Sempre
que realizamos algum protesto de expressão popular sobre qualquer reivindicação
que seja (saúde, educação, direitos trabalhistas, etc) a primeira crítica que
escutamos da mídia conservadora ou quando lemos alguns comentários nas redes
sociais é de que tudo não passa de obra de um bando de baderneiros.
No
entanto, todas as nossas manifestações dos últimos anos são reivindicações de
princípios e direitos já garantidos na constituição brasileira. A baderna da
juventude que ocupa escolas e universidades, muito além de lutar por uma
educação pública de qualidade (Art. 6º da Constituição), também promove a
autonomia e a participação social e politica dos jovens, previstos tanto no
Estatuto da Criança e do Adolescente quanto no Estatuto da Juventude.
A
baderna, promovida pelos grupos feministas, é a luta pela equidade de gênero e
pela dignidade humana da mulher, da mesma maneira que a baderna realizada pelos
movimentos negros é a luta antirracista e pela igualdade. Outro exemplo é a
baderna dos sem terra e dos sem teto, que apenas lutam pela realização da
função social da terra rural e da terra urbana. Até porque, segundo a própria
constituição, a propriedade privada deve cumprir a sua função social porque
senão ela servirá apenas como mais um instrumento de acumulação de riquezas e
de promoção da desigualdade.
As
ditas badernas giram em torno do que já está garantido no papel, mas que precisa
se concretizar na vida cotidiana das minorias!
Todos
os dias, os dominantes ignoram direitos e rasgam a constituição. Em casos como
o de Rafael Braga, preso por estar com pinho sol e 0.6g de maconha - o que não
deixaria nenhum filhinho de papai de pele clara na delegacia por mais de duas
horas - é um clássico exemplo de que a lei não é aplicada para todos da mesma
maneira.
O
episódio dos 18 jovens do Centro Cultural de São Paulo (CCSP) que estão sendo
processados por estarem indo a um protesto do “Fora Temer” - que se por ironia
fosse uma manifestação pró-impeachment de Dilma Rousseff nem sequer teriam sido
abordados - é também um exemplo de desrespeito ao direito de livre
manifestação.
Os
detentores do poder, que se escondem debaixo de togas, de mandatos e de
empresas, tentam inverter os papéis da sociedade. Eles não se enxergam como
responsáveis por perpetuar as desigualdades e ainda se consideram vítimas das
ações afirmativas; entendem como regalias os direitos que são concedidos pelo
Estado aos trabalhadores mais vulneráveis. Por isso que todas as vezes que
questionamos e tomamos as ruas pela luta por direitos, o sistema contra-ataca
nos intitulando de baderneiros. Esquecem que os causadores do verdadeiro caos
são eles mesmos, que persistem na manutenção de seus próprios privilégios.
Essa
classe raivosa atropela direitos dos trabalhadores, dos negros, das mulheres e
LGBTIS. Cinicamente conseguem transformar a luta por direitos em arma de
criminalização e repressão aos movimentos sociais. Eles passam por cima do
crivo popular em seus projetos de lei, medidas provisórias e propostas de
emendas constitucionais - e de tempos em tempos golpeiam a democracia.
Particularmente
considero o adjetivo “baderneiro” muito mais como um elogio. Pois, se estamos
exigindo o compromisso com a constituição e reivindicando direitos das minorias
ainda não consolidados, significa dizer que estamos exercendo a cidadania, que
apenas se inicia nas urnas.
Mais
do que nunca é preciso ser mais baderneiro e ir às ruas, porque denunciar as
injustiças dos ordeiros e paladinos da moralidade não cabe dentro de um vídeo
de 15 segundos feito para a televisão.
Gostem
ou não, a cidadania é construída nas ruas por quem mais gera riquezas para o
país: o povo. É da cidadania plena que eles mais têm medo, porque sabem que é
através dela que podemos vencê-los. Enquanto a nossa baderna girar em torno da
luta pela justiça social, pela verdadeira democracia e pela fraternidade entre
as pessoas, estaremos no caminho certo.
Que
sejamos todos cidadãos, que sejamos mais baderneiros.
Do blog Raiva
Sacra. Por Ana Julia Ribeiro, no jornal Brasil de Fato
https://www.brasildefato.com.br/2018/02/05/que-sejamos-mais-baderneiros/
Nenhum comentário:
Postar um comentário