sexta-feira, 13 de abril de 2018

JOHN REED, O GRANDE REPÓRTER DOS CONFLITOS E REVOLUÇÕES DO SÉCULO XX. Por Carlos Russo Jr


John Reed nasceu numa influente família de políticos e magistrados do Oregon. Inteligente e astuto, amante de livros, muito prometia desde a infância e por isso foi enviado a Harvard aos vinte anos de idade, a Universidade da mais fina elite, destinado a ser um prestigiado advogado, quiçá um Congressista. Estávamos em 1910.

É claro, que jamais seus parentes imaginariam que o jovem Jack Reed um dia seria escritor, socialista e o primeiro e grande repórter do século XX!

Quando jovem apreciava conviver com os homens, amava as mulheres, assim como comer, escrever, beber, nadar, jogar futebol americano e poetar. E gostava de gente do povo, mesmo que isso o distanciasse de seus colegas de “família”. A seguir descobriu-se curtindo encontrar-se com vagabundos, trabalhadores, sonhadores, gente distanciada da roda da fortuna.

E Jack adulto foi mudando… Após concluir seus estudos universitários, optou pelo jornalismo, começando por uma revista política, a “Masses”, e pelo jornal “Metropolitan Magazine”.

Em Massachusetts, mais  de vinte e cinco mil operários estavam em greve, exigindo jornada de oito horas de trabalho! A repressão policial não economizava cacetadas e espadadas. Reed, repórter, juntou-se aos manifestantes. Preso com os operários, permaneceu detido durante o mesmo período que eles, não permitindo ao diretor do Jornal o pagamento de fiança.

Aprendeu muito com os grevistas e foi um dos organizadores do desfile de mais de uma centena de milhar de manifestantes no Madison Square Garden, em defesa do direito de greve. Jack Reed buscava a “vida, liberdade e a busca da felicidade”, inscritas na declaração de Independência Americana.

E, a partir desta, por que não uma nova revolução? Foi enviado ao México para cobrir a Revolução Mexicana de Pancho Villa. Em pouco tempo, tornou-se próximo do líder revolucionário. Os relatos apaixonados de Reed ajudaram a espalhar a notícia da revolta. Em contrapartida, foram os cactos, as montanhas rochosas, as morenas risonhas, a maldita poeira, a horrível cadência dos tiroteios na noite, os peões morenos de voz delicada morrendo e matando, que ensinaram Jack Reed a descrever as sublevações!

Assim que Reed regressou aos Estados Unidos, no Colorado ocorreu um massacre, o de Ludlow.  Mineiros em greve foram abatidos pela Guarda Nacional a mando da família Rockefeller. E lá estava Reed e os acontecimentos, uma verdadeira guerra de classes, foram para sempre registrados no livro “A Guerra do Colorado”.  Foi num comício de denúncia dos crimes praticados que Jack conheceu Emma Goldman, e ela seria sua fonte permanente de inspiração feminista e anarquismo. Reed tornou-se membro do Partido Socialdemocrata.

A Primeira Guerra Mundial encontrou Reed na Europa. Escreveu: “Aqui estão nações que se lançam aos pescoços umas das outras como cães… e a arte, a indústria, o comércio, a liberdade individual, a própria vida são taxadas para sustentar monstruosas máquinas de morte!” “A guerra é feita pelo lucro, não por ideais.”

John Reed foi, sem a menor sombra de dúvidas, o melhor escritor- jornalista de seu tempo. Se alguém quisesse saber como era a guerra bastava ler seus artigos presenciais acerca da frente alemã, da retirada da Sérvia, de Salonic, por trás das linhas do abalado Império Czarista. E seu trabalho era requisitado pelos mais importantes veículos de divulgação do mundo ocidental.

Acontece que Reed não tinha um lado! Seu lado era o dos alemães, franceses, russos, búlgaros, de todos aqueles que tinham seus corpos estraçalhados… Por que afinal, que importava para que lado armas destruidoras de vidas apontassem? Os “donos da guerra” só queriam poder e dinheiro!

Em 1916, de volta aos EUA, escutou os incessantes discursos sobre os preparativos militares contra “o inimigo,” e escreveu para o “The Masses” que o verdadeiro inimigo para o trabalhador estadunidense eram os 2% da população que recebiam 60% da riqueza nacional. “Nós defendemos que o trabalhador prepare-se para se defender do inimigo. O inimigo está aqui, em Norte-América. Esse deve ser  nosso preparativo.”

Foi naquele ano que John Reed conheceu Louise Bryant, escritora e, também, libertária; eles se apaixonaram imediatamente. Louise separou-se do marido e foi morar com Reed em Nova Iorque.

Quando em abril de 1917, o Presidente Wilson pediu que o Congresso declarasse guerra à Alemanha, John Reed escreveu: “A guerra significa histeria coletiva, crucificando os defensores da verdade, sufocando os artistas… Esta não é nossa guerra.”

