Em
um primeiro momento, é possível crer que “Justiça” e “Judiciário” sejam a mesma
coisa. Afinal, naturalizou-se nomear o Poder Judiciário de “Justiça”.
Porém,
desde muito cedo a humanidade aprende que Justiça é mais do que um mero
conceito. Justiça é um sentimento que transforma e diferencia as pessoas
daquilo que é bestial; é o que retira as pessoas da barbárie e faz todos
iguais. A Justiça é o equilíbrio, a equidade, o respeito e o reconhecimento da
humanidade do outro. O outro, mesmo diferente, mas cuja humanidade é
reconhecida e respeitada.
Já
o Judiciário é o Poder que, em tese, deveria assegurar a todos o reconhecimento
de sua humanidade, de reconhecer o direito de existência digna de todo ser
humano e de aplicar o que se entende como Justiça.
No
entanto, observa-se que no decorrer dos tempos o Judiciário foi e é instrumento
daqueles que detêm o poder econômico, o poder oligárquico.
É
um poder que se utiliza da necessidade de aparentar ser imparcial para manter o
status quo, ou seja, para manter as coisas como estão.
Essa
é a regra do Poder Judiciário no Brasil desde os seus primórdios. No início,
com leis explicitamente racistas e com mais ênfase e proteção ao patrimônio e à
propriedade do que à vida e à integridade física dos seres humanos.
Porém,
com a evolução da civilização e o reconhecimento da igualdade e dignidade de
todos as pessoas, as leis evoluíram e passaram a contemplar em seus conteúdos
toda a luta pela aplicação da mesma lei para todos.
Entretanto,
viu-se as normas serem transformadas – ou ignoradas – dentro do Poder
Judiciário, com o único fim de manter o poder nas mãos daqueles que não aceitam
a humanidade, que creem ser seres quase divinos.
Para
esses juízes e procuradores, o direito não pode atingi-los pessoalmente, pois
acreditam estar acima das leis. Leis que seriam aplicáveis a alguns
destinatários específicos (historicamente, os pobres, os pretos e as
prostitutas, porém mais recentemente lideranças de esquerda, ativistas sociais
etc), mas ignoradas para outros grupos sociais.
Muitos
se surpreendem com o estágio atual do comportamento escancarado do Poder
Judiciário no Brasil.
A
maioria, que jamais conviveu ou entendeu como esse poder se espreita na
construção cultural racista e oligárquica deste país, surpreendeu-se, justamente,
porque não conviveu diretamente com o Judiciário.
O
que se vê hoje é o Poder Judiciário invadindo despudoradamente as competências
dos Poderes Legislativo e Executivo, desconsiderando normas, deturpando leis,
criando regramentos e, recentemente, substituindo o Poder Executivo!
O
objetivo, cada vez mais transparente aos olhos do povo, é que para melhor
atender aos interesses da oligarquia, o Poder Judiciário ora ignora a norma e
ora cumpre a lei, dependendo do freguês: para manter o pobre no seu “lugar”, ou
para fazer a classe média crer na falácia do “funcionamento regular das
instituições”. Este sempre foi o padrão usado das decisões judiciais.
Esse
poder, que se apropria do conceito de “Justiça” para exibir credibilidade,
resolveu que era intolerável para a oligarquia do Brasil que mais pessoas
pudessem usufruir de direitos, da cidadania e que exigissem o cumprimento das
normas para todos. Isso é intolerável para a oligarquia e seus asseclas
togados!
Desde
a denúncia que resultou na AP 470, vimos no país uma ação direta do Poder
Judiciário para impedir que as lideranças de esquerda deste país prosseguissem
no trabalho de desenvolver estruturalmente o Brasil.
O
Mensalão foi a primeira demonstração de que o Sistema Judicial brasileiro seria
o mecanismo utilizado para a “retomada” do poder político pela oligarquia. A AP
470 foi construída e fundamentada na ideia de um processo inquisitorial, em que
as provas e as demonstrações da verdade eram ignoradas e manipuladas, induzindo
a erro parte dos julgadores e a maioria da sociedade.
A
ideia de transparência e de publicidade foi deturpada com o fim de impor aos
cidadãos brasileiros uma visão única em um teatro grotesco, na forma de um
julgamento viciado e repleto de interpretações teratológicas (monstruosas). No
roteiro, a destruição de qualquer chance de independência e soberania do país,
para manter a nação submissa a interesses predatórios da oligarquia nacional.
Para isso, seria fundamental imobilizar qualquer liderança política que ousasse
fortalecer o povo brasileiro e o Brasil como Nação.
Desnudar
o que foi a AP 470 – o “mensalão” – é dar oportunidade à nação brasileira de se
refundar e de impedir que o país continue refém de um Sistema Judicial que tritura
e subalterniza uma parcela dos cidadãos brasileiros.
*
Denise da Veiga Alves e Giseelle Mathias são advogadas em Brasília e integram a
ABJD/DF, a RENAP – Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares e
#partidA/DF.
*
Esse texto tem o selo 001-2018 do Observatório do Judiciário. Para participar
do Observatório do Judiciário veja:
https://jornalistaslivres.org/observatorio-do-judiciario-convidamos-voce-para-participar/
https://jornalistaslivres.org/justica-ou-judiciario-qual-sera-a-nossa-escolha-2/
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