Carmen
Lúcia desmoralizou o STF para salvar Aécio Neves, um escroque da política
brasileira, um corrupto degenerado. Carmen Lúcia rasgou a Constituição, não
pela primeira vez, para ver Lula na cadeia. Dizem que militantes vandalizaram o
prédio onde ela tem um apartamento em Belo Horizonte. Até pode ser verdade, mas
foram apenas muros, talvez vidros. E o que dizer de Carmen Lúcia que vandalizou
a Constituição, texto sagrado de uma nação, cuja dever de defender ela tinha
acima de todos? Ela perdeu respeito devido e seu retrato deveria frequentar o
frontispício do memorial dos traidores da Constituição que se deveria construir
para que esta história de tempos sombrios que estamos vivendo servisse de lição
para a posteridade.
Lula
está preso porque vem sendo aplicado o direito nazista de Sérgio Moro, dos desembargadores
do TRF4 e do ministro Luis Roberto Barroso, que se auto-proclamaram artífices
das leis, mas que nada mais são do que tiranetes togados. Lula é um inocente
preso e, portanto, um preso político. Atribuíram-lhe um apartamento que não é
seu, que ele nunca usufruiu, que não está em nome de um familiar seu ou sequer
de um laranja. A mesma farsa se verifica em relação ao sítio de Atibaia e ao
terreno do Instituto. A historiografia e a ciência política haverão de escrever
páginas de espanto em face de tamanha farsa - espanto que já se verifica hoje
nos grandes jornais do mundo, nos grandes juristas e nas pessoas sensatas do
planeta. Os acusadores e os julgadores de Lula serão cobertos de opróbrio nas
páginas da história.
Lula
não é corrupto. Pode ter cometido deslizes aqui e ali. Mas são deslizes que o
povo perdoa, porque sabe que os grandes corruptos não estão na cadeia; porque
sabe que os grandes corruptos são os ricos e as classes médias altas que
sonegam R$ 400 bilhões por ano; porque sabe que os corruptos são os juízes que
recebem benefícios criminosos e escandalosos que causam o prejuízo de mais de
um bilhão por ano aos cofres públicos na nação. O povo perdoa eventuais
deslizes de Lula porque sabe que Lula foi o presidente que, junto com Getúlio Vargas,
imprimiu um sentido ético incomparável ao Brasil. A ética é, antes de tudo, as
finalidades do bem comum de uma nação, de um povo. Quem promoveu mais o bem
comum do que Vargas e Lula no Brasil? Ninguém, absolutamente ninguém.
A
prisão de Lula é uma tragédia para ele e para o povo brasileiro. É uma tragédia
pela infância e pela juventude doloridas que Lula teve. É uma tragédia pela
árdua e laboriosa luta que travou no movimento sindical. É uma tragédia porque,
sendo do povo, nunca se afastou do povo e sempre carregou este povo sofrido com
o seu sofrimento, com o seu sorriso, com o seu carinho. É uma tragédia porque,
como presidente, Lula se fez grande entre os grandes sem nunca deixar de ser
povo. E é uma tragédia porque o povo precisa dele e porque ele tem consciência
do muito que pode dar ao povo e porque sabe que não o deixam consumar esta
doação.
Na
história é muito difícil que surjam heróis plenos sem que estejam envoltos em
tragédias. Sabe-se também que os povos, para se libertarem, precisam de heróis,
de líderes míticos, a exemplo de Moisés, de Ciro, de Rômulo, de Mandela, de
Gandhi e de tantos outros. Lula já tinha um poder simbólico imenso antes de ser
preso. Agora, as elites sanguinárias que o prenderam deram-lhe e deram ao povo
a oportunidade da construção mítica de Lula.
Além
do que Lula fez de ético, além do que ele fez por um povo pobre, sofrido e
massacrado pela sanha exploradora das elites, ele é vítima de uma perseguição
feroz, inusitada, violenta, despudorada e imoral, tendo como protagonistas
setores do judiciário, setores da grande mídia, boa parte das elites e os
grupos fascistas que recrudescem suas atividades persecutórias e violentas a
cada dia que passa. Por saber que Lula é vítima de uma perseguição implacável,
o povo, com seus sentimentos de humanidade quer reparar-lhe o dano e a dor,
dando-lhe apoio resoluto.
