Organização
revelou presidentes espionados pelos EUA, o manual de torturas do Pentágono,
civis assassinados por soldados sorridentes. Prisão de Assange é um recado:
quem apontar os crimes do poder será duramente castigado
Desde
sua fundação, em 2006, a organização WikiLeaks contribuiu para revelar algumas
das atividades mais sombrias levadas a cabo pelas mais altas instâncias do
poder político em diversos países.
Através
do vazamento anônimo de milhares de documentos, esta rede internacional de
ciberativistas, fundada por Julian Assange – detido nessa quinta-feira em
Londres – revelou segredos militares, políticos e diplomáticos, gerando
notáveis escândalos e denunciando comportamentos não-éticos ou pouco ortodoxos
dentro de diferentes organizações de poder.
Espionagem,
crimes de guerra, pressões políticas ou diplomáticas, abusos de poder ou más
práticas governamentais vieram à tona graças ao trabalho do WikiLeaks.
Relembramos
os vazamentos mais importantes realizados por essa organização, alguns dos quais
mudaram completamente a percepção de vários acontecimentos na história recente
do mundo.
1. Manual do Exército dos EUA
para a prisão de Guantánamo
Em
dezembro de 2007, o WikiLeaks publica um manual do Exército dos EUA para os
soldados responsáveis pela custódia dos prisioneiros do centro de detenção de
Guantánamo.
O
texto compila os “procedimentos operacionais padrão” que se aplicam aos
internos, que incluem medidas como o uso de cachorros com a intenção de
intimidá-los e a restrição de acesso ao local a membros do Comitê Internacional
da Cruz Vermelha.
O
aumento de problemas de saúde mental e o número de suicídios entre os presos
também aparecem compilados no documento.
2. Ataque aéreo a civis em
Bagdá
No
dia 5 de abril de 2010, a organização comandada por Assange vazou um arrepiante
vídeo que mostra como um grupo de civis são atacados com potentes armas de fogo
a partir de um helicóptero estadunidense AH-64 Apache, no dia 12 de julho de
2007.
Os
soldados a bordo da aeronave, cujas conversas – muitas vezes, joviais – se
escutam na gravação vazada, atiraram contra um grupo de iraquianos, matando 12
deles, entre os quais se encontravam dois colaboradores da agência de notícias
Reuters: Namir Noor-Eldeen e Saeed Chmagh.
3. O “diário da guerra do
Afeganistão”
Foi
o maior vazamento de documentos sigilosos na história militar estadunidense até
o momento e se constitui como um grande marco no desempenho informativo do
WikiLeaks: no dia 25 de julho de 2010, a organização dirigida por Assange
publica 90 mil páginas, divididas em mais de 100 categorias, que coletam
diversos incidentes e relatórios sobre a guerra do Afeganistão.
Os
documentos revelaram, por exemplo, que os EUA ocultaram brutais massacres
cometidos pelos talibãs (que resultaram em duas mil vítimas civis) e os casos
de 195 pessoas desarmadas que morreram nas mãos da força de coalização,
resultado de disparos motivados pelo medo de que fossem terroristas suicidas. A
busca por Osama Bin Laden também está extensamente documentada nesses
relatórios.
O
WikiLeaks enviou, simultaneamente, esta informação ao jornal estadunidense The
New Yortk Times, ao britânico The Guardian e ao Der Spiegel, na Alemanha.
4. Os registros da guerra do
Iraque
O
WikiLeaks supera sua própria façanha apenas três meses depois: no dia 22 de
outubro de 2010, vaza quase 400 mil documentos sobre a guerra do Iraque, cujo
conteúdo horroriza o mundo.
Esse
vazamento massivo inclui uma recontagem de vítimas, elaborada pelo próprio
Exército dos Estados Unidos, enumera os falecidos no Iraque em 109.032 e
reconhece que cerca de 60% deles são civis. Os documentos também revelam vários
casos de soldados estadunidense que mataram civis em postos de controle.
Outro
aspecto escandaloso descoberto nessa impressionante remessa de documentos é a
constatação de que os EUA tolerou abusos, torturas, estupros e até execuções
sumárias de civis cometidas por forças iraquianas aliadas, as quais
supervisavam e treinavam.
5. O “cabogate”: documentos da
diplomacia estadunidenses
No
dia 28 de novembro de 2010, o WikiLeaks volta a escandalizar o mundo com o
vazamento de mais de 250 mil mensagens do Departamento de Estado dos EUA, que
revelam episódios inéditos ocorridos em várias pontos conflituosos do mundo,
assim como dados de grande relevância que evidenciam uma parte considerável da
política exterior estadunidense, assim como suas obsessões, seus mecanismo e
suas várias fontes.
Trata-se
de umas das revelações mais profundas e importantes feitas pelo WikiLeaks, na
medida em que contribui para a compreensão, por parte dos cidadãos, de como os
Estados Unidos conduz de forma sombria suas relações internacionais.
Esses
documentos contêm comentários e relatórios elaborados por diferentes
funcionários da diplomacia estadunidense, em certas ocasiões escritos com uma
linguagem muito sincera, e se referindo a personalidade do mundo todo. Também
revelam conteúdos de conversas e reuniões de funcionários de alto escalão, e
até relatam desconhecidas atividades que se relacionam diretamente com
espionagem.
Em
alguns casos, a própria natureza das expressões usadas nessas mensagens pôs em
perigo as relações dos Estados Unidos com alguns de seus aliados; outras vezes,
chegaram a dificultar certas estratégias estadunidenses na política exterior,
como a aproximação com a Rússia ou com certos países árabes.
