Advogado,
professor e coordenador da Comissão Nacional da Verdade afirma que a divulgação
do memorando da CIA, apesar de não apontar novidades, é “estarrecedor”.
“Acho
que é chegada a hora de o Supremo Tribunal Federal decidir a matéria de uma vez
por todas, decretando que a Lei da Anistia não pode impedir o processamento e o
julgamento daqueles acusados de graves violações de direitos humanos.” A
opinião é de Pedro Dallari, advogado, professor e coordenador da Comissão
Nacional da Verdade. Ele se posicionou de forma contundente em relação à
divulgação de memorando da CIA (agência de inteligência do governo dos Estados
Unidos), de 11 de abril de 1974, que revela conversas e a autorização do
ex-presidente Ernesto Geisel para execuções de opositores ao regime militar. O
relatório final da Comissão Nacional da Verdade responsabilizou 377 pessoas por
crimes cometidos durante a vigência do regime militar. O ex-presidente Ernesto
Geisel está na lista. Segundo o memorando, o general Geisel, em conversa com o
general João Batista Figueiredo (que viria a ser o presidente seguinte) disse
que a política deveria continuar, mas alertou para a necessidade de se tomar
muito cuidado para garantir que apenas os subversivos perigosos fossem
executados. Em entrevista à Fórum, Dallari cobra um posicionamento das Forças
Armadas: “Eles têm que, de uma vez por todas, parar de dizer que as mortes
ocorreram isoladamente por ação de alguns indivíduos”.
Fórum
– Como avalia a divulgação do memorando da CIA? O material encontrado foi uma
surpresa para o senhor?
Pedro
Dallari – Eu entendo que o documento, embora estarrecedor, na medida em que
revela detalhes de uma conversa impressionante, na essência, confirma o
relatório final da Comissão Nacional da Verdade, que já havia concluído
justamente pela responsabilidade dos governos militares por uma política de
Estado, que foi o extermínio dos opositores do regime.
Fórum
– Em sua opinião, como as Forças Armadas deveriam se posicionar diante do
gravíssimo teor do documento?
Pedro
Dallari – Penso que as Forças Armadas devam se posicionar em relação a esse
documento, que é estarrecedor. O documento não revela novidades em relação à
responsabilidade das Forças Armadas. Isso já se sabia. Mas, ao descrever com
minúcias a ação do presidente da República na promoção de execução de
brasileiros, seres humanos, o documento é muito impactante. As Forças Armadas
têm que, de uma vez por todas, parar de dizer que as mortes ocorreram
isoladamente por ação de alguns indivíduos e reconhecer a sua responsabilidade
institucional.
Fórum
– O senhor acredita que a confirmação dessas informações pode levar o Supremo
Tribunal Federal a reavaliar a interpretação da Lei da Anistia?
Pedro
Dallari – Acredito que sim, porque essa matéria está na pauta do Supremo
Tribunal Federal, e o Supremo hoje tem uma composição que é mais sensível às
temáticas dos direitos humanos. A sociedade está cobrando o fim da impunidade
e, portanto, acho que pode haver uma melhor condição para o combate a essa
situação, com a revisão da Lei. Acho que é chegada a hora de o Supremo Tribunal
Federal decidir a matéria de uma vez por todas, decretando que a Lei da Anistia
não pode impedir o processamento e o julgamento daqueles acusados de graves
violações de direitos humanos.
Fórum
– Em sua análise, como ficam agora as pessoas que defendem a volta do regime
militar?
Pedro
Dallari – Espero que a divulgação do documento mude a posição de pessoas que
defendem a volta do regime militar, na medida em que evidencia o horror. Não há
nenhum tipo de aspecto positivo na ditadura militar.
Fórum
– O que pode dizer em relação às pessoas que diziam à época que a atuação da
Comissão Nacional da Verdade não passava de revanchismo?
Pedro
Dallari – Para quem dizia que a Comissão Nacional da Verdade atuava por
revanchismo, esse retrato do presidente Geisel discutindo execução de pessoas é
a resposta mais adequada.
https://www.revistaforum.com.br/forcas-armadas-tem-que-reconhecer-sua-responsabilidade-institucional-nas-mortes-da-ditadura-diz-pedro-dallari/
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