao
empregado. Por se tratar de propriedade do empregador, a esse é autorizado o
controle formal e material (conteúdo) das mensagens que trafegam pelo seu
sistema de informática.
No
caso julgado agora, o relator destacou precedentes que tratam de hipótese
diversa: neste caso, o uso era de e-mail pessoal, e não corporativo. O ministro
Hugo Scheuermann citou ainda doutrina segundo a qual o e-mail particular do
trabalhador, mesmo que acessado das dependências da empresa, assim como
ferramentas de conversação como o MSN, é inviolável e tem garantido seu sigilo,
não podendo o empregador monitorá-lo de qualquer forma – cabendo a empresa, se
for o caso, proibir a instalação de tais programas. Uma vez permitida sua
utilização, ainda que tacitamente, os dados ali contidos fazem parte do âmbito
privado do trabalhador.
Ao
definir o valor da reparação por dano moral, o ministro Scheuermann ressaltou o
caráter pedagógico-punitivo de que a medida deve ser revestida, de modo que a
indenização não pode ser excessiva à parte que indeniza e nem se configurar
fonte de enriquecimento indevido das vítimas. O valor foi estabelecido em R$ 10
mil para cada autor.
Processo:
RR-4497-69.2010.5.15.0000
Fonte:
TST
Jorge
André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

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