quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

APLICAÇÃO NA SOBREPARTILHA DE REGRA QUE DISTINGUE UNIÃO ESTÁVEL E CASAMENTO. Por Delma Silveira Ibias, advogada

A 8ª Câmara Cível do TJRS ao julgar, recentemente, caso judicial que envolve casamento e união estável, firmou um relevante precedente em prol desta última.

O importante acórdão da 8ª Câmara Cível do TJ gaúcho discutiu se os efeitos do RE nº 878.694 - que julgou inconstitucional a sucessão da união estável - se aplicam aos processos de sobrepartilha realizados após a declaração da inconstitucionalidade do art. 1.790 do CCB.

A fim de evitar o desequilíbrio entre os filhos e a viúva, a decisão da 8ª Câmara Cível gaúcha foi no sentido de que se deve aplicar à sobrepartilha o mesmo regramento que regeu a partilha. Assim, determinou a aplicação do art. 1.790 do CCB, já declarado inconstitucional pelo STF, em 2017, no julgamento em que afastou a diferença entre cônjuge e companheiro para fim sucessório.

Importante fato: o casal firmou em 2009 escritura pública declarando que viviam em união estável há oito anos, incidindo sobre a relação o regime da comunhão parcial de bens. Após o falecimento do homem, foi lavrada escritura pública de inventário e partilha, sendo firmada pelos dois filhos e a companheira. Na ocasião foi feita a partilha com observância do regramento posto no art. 1.790 do CCB.

Posteriormente, foi descoberto que o falecido era titular de um crédito junto ao Estado do Rio Grande do Sul, consubstanciado em precatório. Não havendo consenso entre os filhos e a companheira acerca do critério legal a ser observado na divisão desse bem, foi formalizado em juízo, pelos filhos, pleito de sobrepartilha.

O magistrado de 1º grau decidiu que deveria ser, então, obedecido, na sobrepartilha, o regramento do art. 1.829, inc. I, do CCB, ante o julgamento, pelo STF, em 2017, do que declarou inconstitucional o art. 1.790 do CCB, mandando aplicar às uniões estáveis as mesmas regras sucessórias incidentes no casamento.

De acordo com os filhos, tal decisão é injusta, pois, gera benefício desproporcional à companheira, que antes, além da meação, foi contemplada com herança sobre os bens comuns (rateada com os filhos), pois essa era a regra do art. 1.790 do CC, e agora, na sobrepartilha, herdará também sobre o bem particular, o precatório.

Para o colegiado, caso adotado o regramento do art. 1.829, I, do CC, a companheira concorreria com os filhos também nos bens particulares.

Assim, segundo o julgado da 8ª Câmara Cível, a agravada seria contemplada com mais direito, como companheira, do que teria se casada fosse, pois receberia herança sobre os bens comuns e também sobre o bem particular, “o que certamente não foi o desejado pelo STF ao assentar o entendimento consagrado no RE nº 878.694”, conforme apontou o desembargador Luiz Felipe Brasil Santos.

Assim, por unanimidade, o colegiado proveu o recurso, fixando um importante precedente sobre essa matéria. Provavelmente, esse foi o primeiro acórdão, no país, que determinou a aplicação, em processos de sobrepartilha, do art. 1.790 do Código Civil já declarado inconstitucional pelo STF.

Compartilho a criação desse precedente com os muitos leitores do Espaço Vital a satisfação profissional de ter atuado nesse caso, acompanhada dos colegas Diego Oliveira da Silveira e Aline Rübenich. (Proc. nº 70083387449).

Leia a íntegra da ementa:

“Agravo de instrumento. Sucessões. Sobrepartilha de crédito.

Bem comum entre descendentes e a companheira supérstite. Inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código civil, afastada. Particularidades do caso em concreto. Reforma do decisum.

Caso em que se discute direito à herança de bem particular em ação de sobrepartilha que, dada as particularidades do caso em concreto, deve ser observado o mesmo regramento aplicado quando da ação de inventário, a evitar desequilíbrio entre os filhos e a viúva.

Recurso provido”.



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