Hoje
foi um dia bem diferente dos demais do ponto de vista profissional. Eu não
passei a noite ansioso, não acordei nervoso, não deu dor de barriga na hora de
preparar as perguntas. Nada disso. Mas eu estava meio embaralhado, meio
angustiado e até mais triste do que feliz.
Eu
acordei umas 6h da manhã para ir à entrevista do presidente Lula. Não é
exatamente uma novidade para mim entrevistá-lo. Nunca contei as vezes que o
fiz, mas certamente já devem estar perto de 10. Se for contar as pequenas
entrevistas, talvez mais de 20 ou 30.
Algumas
dessas pequenas entrevistas se deram quando ainda era estudante. Como fiz
faculdade de jornalismo na Metodista, de 1985 a 1988, antes de Lula disputar a
presidência da República, às vezes eu o encontrava nas greves, no Sindicato dos
Metalúrgicos ou em eventos políticos. E sempre que podia corria com um gravador
pra tentar fazer qualquer pergunta.
Em
1994, quando fui cobrir a Guerrilha Zapatista no México, fiz uma entrevista com
o Lula. Ele nem deve imaginar, mas eu e o fotógrafo Jesus Carlos o “usamos”
como fonte de recursos. Estávamos sem grana para ir e ligamos para o jornal La
Jornada propondo várias pautas sobre o Brasil. Mas, o editor disse que só tinha
interesse numa entrevista com o Lula. Ligamos para o Paulo Okamoto e
conseguimos agendá-la.
Fiquei
1h30 explorando o “baiano”, como Lula é conhecido no ABC. E recebemos uns 500 dólares
pela matéria. Devo essa ao Lula. Essa grana foi usada para a gente se deslocar
pelo México, pagar comida, passagens etc. E de lá do México trouxemos várias
matérias sobre a guerrilha que acabaram mostrando um lado humano do movimento
Zapatista, que ainda era um mistério para muitos.
Neste
momento, o Luiz Inácio já era o Lulinha Quase Lá. Ele mesmo brincava com isso.
Uma das noites que tive o prazer de desfrutar da companhia dele sem estar
fazendo uma entrevista foi na casa do ex-deputado estadual Geraldo Siqueira.
Ele brincava com o Geraldinho, que acabava de fazer o tratamento de um câncer,
que tinha que ser bem cuidado porque era o Lulinha Quase Lá. E durante boa
parte da noite ficou brincando com a minha filha Carolina. Ela no colo dele e
ele contando histórias. Uma cena que nunca vou esquecer.
Mas
por que tô contando tudo isso. Porque ir entrevistar o Lula hoje na Polícia
Federal, na prisão que lhe meteram de forma injusta, não foi algo tranquilo.
Menos pelo evento jornalístico em si, mas por aquele gosto amargo na boca que
certas coisas nos trazem. Lula não podia estar neste lugar.
De
qualquer maneira, o que posso dizer antes de fazer a matéria que será publicada
amanhã é que vi um Lula altivo, um sujeito absolutamente dono da situação, um
cara com o senso político apuradíssimo. Um ser humano no melhor dos seus dias.
Parece absurdo, mas é isso.
A
primeira hora da conversa foi com o amigo Haroldo Ceravollo, do Ópera Mundi. A
segunda, comigo. Foram umas 30 perguntas ao todo. Ele falou de China, EUA, Irã,
Ciro Gomes, Frente Ampla, Lula Livre, PT, da entrevista com o Rui Costa e do
telefonema vazado do Temer. Falou de muita coisa. E nos deu muitos títulos...
Aos
poucos vou soltando trechos desta conversa. Agora estou correndo para ir para o
aeroporto e vou aproveitar pra ir pensando um pouco em tudo que ouvi e vivi
hoje. Porque, além de tudo, Lula quando chegou me deu um abraço e já foi
falando do Luca. E mandando solidariedade para a Dri. Não é fácil saber que tem
um cara com essa força, dignidade e humanidade preso numa cela enquanto o
Brasil está sendo governado por um boçal.
Lula
é muito maior que a prisão que o recebe, a gente sabe disso. Mas vê-lo voltar
acompanhado pelo seu segurança enquanto a gente sai do prédio não é exatamente
fácil. Não é nada justo. É uma experiência que revolta, que trava a boca, mas
que ao mesmo tempo dá a exata dimensão do grande líder que Lula é. Um líder que
não se deixa curvar.
Não
o achei triste, não o achei cansado, não o achei bravo. Mas acho que ele espera
algo mais de nós.
Ao
responder uma pergunta da Federação Única dos Petroleiros, quase no final da
entrevista, ele disse que a gente precisa ter mais força e coragem para
defender o Brasil. Que a gente não pode deixar eles destruírem tudo sem fazer
nada. Que não podemos ficar apenas olhando a história acontecer. Temos que
fazer algo para intervir nela.
Por Renato Rovai
Revista Fórum
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