Não
é segredo que extremistas americanos violentos – dos soldados da alt-right a
movimentos de milícia até arquétipo do skinhead – tendem a ser homens. E esses
são os caras que Michael Kimmel estuda. O sociólogo da Stony Brook University
já escreveu muito sobre masculinidade, e acabou de lançar um novo livro,
Healing from Hate: How Young Men Get Into – And Out of – Violent Extremism [A
cura do ódio: como homens jovens entram – e saem – do extremismo violento, em
tradução livre], que explora o processo pelo qual homens jovens se associam a
visões de mundo das margens da sociedade. Sua ideia central é que as pessoas
que gravitam para ideologias violentas geralmente são aquelas que não tiveram
chance de provar seu valor de maneiras mais típicas – e mainstream – como
sustentar uma família. Empregando parte da mesma linguagem que ele e outros em
seu campo usaram para explicar o apelo de Donald Trump para a América branca e
rural, Kimmel argumenta que esse senso de “direito prejudicado” e desejo de
participar numa comunidade são muito mais integrais para a radicalização do que
qualquer posição ou questão política.
“A
ideia central do autor é que as pessoas que gravitam para ideologias violentas
geralmente são aquelas que não tiveram chance de provar seu valor de maneiras
mais típicas, como sustentar uma família”
Liguei
para o autor para saber exatamente como homens jovens são atraídos para
sistemas de crença perigosos – e, tão importante quanto, como eles podem ser
salvos. A boa notícia é que, como a ideologia em si não é a principal atração
aqui, há um mapa para a redenção.
VICE:
Quase invariavelmente, os caras no seu livro estão procurando por um grupo. Mas
muita dessa radicalização agora acontece na internet. Como esse tempo cada vez
maior que as pessoas passam online moldou o recrutamento da extrema-direita?
Michael
Kimmel: Honestamente não sei a resposta completa para isso ainda, porque parte
disso tem a ver com a eficácia das comunidades online que, na verdade, dão uma
experiência visceral de comunidade. Algumas dessas arenas do Reddit, salas de
chat do Stormfront e coisas assim, tipo, esses grupos de homens – esses lugares
onde as pessoas incentivam umas as outras. Se isso é suficiente é uma questão
em aberto. Inicialmente é muito excitante e há muita energia, mas acho que a
energia se dissipa quando te pedem para aparecer pessoalmente. E assim o que
você tem é um número constante de pessoas, mas elas fluem. A entrada e saída é
muito mais truncada do que costumava ser. Tipo, depois de meses disso, você
pensa “OK, conheço esses caras”. Eles nunca te perguntam nada existencialmente.
Só para “aparecer e gritar com pessoas”.
“Parte
disso tem a ver com a eficácia das comunidades online que, na verdade, dão uma
experiência visceral de comunidade”
Além
disso, se você se mistura com todo mundo, isso não te leva para o tipo de identidade
de oposição, um tipo de amostra sartorial como os velhos skinheads. Os
coturnos. Suspensórios. A camiseta branca. Ou na Europa, as jaquetas bomber de
seda. Calças camufladas. Esse visual te marca. E caras na Suécia,
especialmente, me disseram que quando se juntaram a um grupo skinhead, rasparam
a cabeça, conseguiram todos os acessórios e voltaram para suas escolas, as
pessoas simplesmente congelavam. Eles eram temíveis, e isso deu a eles uma
emoção real. Por essa razão, skinheads, esse aspecto do estilo skinhead, meio
que continua popular para caras que veem isso não como um movimento ideológico
mas também de identidade.
É
rotina para esses caras circular pela extrema-direita – seja online, na vida
real, ou ambos – e depois voltarem para círculos mais mainstream?
Sim,
muitos caras que saem discretamente voltam para a sociedade. Suspeito que isso
será ainda mais verdade para caras que são assimilacionistas. Vai ser muito
mais fácil conseguir um emprego, formar família, trabalhar e tudo mais.
Fiquei
surpresa em ler que algumas das pessoas que passam por esses programas para
sair do estilo de vida da extrema-direita não fazem isso porque renunciam à
ideologia, mas porque seus amigos deixaram eles apanharem ou algo particular
acontece para deixá-los insatisfeitos. É melhor para essas pessoas terem essas
visões aberrantes em segredo – e funcionar como parte da sociedade como um todo
– do que serem skinheads explícitos?
É
uma boa pergunta. Você entra porque quer um tipo de camaradagem, conexão e
irmandade, e a ideologia é acrescentada mais tarde. Então quando eles querem
sair, a ideologia pode se dissipar. [Alguns caras] passam muito tempo viajando
pelo país e falando sobre suas experiências, no que acreditavam e por quê. Acho
que tem um valor de redenção nisso. Além disso, acho que esses caras dizem que
foi uma fase e saem para conseguir um emprego.