Lula
já percorreu boa parte deste caminho. Precisa continuar lutando com
persistência e resignação até o último dia de sua vida. Mas é o povo, são os
progressistas e democratas, são os movimentos sociais, somos nós, são as
esquerdas que precisam reforçar o caráter mítico da figura de Lula. Lula não é
patrimônio do PT, mas do povo. É Lula e não o PT o mito-príncipe. É Lula a
encarnação da fantasia concreta. A única forma do PT se resgatar, se renovar,
se reinventar, consiste em reforçar o caráter mítico de Lula. Um Lula mítico
será uma energia viva, uma força de combate, mesmo depois de sua partida dentre
os vivos. O povo precisa desse mito, dessa referência de liberdade e de luta.
O
discurso de Lula no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC foi uma espécie de Carta
Testamento antecipada. Ele viu e porque viu, proclamou uma revolução em
andamento. Certamente não se trata de uma revolução socialista, mas de uma
revolução democrática que nunca tivemos. O Brasil precisa de uma revolução
democrática que os ingleses fizeram no século XVII, que os americanos e
franceses fizeram no século XVIII e que tantas outras se completaram no século
XIX. Nós, tardiamente, precisamos fazê-la no século XXI, contando com a energia
mítica de Lula. Precisamos fazer esta revolução que instaure os fundamentos
morais e materiais da igualdade e da dignidade.
Alguns
temem que sem Lula nas eleições deste ano, o Brasil não sairá pacificado. Não
sairá mesmo. Um país que têm 100 milhões de pessoas que vivem com até um
salário mínimo não pode ser um país pacificado. Um país que tem 50 milhões de
pobres e 15 milhões de indigentes não pode ser um país pacificado. Um país que
tem meia dúzia de ricos com uma riqueza igual a de 103 milhões de brasileiros
não pode ser um país pacificado. O Brasil não pode ter paz enquanto o povo não
tiver direitos e dignidade. Paz, sob estas condições, seria uma desavergonhada
mentira.
A
candidatura de Lula precisa ser mantida até o fim, mesmo preso, custe o que
custar. Quem tem que pagar o alto preço de impedir a posse de um presidente
eleito devem ser as elites e esse Judiciário que lhes é subserviente e
servidor. A candidatura Lula não pertence mais ao PT, mas ao povo. Lula não
pode ficar chorando sozinho na solidão de sua cela. Lula precisa chorar por
saber que seu nome será gritado em todo o Brasil e isto só é possível se ele
for candidato até o fim.
Quem
estuda a História sabe que existem vitórias que são derrotas e derrotas que são
vitórias. Lula preso, sem dúvida, é uma derrota. Mas é preciso transformá-la em
vitória. Neste momento, os cálculos eleitorais do PT precisam ficar em segundo
plano, pois o que vale o poder diante da fidelidade devida a Lula? O que vale o
poder se não se tiver humanidade, fé, piedade e solidariedade na alma para com
Lula? Estes sentimentos são para com Lula, mas não só para ele. Se Lula é a
encarnação mítica da liberdade e da emancipação do povo, são sentimentos também
para com o povo. Povo sofrido, povo errante e sem rumo durante os cinco séculos
de existência do Brasil. Povo humilhado na sua pobreza. Povo espezinhado pelos
poderosos.
O
único poder que faz sentido é o poder que emerge da caminhada deste povo que
precisa dar-se um destino. Lula é, neste momento, e o será no futuro, se se
souber trabalhar, o conteúdo, a forma, o ente e a energia principal da
construção desse destino. Quem não perceber isto deixará escapar uma
oportunidade, um momento de libertação, de revolução democrática, que poderá
demorar décadas ou séculos para se repor. Para que este momento se concretize é
imprescindível a presença da força e da energia mitificadas de Lula. É
imprescindível que seu nome seja gritado pelo Brasil, não por um vã louvor, mas
para que o povo grite pela sua própria dignidade e liberdade.
* Aldo Fornazieri
é professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP).
https://jornalggn.com.br/noticia/tragedia-e-mitificacao-de-lula-por-aldo-fornazieri
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