A
documentação foi enviada do servidor do WikiLeaks aos jornais El País
(Espanha), Le Monde(França), Der Spiegel (Alemanhã), The Guardian (Reino Unido)
e The New York Times (EUA).
6. Os arquivos de Guantánamo
No
dia 25 de abril de 2011, o WikiLeaks vazou quase 800 documentos secretos do
Pentágono que revelavam que o governo dos EUA utilizou o centro de detenção de
Guantánamo de forma ilegal para obter informações de seus presos, muitos do
quais não tinham qualquer vínculo com o terrorismo.
Foram
4.759 páginas datadas entre 2002 e 2009, assinadas pelos mais altos comandos da
Força Conjunta da base e dirigidas ao Comando Sul do Departamento de Defesa em
Miami. Entre eles, havia dossiês confidenciais, entrevistas e memoriais
internos que refletiam, por exemplo, o frágil estado mental de alguns presos,
como o de uma criança de 14 anos ou de um idoso de 89.
Os
EUA chegaram a admitir nesses relatórios que 83 dos 779 reclusos não ofereciam
nenhum risco para a segurança da nação e, quanto a outros 77, reconheceu que é
“improvável” que fossem uma ameça a seu pais ou para algum de seus aliados. O
próprio Exército norte-americano estimou que aproximadamente 20% dos presos
foram levados para a prisão de forma arbitrária.
7. Políticas de detenção em
Guantánamo e Abu Ghraib
No
dia 23 de outubro de 2012, o WikiLeaks revela em abundante documentação – mais
de 100 relatórios – detalhes sobre os procedimentos empregados por autoridades
militares estadunidenses contra prisioneiros sob sua custódia nas prisões de
Abu Gharaib (Iraque) e, de novo, em Guantánamo (Cuba).
No
dia em que fizeram esse vazamento, os EUA estavam na reta final da campanha
eleitoral, próximo das eleições, previstas para o dia 6 de novembro desse mesmo
ano, na qual sairia reelegido Barack Obama.
Assange,
já recluso na embaixada do Equador, declarou que esses documentos “mostram a
anatomia do mostro de detenção criado após o 11 de setembro, a criação de um
espaço sombrio em que a lei e os direitos não existem, onde as pessoas podem
ser presas sem deixar rastro somente pela vontade do Departamento de Defesa dos
EUA”.
8. Espionagem na Europa
Em
junho de 2015, o WikiLeaks publica cinco relatórios da Agência de Seguranção
Nacional estadunidense (NSA, em sua sigla em inglês), elaborados a partir das
comunicações interceptadas de ex-mandatários franceses como Jacques Chirac e
Nicolas Sarkosy, assim como do então presidente Francois Hollande.
Os
ciberativistas asseguravam que o “EUA implementaram uma política de espionagem
econômica contra a França durante uma década”, por meio de mecanismos como a
“interceptação de todos os contratos corporativos franceses e de negociações
com valores superiores a 200 milhões de dólares”. Entre as comunicações
espionadas pela agência norte-americana, havia discussões sobre a crise
financeira na Grécia (inclusive sobre a possibilidade de que o país heleno
abandonasse a União Europeia) ou conversas sobre as lideranças da Eurozona,
assim como as relações que mantinham o governo de Hollande com o da chanceler
Angela Merkel.
9. Espionagem a Netanyahu,
Berlusconi e Ban Ki-moon
Apenas
7 meses mais tarde, em fevereiro de 2016, o WikiLeaks revelava novos documentos
com mais ações de espionagem feitas pela NSA contra líderes mundiais. Nesse
caso, os espionados foram o primeiro-ministro israelense, Benjamim Netanyahu, o
ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi e o então secretário-geral da
ONU, Ban Ki-moon.
A
agência norte-americana realizou escutas secretas em um encontro entre Ban
Ki-monn e Angela Merkel, que também aparece nesses relatórios. Os documentos
também apontaram uma conversa entre Netanyahu e Berlusconi e uma reunião privada
entre Berlusconi, Merkel e o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy
Os
relatórios da NSA reproduzem fielmente o conteúdo desses encontros. Asim,
Merkel e Ban conversaram sobre a luta contra as mudanças climáticas; Netanyahu
solicita ajuda a Berlusconi para lidar com a administração do presidente Barack
Obama; e Sarkozy adverte ao primeiro-ministro italiano sobre os graves perigos
que o sistema bancário de seu país enfrenta.
10. O e-mail de Hillary
Clinton
No
dia 16 de março de 2016, o WikiLeaks publicou um arquivo com mais de 30 mil
e-mails recebidos e enviados por Hillary Clinton em seu servidor privado quando
desempenhava o cargo de secretária de Estado. Os documentos abarcam um período
compreendido entre o dia 30 de junho até o dia 12 de agosto de 2014.
Entre
os vazamentos, se encontram 27 mil e-mails do Comitê Nacional Democrata (CND),
que revelaram assuntos tão diversos e relevantes como as manobras de vários
membros do Partido ou o fornecimento de armas para os extremistas da Síria,
entre muitos outros. Os ciberativistas também divulgaram cerca de 50 mil
e-mails de John Podesta, o chefe da campanha presidencial de Hillary Clinton,
que expôs uma grande quantidade de informações confidenciais da cúpula do
Partido Democrata, que incluía estrategias de campanha, transcrições completas
de discursos e algumas disputas internas dentro do partido.
*Publicado
originalmente no RT News | Tradução de Rôney Rodrigues publicada originalmente
no Outras Palavras
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