O
que achei interessante foi a diferença entre os caras que estavam flertando com
as fronteiras do nacionalismo branco aqui nos EUA; que ainda são muito de direita,
anti-ambientais e anti-imigrantes [depois que sua “fase” acaba]; e os caras da
Suécia. Muitos deles agora votam no Partido Social Democrata porque são
ambientalistas. Eles querem proteger a natureza sueca, mas agora não
necessariamente das hordas de imigrantes e judeus que eles acreditavam que
manipulavam isso.
Você
fala muito sobre castração sendo um fator motivacional para se juntar à
extrema-direita, mas sinto que você não explora tanto o fracasso sexual e o
fato de que muitas dessas pessoas que flertam com o nacionalismo branco são só
caras que não conseguem arrumar uma namorada.
Olha,
em Angry White Men, falo sobre George Sodini [o atirador de Collier Township de
2009] e Elliot Rodger [o atirador de Isla Vista de 2014], e esses caras
começaram a assassinar mulheres porque não conseguiam transar. Elliot Rodger
ficou furioso porque ele era um cara bonito e ainda era virgem, e George Sodini
não tinha um encontro há 10 anos. Sim, claro, há casos em que você pode
rastrear isso diretamente para um tipo de fracasso sexual como um fracasso de
masculinidade.
Não
ouvi muito desse lado quando entrevistei esses caras. O que ouvi em vez disso
foi que uma das coisas que eram atraente era [os recrutadores dizerem] “Ande
com a gente, temos festas ótimas, todo mundo fica bêbado, vai ter garotas”. Mas
isso poderia ser propaganda de qualquer fraternidade para calouros de uma
grande universidade pública. É atraente para alguns adolescentes que acham que
não estão transando tanto quanto deveriam ou gostariam.
Acho
que estou curiosa em saber como você abordaria isso se visse que esse foi um
fator motivacional para entrar para a direita ou mesmo se envolver com
violência.
Você
também não pode dizer para as mulheres “Olha, se você der mais um pouco de si,
esses caras não vão se juntar aos nazistas”. Aliás, isso também funciona com a
esquerda. Tem um cartaz de 1959 com Joan Baez e Mimi Farina, duas rainhas da
beleza da música folk, e o cartaz diz “Garotas dizem sim para garotos que dizem
não”, uma mensagem contra o alistamento militar. Então esse tipo de apelo pode
funcionar dos dois lados.
“Alguns
dos caras suecos me disseram que eles davam festas, enchiam a cara, tomavam
analgésicos e saíam procurando grupos de imigrantes, antifas ou anarcopunks que
também estavam bêbados e tinham tomado analgésicos para arrumar briga.”
Sobre
isso, você acha que punks anarquistas também estão procurando restaurar a
masculinidade? Esse é tipo o outro lado da moeda?
Às
vezes sim. Alguns dos caras suecos me disseram que eles davam festas, enchiam a
cara, tomavam analgésicos e saíam procurando grupos de imigrantes, antifas ou
anarcopunks que também estavam bêbados e tinham tomado analgésicos para arrumar
briga. Acho que esses grupos procuram se envolver na mesma busca por identidade
ou demonstração de identidade, só estão de lados opostos do espectro
ideológico.
Por
que se juntar a um versus o outro? Esses grupos são de muitas maneiras
diametralmente opostos, mas como você sugere, parecem atrair um tipo similar em
alguns casos.
Similar
em processo, mas não em substância. Um cara me disse diretamente: “No meu
colégio você não podia ficar sozinho porque todo mundo estava num grupo, então
olhei em volta e você tinha os punks, os rappers, os antifas e os skinheads.
Todo mundo tinha medo dos skinheads, então me juntei a eles”. E fingir por um
minuto que seja que isso é um comprometimento ideológico elaborado vai se
mostrar uma decepção.
Tem
algum jeito de nós como sociedade fazermos mais para tornar essa opção pouco
atraente para homens jovens descontentes?
Claro,
um dos jeitos de fazer isso é através da mídia, dizendo a verdade sobre quantos
desses caras estão presos por crimes violentos e que a maior porcentagem dos
crimes de ódio são cometidos não por terroristas islâmicos, mas por
nacionalistas brancos. Alguma representação na mídia desses caras que saíram
seria muito legal. Acho que A Outra História Americana e alguns filmes feitos
sobre esses caras são muito úteis para mostrar como esse dilema se desenrola.
Quais são os verdadeiros riscos.
Allie Conti, Vice
| Tradução: Marina Schnoor
https://www.pragmatismopolitico.com.br/2018/04/extrema-direita-inseguranca-masculina.html?utm_source=push&utm_medium=social&utm_campaign=artigos
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