Em
plena juventude, (final dos anos 60) no auge do movimento hippie, estávamos eu
e o Luiz Loko (Luiz Diógenes Trindade) sentados em um banco da denominada
Pracinha dos Bombeiros aqui de Santa Maria, RS, tocando violão e ensaiando uns
vocais. Luiz foi o melhor cantor com o qual eu tive contato em toda a minha
vida de músico (33 anos) e na época era o único que cantava músicas do Led
Zeppelin sem ficar devendo nada para o cantor Robert Plant, além de fazer shows
com canções de Elvis Presley e da banda Creedence
Clearwater Revival.
Eis
que se aproxima um amigo comum, o Pata Pata, um hippie que dormia nas praças e
construções, vivia na estrada e já havia percorrido de carona toda a América.
Ele andava sempre com um bongô que tocava maestria, mas era muito desafinado.
Mesmo assim ele fez um ritmo do country e praticamente recitou a letra de uma
poesia de sua autoria chamada Duda.
Eu
e o Luiz Loko nos apaixonamos pela letra em virtude da beleza e simplicidade
dos versos. Então o Luizão compôs para ela uma melodia que tinha três ritmos e
necessitava ter um alcance vocal muito grande, quase impossível de ser cantada
por qualquer cantor mediano. Esta versão ele chegou a gravar, mas depois
quebrou o disco em um dos seus momentos de loucura. Reza a lenda que ele chegou
a tocar a canção dele em algumas apresentações, inclusiva ali no auditório do
Colégio Maria Rocha.
Eu
por minha, vez, como sempre fui apenas músico e não tinha um grande alcance
vocal, fiz uma outra melodia para que eu pudesse cantar sem maiores problemas.
O próprio Luiz Loko cantava também esta minha versão em suas apresentações,
pois dizia que era mais “dançante”.
Para
complementar a história pitoresca, o Pata Pata era um sujeito muito
inteligente. Ele subia na mureta e discursava lá na frente da Faculdade de
Direito recebendo aplausos efusivos dos alunos, pois sabia de cór várias
passagens de filósofos, desde aqueles da Grécia Antiga até os mais modernos e
sabia usá-las com perspicácia para fazer sua crítica ao regime militar. Ele só
parava quando a polícia chegava e o retirava à força de lá.
Infelizmente
ele morreu afogado no ano de 1971, pouco mais de um ano depois do dia em que
nos mostrou a letra de Duda. Na noite de sua morte eu estava tocando lá na casa
do Chopp que ficava lá na Rua do Acampamento. Por volta de meia-noite, chegaram
o Luiz, o Xirú, o Mudo e o Pata Pata e disseram que iam a pé até o Balneário do
Passo do Verde tomar banho no rio e me convidaram para ir junto. Eu disse que
não podia, pois estava tocando e eles partiram. Para nossa tristeza, por lá o
Pata Pata acabou morrendo afogado.
Há
mais ou menos um ano eu encontrei o Xirú ali mesmo na Pracinha dos Bombeiros
(onde hoje eu vou quase diariamente para escutar alguns jovens que ainda tocam
violão por ali e fazer exercícios na academia ao ar livre) e nós recordamos
algumas destas histórias.
O
Xirú é o único sobrevivente daquele grupo. Ele foi garçom e era marido da
Ester, uma cantora que chegou a tocar com a minha companheira Clarinha no grupo
feminino Andrômedas. Ela faleceu em um acidente e o Xirú acabou viciado em
álcool, fato que fez com que ele não conseguisse mais emprego em lugar algum.
Várias vezes eu me deparei com ele dormindo nas praças Saldanha Marinho e dos
Bombeiros, momentos em que ele sequer me reconhecia. Quando eu o encontrei
recentemente ele estava saindo de uma internação, mas já estava em companhia de
uma garrafinha de cachaça. Não o vi mais, mas naquele dia conseguimos conversar
e ele lembrou de várias das minhas músicas e desta história do Pata Pata.
Histórias
malucas, mas são relatos de pessoas que passaram por nossas vidas, deixando
marcas indeléveis em nossos corações. E foi com muito prazer que acabei sendo
brindado pelo Maestro Paulo Rosa com uma bela versão que ele fez juntamente com
seu filho Fábio Rosa para a melodia que compus há mais de quarenta anos atrás
para a letra de Pata Pata.
Bem,
de qualquer maneira, o meu velho e saudoso amigo Luiz Loko também é um dos
autores espirituais desta singela canção que tanto encantou o pessoal de nossa
geração. Eu até lembro da melodia por ele criada, mas precisaria de um cantor
excepcional para reproduzi-la. Então por enquanto, fica aqui a minha homenagem
a todas estas pessoas que deram e que ainda dão brilho em toda minha caminhada,
sempre em forma de canções.
Jorge
André Irion Jobim.
Eis
aqui a letra e a música
DUDA
Música:
Jorge André Irion Jobim
Letra
: Pata Pata
Interpretação:
Paulo Rosa e Fabio Rosa
Duda,
é impossível
Ser
insensível ao teu olhar
Da
janela do trem, que vai partindo
Para
o além
Vai
te levando e não vai voltar
Duda...Teu
sorriso está molhado
Te
aceno entre o cansaço
E
o grito contra a guerra
E
o grito contra a guerra
Lá
vai o trem...
Já
não sou ninguém
Lá
vai o trem...
Já
não sou ninguém Jorge André Irion Jobim, Pata Pata e Luiz Loko
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