No
meio do caminho da direita há uma pedra: Lula. Obstinada na remoção desse
obstáculo político e eleitoral de grande monta, a revista IstoÉ, porta-voz midiático
do conservadorismo de mercado e das forças pró-restrição do desenvolvimento
democrático, deu guarida a uma matéria, assinada por Mario Vitor Rodrigues,
intitulada: “Lula deve morrer”. A perseguição contra o ex-presidente e
liderança maior do PT, implementada por uma coalizão no mínimo tácita de atores
institucionais, posicionados nos setores público e privado, mediante ações que
se encadeiam sistemicamente, alcança níveis aberrantes de irracionalidade e
sectarismo pró-exceção contra a esquerda.
Como
nunca, o Estado de direito é pressionado para ser um Estado de direita. À
democracia, o que essa coalizão, a mesma que operou o golpe, tem a oferecer é
apenas mais da mesma camisa de força vestida na presidenta reeleita por 54,5
milhões de brasileiros em 2014.
O
autor do disparate leviano e de legalidade no mínimo duvidosa, ilustre
desconhecido e arrivista franco-atirador, diz em seu artigo: “se Lula Inácio
ainda é encarado por boa parte da sociedade como o prócer a ser seguido, se
continua sendo capaz de liderar pesquisas e inspirar militantes Brasil afora,
então Lula precisa morrer”. Na exposição do argumento violento, a morte de Lula
vira uma metáfora da sua desejada derrota eleitoral, mas parece clara a
incitação ao crime.
Com
base no artigo 286 do Código Penal, o partido atingido acionará a Justiça,
instituição cuja célebre inefetividade agravou-se nesses tempos sombrios da
crise nacional, com a emergência do populismo jurídico-salvacionista, movimento
inserido na coalizão da direita neoliberal, que necessita livrar-se de qualquer
ameaça de retomada do petismo na chefia do Executivo Federal, para prosseguir
com seu projeto de Estado mínimo para os pobres e máximo para os ricos.
A
coalizão dos perseguidores de Lula reúne, sobretudo, juízes federais, ministros
do STF, promotores do MPF e procuradores do MPE em algumas unidades
federativas, como São Paulo, policiais federais, políticos de partidos
governistas, a grande mídia, o mercado financeiro (avesso ao risco PT), e os
novos grupos de direita (MBL e afins). Essas forças iniciaram uma luta de
classes de cima para baixo, das elites contra os trabalhadores e seus
representantes, no bojo da qual, além da retirada dos direitos sociais e
trabalhistas, abriga-se o ódio contra fantasmas como comunismo, bolivarianismo,
petralhas etc.
Há
uma politização orquestrada do conjunto das instituições do Estado (Executivo,
Legislativo, Judiciário e Ministério Público), tendo como porta-voz a grande
mídia, voltada à perseguição de Lula e do PT. Ou seja, tal ofensiva não diz
respeito a um ímpeto de divergência e disputa no campo democrático. Trata-se,
isso sim, de um cabedal de ações para criminalizar e aniquilar um dos maiores
partidos de esquerda, com vocação para o governo, da América Latina e do mundo.
Entrementes,
salta aos olhos que não houve um sequer panelaço ou movimento de direita nas
ruas protestando contra a “operação salva a jato” executada duas vezes, em
agosto e em outubro, pelo presidente Temer e seus aliados na Câmara dos
Deputados, para livrar o chefe do Executivo e seus ministros mais próximos de
processos no STF.
Enquanto
alguns políticos são poupados pelos seus pares, caso também do senador tucano
Aécio Neves, as arbitrariedades cometidas nessa caçada a Lula têm sido
inúmeras. Atentam contra os direitos civis, tais como: ao tratamento imparcial
e à presunção de inocência, ao juiz natural, à ciência dos inquéritos e ao
acesso pleno aos autos, ao sigilo telefônico, à preservação do sigilo de dados
pessoais, fiscais e bancários confiados aos agentes públicos, à privacidade e
preservação da imagem, de resposta nos meios de comunicação, de exercer função
pública (negado por decisão de Gilmar Mendes, no STF), de ir e vir (caso da
condução coercitiva abusiva, decidida por Moro).
Ademais,
sua sentença de condenação em primeira instância no processo sobre o triplex do
Guarujá, comemorada pelo mercado, foi criticada por inúmeros juristas pela
fragilidade probatória, apoiada basicamente na delação premiada do
ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, sem contar com qualquer testemunha que
confirmasse o conteúdo da denúncia ou com a indicação do ato de ofício que
pudesse sustentar a tese de recebimento de alguma vantagem real indevida por
parte do ex-presidente.
O
país está em um impasse político de caráter estrutural, por pôr em xeque a
efetividade da democracia como regime, cultura e sociedade. A decisão do TRF-4,
que revisará a condenação de Lula, terá grande impacto, qualquer que seja ela.
Se não houve ruptura constitucional do Estado democrático de direito, tampouco
as instituições públicas operam com isonomia. E se o grau de isonomia
institucional antes da Lava Jato já deixava a desejar, dado o caráter de fato
censitário da estrutura jurídico-política, erguida sobre um oceano atlântico de
imensa desigualdade social, agora, então, o déficit de isonomia atrofiou-se.
A
concentração proprietária e a politização dos meios de comunicação, inclusive
da revista IstoÉ, constitui outra aberração atentando contra a desigualdade
política e alimentando o déficit de isonomia das instituições públicas,
intimamente relacionado com a crise de legitimidade do Estado. O arremedo de
impeachment, alimentado pela virulenta escalada antipetista, e a farsa do
processo contra Lula, dada a motivação prévia por sua condenação, são os
pilares de um arranha-céu desdemocratizante cuja construção e alto risco de
desabamento anunciado se dão concomitantemente.
http://brasildebate.com.br/aumenta-o-desespero-da-direita-contra-lula/
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