terça-feira, 29 de novembro de 2011

DETRAN RS. CONDENAÇÃO A PAGAR LUCROS CESSANTES A MOTORISTA



Com o entendimento de que o Detran não pode ser penalizado por negar pedido de renovação da Carteira de Nacional de Habilitação mas que, se falha administrativamente, retarda um processo e prejudica o motorista profissional, deve indenizá-lo por lucros cessantes, a 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirmou sentença que negou danos morais e concedeu danos materiais a um taxista de Porto Alegre, que penou para renovar sua CNH. O acórdão é do dia 14 de outubro.

Dos fatos

Motorista de táxi há 25 anos e com 31 de habilitação, o autor foi vítima de acidente de trânsito em 1989, quando pilotava uma motocicleta. Em decorrência das lesões, ele teve de amputar o pé direito passando a usar uma prótese. A sequela física, entretanto, não lhe impediu de trabalhar normalmente como taxista — tanto que pode renovar a sua carteira de habilitação em 1997.

Entretanto, no dia 9 de janeiro de 2003, ao encaminhar a documentação para renovar a sua CNH — cuja validade expirava no dia 14 de janeiro —, foi informado que sofreria avaliação de uma junta médica especial do Detran. Os três médicos que o avaliaram — nenhum era ortopedista — entenderam que o autor somente poderia dirigir carro adaptado, conforme a Resolução 80/98 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). E mais: foi proibido de exercer atividade remuneratória — vedação aplicável a quem usa veículo adaptado.

O autor, então, apelou administrativamente do parecer dos médicos junto ao Conselho Estadual de Trânsito do Rio Grande do Sul (Cetran), a fim de fazer um novo exame — o que lhe foi deferido. Nesta fase, a história se repetiu. Como os médicos que o examinaram não tinham especialidade em Ortopedia, o diagnóstico acabou sendo o mesmo, bem como a proibição.

Novamente derrotado, o autor não se conformou. Interpôs recurso ao presidente do Cetran gaúcho, que acabou reconhecendo a ilegalidade da restrição estabelecida pela Resolução 80/98 do Contran — que na prática impede os condutores de veículos adaptados de exercerem atividades remuneratórias. Além disso, o Cetran nomeou outra junta médica para avaliá-lo, desta vez com um médico ortopedista. O novo parecer, finalmente, atestou que estava apto para conduzir veículos em segurança. Assim, em 22 de abril, o Detran concedeu-lhe a permissão para voltar a dirigir.

Da decisão

Depois de toda esta peregrinação, o taxista foi à Justiça contra a autarquia para pedir reparação, já que ficou 99 dias sem exercer sua profissão. Logo, não auferiu nenhum rendimento nesse período. Ele calculou seu prejuízo, devidamente atualizado, em R$ 16.430,00. Além dos lucros cessantes, pediu também indenização por danos morais, uma vez que o ente público dificultou a renovação da CNH.

Em sua defesa, o Detran sustentou que ausência de ilegalidade, na medida em que somente pode conceder licença para dirigir quando o requerente satisfaz todos os requisitos legais para a sua obtenção. Disse, também, que o autor não comprovou o sofrimento alegado, que viesse a ensejar dano moral. Por fim, contestou o fato de que o autor tenha ficado 99 dias sem dirigir, mas tão somente oito dias.

Na primeira instância, o juiz Niwton Carpes da Silva entendeu que ficou demonstrada a restrição ao exercício profissional, afrontando o artigo 5º, Inciso XIII, da Constituição Federal. O juiz julgou a demanda parcialmente procedente. Negou a concessão de dano moral e admitiu os danos materiais sofridos.

No primeiro caso, entendeu que a prova carreada aos autos ‘‘apenas ficou gravitando na órbita do dissabor natural e contemporâneo com a época em que vivemos, sem maiores repercussões, quer no sentimento pessoal, sem humilhação exagerada, um sofrimento extraordinário ou mesmo no campo do padecimento moral ou pessoal’’.

Quanto ao valor devido a título de lucros cessantes, disse que o montante do débito deveria ser apurado com base na média mensal auferida a partir dos ganhos declarados à Receita Federal, relativos a 2002, ‘‘já que, em relação ao exercício de 2003, a renda restou prejudicada em virtude do período em que o autor ficou impossibilitado de exercer a função de motorista de táxi por não contar com a CNH. Essa média mensal deverá ser multiplicada pelos meses em que este ficou sem trabalhar’’, decretou o juiz.

Após a decisão de primeiro grau, a autarquia e o taxista apelaram ao Tribunal de Justiça. O Detran argumentou, em síntese, que agiu no exercício regular de seu direito e que o recurso acabou sendo provido no âmbito administrativo. Por fim, sustentou que a possibilidade do Poder Público rever o resultado de uma avaliação médica não pode gerar direito à indenização. Já o autor pediu a reforma da sentença sobre a ocorrência de abalo moral, já que o fato não se resumiu a um ‘‘mero dissabor’’.

O relator do caso, desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro, também não viu dano moral e confirmou a sentença no tocante a danos materiais. Disse que tudo corria bem até a interposição do segundo recurso administrativo. Todavia, quando o autor foi submetido a novo exame, em 20 de fevereiro de 2003, ocorreu falha da Administração Pública, pois não foi observado o item 19.3 da Resolução nº 80/98, que altera os anexos I e II da Resolução nº 51/98 do Contran.

O item diz textualmente: ‘‘O Exame de Aptidão Física e Mental, em grau de recurso, será realizado por junta médica constituída por 3 (três) médicos, sendo sempre um, pelo menos, com a especialidade vinculada com a causa determinante do recurso.”

Esta falha administrativa, ocorrida a partir do dia 20 de fevereiro, é que deve servir de marco inicial para a contagem dos lucros cessantes — e não a data apontada na sentença. ‘‘Logo, dou parcial provimento ao recurso do Detran no tópico para modificação do termo inicial dos lucros cessante’’, finalizou.




Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

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