Em
regra, duas são as principais ações que envolvem bens imóveis. São elas as
possessórias e as petitórias.
As
primeiras, como o próprio nome já diz, envolvem questões em que a posse está
sendo discutida por um possuidor, ou seja, todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. As ações petitórias, por seu
turno, envolvem questões referentes à propriedade de um imóvel. É de se
ressaltar que a posse é uma situação de fato enquanto a propriedade é uma
situação jurídica, sendo ambas protegidas pelo nosso ordenamento jurídico.
A
diferença é que nas ações possessórias, de rito mais célere, basta a
demonstração da posse sem a preocupação de exame mais profundo, bastando a
comprovação do exercício de um dos poderes de propriedade que são o uso, o gozo
ou a disposição do bem. Já as ações
petitórias, por tratarem de uma situação jurídica envolvendo o domínio, exigem ab
initio a prova de que houve a transcrição de um contrato ou uma escritura
pública no Cartório de Registro de Imóveis.
Por
ser uma situação fática, para a transferência da posse, não se exige e nem é
possível o título do possuidor, conforme o art. 167 da Lei de Registros
Públicos. Já no que concerne à propriedade de um imóvel, determina o art. 108
do Código Civil que a escritura pública é essencial à validade dos negócios
jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de
direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário
mínimo vigente no País.
Importante,
portanto, que façamos a distinção entre o juízo petitório e o possessório. No
primeiro discute-se o domínio; no segundo, a posse. No juízo petitório, por
envolver propriedade, estaremos discutindo quem tem o melhor domínio e o
proprietário conseguirá vencer a demanda, desde que comprove ter a sua
escritura pública registrada no Cartório de Registro de Imóveis, pois somente
após tal formalidade, alguém será considerado proprietário de um bem imóvel e detentor de um direito real. Já,
no juízo possessório, por envolver a posse, o autor da ação deverá comprovar o
exercício de um dos poderes anteriormente referidos, ou seja, o exercício do
uso, do gozo ou a disposição do bem.
Podemos
concluir, portanto, que o proprietário tem a faculdade de exercer os seus
poderes, enquanto o possuidor deve exercer efetivamente tais poderes, sob pena
de não ter atendido o seu pleito. Em suma, propriedade é faculdade; posse é
exercício.
Pois
bem. Nos últimos tempos estamos escutando diariamente as absurdas acusações de
que o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva é proprietário de um tal triplex
de Guarujá, sem que até agora tenham aflorado nos autos do processo provas de
que ele possuía o título translativo devidamente registrado no Registro de
Imóveis. Aliás, não comprovam sequer a posse, quanto mais a propriedade e é
isto que torna mais ridícula a acusação que imputam a ele.
Agora,
imaginemos o contrário, ou seja, que Lula resolvesse reivindicar para si o tal
triplex, já que seus acusadores afirmam com tanta veemência que ele é de sua
propriedade. Como ele seria tratado pelo ordenamento jurídico?
Evidentemente
ele não obteria êxito em nenhum dos casos; nem em uma ação possessória e nem em
uma ação petitória. Isto porque para ter seu pleito atendido no primeiro caso,
deveria comprovar o exercício de fato de um dos elementos denotadores da posse,
enquanto que no caso da ação petitória, a primeira coisa que deveria comprovar
seria o título de propriedade devidamente registrado no Cartório de Registro de
Imóveis. Assim sendo, ele fatalmente perderia a demanda e, ao final não seria
considerado nem possuidor, e muito menos proprietário do triplex. Basta
fazermos uma pesquisa jurisprudencial e teremos tal assertiva confirmada cabalmente.
Bem,
mas como existe um concerto entre segmentos putrefatos dos poderes executivo,
legislativo e do judiciário com o objetivo de evitarem que Lula venha a
concorrer nas próximas eleições presidenciais, vale tudo, até mesmo contrariar
toda a jurisprudência pátria a respeito de posse e propriedade, tudo com o
objetivo final de atingirem seus deletérios objetivos.
Apenas
um aviso aos senhores que querem deturpar estes institutos jurídicos que já
estavam bastante consolidados através dos tempos, tanto pela legislação, pela
doutrina quanto pela jurisprudência. Ao criarem este perigoso precedente, eles
poderão estar dando um tiro no próprio pé e amanhã poderão ser vítimas deste mesmo
monstro jurídico que estão ora criando.
Aliás,
vai ser divertido quando vislumbrarmos a situação embaraçosa e dispendiosa em
que serão colocadas as imobiliárias, construtoras ou incorporadoras quando se
depararem com pessoas que visitem duas ou três vezes as unidades imobiliárias que
estão à venda para decidirem sobre se vão adquiri-las ou não, ingressarem com
ações pleiteando a propriedade das mesmas pelo só fato de lá terem sido vistas
por lá algumas poucas vezes.
Vai
ser hilário, mas em se tratando de golpistas que querem eliminar
definitivamente o fenômeno Lula como adversário político, tudo de se pode
esperar, inclusive a criação desta aberração jurídica que é a propriedade sem
título translativo e sem que o nome do proprietário conste no Cartório do
Registro de Imóveis. Uma espécie de Propriedade Anônima.
Jorge
André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
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