A
palavra testemunha em grego é traduzido como mártyras, ou seja, mártires. Nunca
foi tão adequada a tradução em tempos que promotores e magistrados transformam
criminosos em testemunhas, que sob promessas de favores como redução da pena e
libertação de procedimentos ilegais como condução coercitiva, exposição na
mídia e prisões provisórias que se eternizam no tempo, se transformam em
delatores para se verem livres dos modernos procedimentos de tortura que os
transformam em mártires.
A
sanha persecutória, própria dos regimes totalitários e da quebra da
institucionalidade democrática, não está fora sequer dos tribunais, templos que
deveriam espelhar a Justiça e promover a paz social. Assisti recentemente ao
linchamento de um magistrado independente e coerente com os direitos e
garantias constitucionais, e por isso paga um alto preço institucional, julgado
por haver tido um desentendimento casual com outro magistrado com quem,
atendendo aos princípios basilares da Justiça havia se reconciliado pelo
processo da mediação.
Portanto,
não havia conflito, uma vez que nenhum representou contra o outro, ao contrário
reconheceram seus excessos, se perdoaram e se reconciliaram com um festivo
abraço na presença do presidente do Tribunal de Justiça. Ora, se não há
conflito, não há interesse em mover a cara e morosa máquina judicial. Ainda
assim, a autoridade autoritariamente promoveu procedimento administrativo
contra um e omitiu-se contra o outro. A falta de isenção na origem contaminou
todos os 12 votos raivosos que em nenhum momento analisou a falta de prova do
pseudo delito, fixando-se na pessoa a ser destruída pela máquina.
No
entanto a deusa Têmis, embora cega, tem uma imagem a zelar e mesmo em
linchamentos das pessoas faz prevalecer a justiça e a falta de quórum para a
vingança evitou a aplicação da pena tão desejada pelos algozes. Manifestações
hipócritas foram lançadas como a necessidade de uma postura na vida privada,
quando recentemente defendeu magistrado que havia apanhado da polícia por dar
carteiradas publicamente. Outro voto compara desrespeitosamente um simples
desentendimento ocasional ultrapassado por dois homens civilizados com os
crimes atribuídos ao ex-governador Sérgio Cabral, que sempre recebeu todas as
homenagens desses julgadores raivosos.
Finalmente
um dos princípios de Bangalore é o da imparcialidade que é essencial para o
apropriado cumprimento dos deveres do cargo de juiz e o principal atributo do
Judiciário. Um tribunal ou juiz deve executar suas obrigações sem
favorecimento, parcialidade ou preconceito. Quando há parcialidade, a confiança
da sociedade no Judiciário é erodida. Parcialidade é uma inclinação ou
predisposição em direção a um resultado previamente desejado, é um estado de
espírito, uma atitude ou ponto de vista que influencia o julgamento e torna o
julgador incapaz de exercer suas funções judicantes. Ocorre abuso de autoridade
quando um juiz ou tribunal perde o controle de sua própria compostura e decoro
e torna-se pessoal em relação a uma parte com quem tenha antipatia ou
divergência social ou doutrinária.
Siro
Darlan de Oliveira é desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e membro
da Associação Juízes para a Democracia.
http://www.conjur.com.br/2017-mai-04/siro-darlan-abuso-autoridade-quando-juizes-punem-ideologia
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