Nossa
prática forense diária tem nos mostrado que, infelizmente, mudança de
legislação não altera mentalidade. Explico.
Com
o advento do novo Código de Processo Civil, que passou a vigorar em 18 de março
de 2016, criou-se junto aos advogados e jurisdicionados a esperança de que não
mais teríamos decisões proferidas por mera reprodução de outra, decisões
padrões, baseadas no famoso “copia e cola”.
A
esperança era oriunda do teor do artigo 489, parágrafo 1º, incisos I a VI, do
CPC, que possui a seguinte redação:
Art.
489. São elementos essenciais da sentença:
(...)
§
1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória,
sentença ou acórdão, que:
I
- se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem
explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II
- empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto
de sua incidência no caso;
III
- invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV
- não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese,
infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V
- se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus
fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta
àqueles fundamentos;
VI
- deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado
pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a
superação do entendimento.
Destacamos
o inciso III do citado dispositivo que considera não fundamentada a decisão que
invocar motivos que se prestam a justificar qualquer outra decisão.
Com
base no citado dispositivo, passo descrever o caso específico rotineiramente
vivenciado quando da interposição do recurso de embargos de declaração.
De
acordo com o artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, cabem embargos
de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou
eliminar contradição, assim como para suprir omissão de ponto ou questão sobre
o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento da parte e para
sanar erro material1.
Na
prática, pouco ou nada tem importado a existência dos vícios referidos no
artigo 1.022 do CPC, eis que, por meio de decisões absolutamente carentes de
fundamentos, os embargos de declaração têm sido rejeitados por um motivo
bastante específico, que, diga-se de passagem, serve para justificar qualquer
outra decisão, qual seja: a suposta clareza da decisão e o “mero inconformismo
da parte”.
Para
elucidar a situação em análise, transcrevemos, na íntegra, decisão proferida
por juízo da Justiça Federal do Distrito Federal em 25/1/2018:
Cuida-se
de Embargos de declaração de fls. 58/108, evento nº 3856532, opostos pela
impetrante em face da decisão de fls. 49/52, evento nº 3819187.
Pois
bem.
Em
que pesem as alegações, não há omissão, obscuridade ou contradição, vez que a
decisão embargada foi clara, coerente e objetivamente expressa em todos os
pontos, do que se observa simples inconformismo do embargante com a conclusão
da decisão, a revelar, flagrantemente, o descabimento do presente recurso.
Pelo
exposto, REJEITO OS ACLARATÓRIOS.
Publique-se.
Registre-se. Intimem-se.
Analisando
o conteúdo da referida decisão, fica claro que sequer é possível compreender a
argumentação da embargante, ficando nítido, ainda, que a generalidade do seu
fundamento traz a possibilidade de sua aplicação/adequação a qualquer outro
caso, em nítida violação ao que estabelece o artigo 489, parágrafo 1º, inciso
III, do CPC.
Lamentavelmente,
esse padrão de decisão tem sido reiteradamente aplicado, em especial em
decisões que apreciam embargos de declaração, mostrando que, apesar de a
legislação ter sido alterada, tratando de forma expressa essa conduta como um
vício processual, na prática, a arraigada mentalidade de se esquivar de julgar
as causas como merecem os que têm sede de Justiça não sofreu alterações.
Ressalte-se
que é absolutamente passível de compreensão o magistrado decidir em conjunto
com sua assessoria, dado o elevado acervo de processos que costumeiramente
possuem os seus gabinetes, assim como eventual prazo mais longo para apreciar
determinado recurso, ante a possível carência de servidores ou magistrados para
o auxílio da tarefa. Não reside aqui nossa crítica.
O
que não se pode admitir, em verdade, são decisões com fundamentação precária ou
sem nenhuma fundamentação, as quais não entregam aos advogados e aos
jurisdicionados a tutela judicial adequada.
1
Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:
I
- esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;
II
- suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de
ofício ou a requerimento;
III
- corrigir erro material.
Odasir
Piacini Neto é especialista em Direito Previdenciário e advogado no escritório
Ibaneis Advocacia e Consultoria.
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