Ao mesmo tempo, chegavam da Rússia notícias de que o Czar fora deposto. Uma revolução estava em marcha! “Finalmente, toda uma população se negou a continuar a carnificina e se revoltou contra a classe governante” escreveu Reed. Com Louise Bryant partiu para a Finlândia onde foi preso e todos os seus papéis roubados. Somente por interferência dos socialistas russos, conseguiu novo visto e seguiu viagem a São Petersburgo.

Agora era coisa séria! A revolução avançava à sua volta com operários tomando o poder nas fábricas, soldados recusando-se a combater, manifestando-se contra a guerra e organizando seus próprios sindicatos. O Soviete de São Petersburgo elegeu uma maioria bolchevique. E afinal, entre seis e sete de novembro, ocorreu a  tomada das estações ferroviárias, telégrafo, telefone e correios, e a concentração de trabalhadores e soldados junto ao Palácio de Inverno. Era nem mais nem menos, a Revolução Socialista!

“As janelas do Smolny ( onde se instalara o Soviete), refulgem, ao rubro branco, como a bocarra de um forno, pois não se dorme em Smolny.  Smolny, o laminador gigante funcionando vinte e quatro horas, laminando homens, nações, esperanças milenárias, impulsos, temores”.

Jack tornara-se próximo dos dois maiores líderes soviéticos: Lênin e Trotski. E correndo de cena em cena, Reed tomou notas com uma velocidade incrível, reuniu cada folheto, cartaz e proclamação e, então, no início de 1918, voltou aos EUA disposto a escrever sua maior história.

Ao chegar, entretanto, suas anotações foram confiscadas. Quando liberadas,  com o prefácio de Lênin, o livro “Os dez dias que abalaram o mundo” ganhou uma primeira edição americana. O livro não era apenas um testemunho vivo, narrado no calor dos acontecimentos da Revolução Russa de 1917, mas igualmente a obra que inaugura a grande reportagem no jornalismo moderno, eleito pela Universidade de Nova York como um dos maiores livros do século XX.

Um ano após, surgiria a edição soviética, prefaciada também por Lênin e Krupskaia.

Reed percorreu, então, os Estados Unidos de ponta a ponta palestrando tanto sobre a Guerra quanto sobre a Revolução Russa, ambas por ele vivenciadas. Em setembro de 1919, depois de falar a uma plateia de quatro mil pessoas, Reed foi preso por desencorajar o recrutamento obrigatório nas Forças Armadas.

Jack Reed, quando parcela de membros do Partido Socialdemocrata Americano rompeu com o mesmo, tornou-se  elemento ativo na formação do Partido Comunista dos Trabalhadores e foi à URSS como um de seus  delegados a encontro importante: a III Internacional.

Em Moscou, Reed encontrou sua grande amiga e companheira política Emma Goldman e escutou seu desabafo em relação a certos rumos que a revolução tomava. Logo, ele se incorporou àqueles que se preocupavam com determinados rumos do governo bolchevique, com a necessidade de eleição de novos sovietes, com a inclusão de partidos socialistas e grupos anarquistas nos novos sovietes, com a necessidade de maior liberdade econômica para camponeses e operários, assim como com a restauração de direitos civis para os trabalhadores.

A Reed repugnava que a ditadura exercida em nome do proletariado russo persistisse uma vez vencida a terrível guerra civil. De certa forma ele pressentia no ar a possibilidade de uma revolta como a de Kronstadt, a insurreição dos marinheiros soviéticos , que aconteceria em menos de dois anos e seria reprimida a ferro e fogo. Reconhecia, entretanto, que de todos os modos a primeira república dos trabalhadores estava e permanecia em pé! Vencia uma pugna de morte contra quase todas as potências mundiais! E isto era o mais importante!

John Reed correu de reunião a reunião, de uma conferência em Moscou a uma reunião no Mar Negro. Foi em sua passagem por São Petersburgo que contraiu o impaludismo. Ficou doente, febril e delirante.

Em outubro de 1920, aos trinta e três anos, morreu em um hospital de Moscou.

O corpo de John Reed foi sepultado ao lado do Kremlin na Praça Vermelha, com honras de herói, ao único norte-americano a quem tal honra foi um dia concedida!

Após a morte de Lênin, entretanto, o livro “Os dez dias que abalaram o mundo” foi condenado ao ostracismo por muitos anos, graças à sua não ortodoxia política, assim como à imagem importante que Trótski nele ocupa. Permaneceria, entretanto, como um dos ícones da literatura da esquerda mundial.

Nos anos de 1960, o livro ganhou um enredo teatral e foi encenado pelo grupo Taganká, em Moscou, sob a direção de I. Liubimov. O sucesso obtido foi tão grande que o tempo mínimo para se conseguir um ingresso chegou a ser de três meses, e isto  por mais de dois anos. Calcula-se que meio milhão de espectadores assistiu ao espetáculo teatral.

“Reds”, um drama produzido por Warren Beatty, foi uma das maiores bilheterias dos anos 1980, quando trouxe às telas a vida e a carreira do escritor-jornalista e revolucionário John Reed. Beatty, que personifica Reed, contracena com Diane Keaton e Jack Nicholson, um verdadeiro épico cinematográfico.

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