A
jornalista Fernanda Canofre entrevistou Nelson Jobim no Sul21.
(…)
Sul21:
Como deputado constituinte, o senhor participou da comissão responsável por
discutir a separação de poderes. Há poucos minutos, ouvimos o juiz Leandro
Paulsen, presidente da 8ª turma do TRF4, que condenou Lula, falando que
gostaria que o Judiciário fosse “menos ideológico”. Como o senhor observa isso?
Jobim:
Há uma certa disfuncionalidade. As instituições estão funcionando, mas há uma
certa disfuncionalidade. A disfuncionalidade está na Câmara, no Executivo, no
próprio Judiciário. Há um momento em que o velho está terminando e o novo ainda
não pode nascer.
Sul21:
Como se resolve isso?
Jobim:
As coisas acabam se acertando. As coisas vão andando e a lucidez começa a
tomar, porque o que ocorre hoje no Brasil, principalmente em termos de
política, é que tem uma variável nova que é o ódio. O adversário não é mais
adversário, é inimigo. Então, você obstruiu qualquer tipo de diálogo e a
política é, claramente, o diálogo dos controversos. Ou seja, onde adversários
têm que dialogar para criar uma solução alternativa que possa conduzir o país
para frente.
Sul21:
O senhor concorda com uma frase que vem sendo muito repetida, de que hoje temos
a judicialização da política e a politização do Judiciário?
Jobim:
Ah, não há dúvida. Ocorre que os partidos políticos e os setores políticos não
conseguiram resolver suas divergências e acabaram levando para o Judiciário. O
Judiciário não intervém voluntariamente em questões, ele é sempre demandado por
alguém e quem demanda são exatamente as entidades políticas. Houve um momento,
anos atrás, quando eu estava no Tribunal Eleitoral, principalmente, e no
Supremo, em que não havia entendimento dos políticos, o sujeito era derrotado em
uma decisão qualquer, recorria ao poder Judiciário. Então, houve um
deslocamento muito forte em relação às divergências políticas não ajustadas,
exatamente pela falta de diálogo. Esse fato, de ter ido para o Judiciário,
começou a determinar um certo sabor a alguns juízes, a alguns magistrados, de
começar a invadir, a tomar decisões, que não são propriamente as decisões que
estão na lei, mas sim as decisões que ele acha que deveria ser. Aí você entra
num momento muito complicado. Uma coisa é o seguinte, magistrado não é para
dizer o que ele acha, mas para dizer o que a lei determina. Se quiser fazer
alguma coisa para sustentar “o que acha”, então tem que entrar na política. É
lá, no Parlamento, que você tenta sustentar ponto de vista.
Sul21:
O senhor acha que, em geral, é essa a situação que temos visto?
Jobim:
Está avançando muito isso. É uma espécie de tentativa de alguns setores do
Judiciário, não todos, de extrapolarem a função judicial para pretender –
inclusive, passa-se isso com o Ministério Público – ser o gestor, determinar os
atos de gestão e os atos de políticas públicas propriamente ditas.
Sul21:
Há uma interpretação de que Lula é preso político. O senhor concorda?
Jobim:
Aí já é difícil. Ser preso político é um juízo de valor, de natureza política.
A questão é que temos uma série de processos em relação ao ex-presidente, as
coisas estão sendo postas dessa forma, mas ele não é acusado de ter praticado
crime político. Portanto, a questão não é política. Agora, evidente que eu não
conheço os processos, o Zé Paulo [Sepulveda] Pertence, que foi meu colega no
Supremo, é um dos advogados do presidente, lamento a forma como as coisas têm
sido conduzidas, mas não conheço os detalhes do procedimento.
(…)
https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/nelson-jobim-magistrado-nao-e-para-dizer-o-que-acha-mas-para-dizer-o-que-a-lei-determina/
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