O
cônjuge sobrevivente que era casado sob o regime da comunhão parcial de bens
não concorre com os descendentes na partilha de bens particulares do falecido,
mas, além de ter direito à meação, não pode ser excluído da sucessão dos bens
comuns, em concorrência com os demais herdeiros. O entendimento é da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Na
ação de inventário que deu origem ao recurso especial, o juízo de primeiro grau
considerou que uma viúva que fora casada em regime de comunhão parcial, além da
meação a que tinha direito (metade do patrimônio conjunto adquirido durante o
casamento), deveria entrar na divisão dos bens particulares do marido (aqueles
que ele tinha antes de casar), concorrendo na herança com os descendentes dele.
A
decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Diante disso, o
espólio do falecido recorreu ao STJ para pedir a exclusão da viúva na partilha
dos bens particulares.
Os
ministros decidiram o caso com base na interpretação do artigo 1.829, inciso I,
do Código Civil de 2002 (CC/02), segundo o qual, “o cônjuge supérstite casado
sob o regime da comunhão parcial de bens integra o rol dos herdeiros
necessários do de cujus, quando este deixa patrimônio particular, em
concorrência com os descendentes”.
Bens
exclusivos
A
ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial, lembrou que, antes da
Lei do Divórcio, o regime natural de bens era o da comunhão universal, “que
confere ao cônjuge a meação sobre a totalidade do patrimônio do casal, ficando
excluído o consorte da concorrência à herança”.
A
partir da vigência da Lei 6.515/77, o regime natural passou a ser o da comunhão
parcial, “segundo o qual se comunicam os bens que sobrevierem ao casal, na
constância do casamento, consideradas as exceções legais”, afirmou.
Segundo
a ministra, essa mudança, que foi confirmada pelo CC/02, fez surgir uma
preocupação, porque seria injustificável passar do regime da comunhão
universal, no qual todos os bens presentes e futuros dos cônjuges são
comunicáveis, para o regime da comunhão parcial – sem dar ao cônjuge
sobrevivente o direito de concorrer com descendentes e ascendentes na herança.
Por
essa razão, o cônjuge passou a ser considerado herdeiro necessário. Para
Andrighi, “o espírito dessa mudança foi evitar que um consorte fique ao
desamparo com a morte do outro”.
Apesar
disso, ela considera que, na comunhão parcial, os bens exclusivos de um cônjuge
não devem ser partilhados com o outro após a sua morte, “sob pena de infringir
o que ficou acordado entre os nubentes no momento em que decidiram se unir em
matrimônio” (artigos 1.659 e 1.661 do CC).
Para
a relatora, a interpretação mais justa do artigo 1.829, inciso I, do CC é
aquela que permite que o sobrevivente herde, em concorrência com os
descendentes, a parte do patrimônio que ele próprio construiu com o falecido,
“porque é com a respectiva metade desses bens comuns que ele pode contar na
falta do outro, assim na morte como no divórcio”.
Melhor
interpretação
Em seu entendimento, a interpretação de parte da doutrina
de que o cônjuge herda, em concorrência com os descendentes, tanto os bens
comuns quanto os particulares, representa “a transmutação do regime escolhido
em vida”. Além disso, para ela, essa interpretação conflita com os princípios
da dignidade da pessoa humana, autonomia privada, autorresponsabilidade,
confiança legítima, boa-fé e eticidade.
Por
fim, a ministra ressaltou que “afastar o cônjuge da concorrência hereditária no
que toca aos bens comuns, simplesmente porque já é meeiro, é igualar dois
institutos que têm naturezas absolutamente distintas”: a meação e a herança.
Andrighi
disse que a meação já é do viúvo em virtude da dissolução do casamento pela
morte, enquanto a herança “é composta apenas dos bens do falecido, estes sim
distribuídos aos seus sucessores, dentre os quais se inclui o consorte
sobrevivente”.
Jorge
André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
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