A
existência de vínculo socioafetivo com pai registral não pode impedir o
reconhecimento da paternidade biológica, com suas consequências de cunho
patrimonial. O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ).
O
colegiado, de forma unânime, seguiu o entendimento da relatora do caso,
ministra Nancy Andrighi, para quem o reconhecimento do estado de filiação
constitui direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, que pode ser
exercitado, portanto, sem nenhuma restrição, contra os pais ou seus herdeiros.
“Se
é o próprio filho quem busca o reconhecimento do vínculo biológico com outrem,
porque durante toda a sua vida foi induzido a acreditar em uma verdade que lhe
foi imposta por aqueles que o registraram, não é razoável que se lhe imponha a
prevalência da paternidade socioafetiva, a fim de impedir sua pretensão”,
assinalou a ministra.
Vínculo
prevalente
Na
ação de investigação de paternidade, a filha, que foi registrada pelo marido de
sua mãe, pretendia o reconhecimento da paternidade biológica, a alteração de
seu nome e sua inclusão, como herdeira universal, no inventário do pai
biológico.
A
família do pai biológico contestou o pedido, sustentando a inexistência de
relacionamento entre ele e a mãe da autora da ação; a falta de contribuição da
autora na construção do patrimônio familiar e a prevalência da paternidade
socioafetiva em relação à biológica.
Em
primeiro grau, o magistrado declarou a paternidade, com fundamento no exame
positivo de DNA, e determinou a retificação do registro de nascimento. Além
disso, declarou a autora legítima herdeira necessária do pai biológico, fazendo
jus, portanto, à sua parte na herança, no mesmo percentual dos demais filhos. O
Tribunal de Justiça de Santa Catarina manteve a sentença.
No
recurso especial ao STJ, a família do pai biológico voltou a sustentar a
prevalência do vínculo socioafetivo em relação ao biológico, para declaração da
paternidade com todas suas consequências registrais e patrimoniais. Segundo a
família, houve, na realidade, uma “adoção à brasileira” pelo marido da mãe da
autora, quando declarou no registro de nascimento da criança que ela era sua
filha.
Melhor
interesse
Em
seu voto, a ministra Andrighi mencionou que a prevalência da
paternidade/maternidade socioafetiva frente à biológica tem como principal
fundamento o interesse do próprio menor, ou seja, visa garantir direitos aos
filhos face às pretensões negatórias de paternidade.
Entretanto,
a ministra afirmou que a paternidade socioafetiva não pode ser imposta contra a
pretensão de um filho, quando é ele próprio quem busca o reconhecimento do
vínculo biológico.
“É
importante frisar que, conquanto tenha a recorrida usufruído de uma relação
socioafetiva com seu pai registrário, nada lhe retira o direito, em havendo sua
insurgência, ao tomar conhecimento de sua real história, de ter acesso à
verdade biológica que lhe foi usurpada, desde o nascimento até a idade madura”,
disse a relatora.
O
número deste processo não é divulgado em razão de sigilo judicial.
Jorge
André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
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