Lavagem
de dinheiro e obstrução da Justiça são crimes considerados de “natureza
continuada”. Por isso justificam a prisão preventiva de suposto autor, para que
ele deixe de cometê-los. Ao dizer em seu depoimento ao juiz Sergio Moro que o
ex-presidente Lula o orientou a destruir provas do pagamento de propinas ao PT,
o ex-executivo da OAS Léo Pinheiro parece ter entregado à Lava Jato uma
encomenda destinada a justificar eventual prisão de Lula. Mas como tal prisão
seria um ato insensato de Moro nesta altura dos acontecimentos, a afirmação de
Pinheiro continua sendo uma encomenda, mas com outro objetivo: demonstrar aos
procuradores, com os quais negocia uma delação premiada, que abdicou de
qualquer lealdade ao antigo amigo e tem munição para detoná-lo, acelerando a
condenação e a inelegibilidade.
É
sabido que a primeira tentativa de delação de Pinheiro foi recusada pelo motivo
óbvio mas não declarado de que, sem acusações a Lula, ela não teria o menor
interesse para a Lava Jato. É sabido que, durante vários depoimentos,
procuradores e policiais federais fizeram gestos para os depoentes mostrando
uma mão com um dedo a menos. A mão de Lula, para falassem dele.
Os
antecedentes e o contexto em que Pinheiro prestou depoimento nesta quinta-feira
reforçam a acusação da defesa de Lula, de que ele foi orientado pelos procuradores
com quem negocia sua delação, a apresentar evidências de que tem na bala na
agulha contra o ex-presidente, e talvez até mesmo a bala de prata, que viria na
delação.
É
sintomático, por exemplo, que ele tenha falado em destruição de provas quando
ninguém estava lhe perguntando sobre isso. E que o assunto nem fosse pertinente
à ação penal que motivava o depoimento. Estava em pauta o tríplex do Guarujá, e
não o pagamento de propinas ao PT. Sobre o apartamento, Pinheiro correspondeu
às expectativas de Moro, apesar das mais de 70 testemunhas que falaram contra a
tese de que o imóvel pertença a Lula, e da ausência de provas que a defesa
continua cobrando. Mas este era um tema pertinente, diferentemente do caso da
“destruição de provas”. Do nada, Pinheiro saiu-se com a história de que um dia,
um tanto irritado, Lula lhe perguntou se fizera pagamentos ao PT no exterior.
Se Lula sabia tanto dos negócios com o PT, já devia ter esta informação mas,
segundo Pinheiro, fez a pergunte e ouviu a resposta negativa. Então, orientou-o
a “destruir tudo”, caso tivesse anotações sobre os pagamentos a Vacari,
tesoureiro do PT.
Pinheiro
admite que tinha anotações mas não deixa claro se atendeu ou não ao suposto
pedido de Lula. Se destruiu ou não suas planilhas. Ou seja, entregou a
encomenda mas não se incriminou. Para a Lava Jato, basta a confissão de que
Lula mandou destruir provas, e não saber se isso aconteceu ou não.
Embora
tenha agora essa arma contra Lula, não parece provável que sobrevenha a prisão,
justamente quando o ex-presidente reforça sua condição de favorito na disputa
presidencial de 2018. Justamente quando os autores do golpe afundam-se em
denúncias de corrupção e Temer confessa a urdidura do próprio golpe. Tudo isso
vem sendo percebido pela população e pode tomar a forma de reação a uma prisão
de Lula. Moro pode usar a ameaça de prisão, e ainda outros trunfos que tenha
guardado, para debilitar a posição a performance do ex-presidente no depoimento
do dia 3 de maio, onde já chegaria inseguro e temeroso de não sair. Mas
prendê-lo agora, não faz muito sentido.
Os
interesses da Lava Jato e os da elite que manda e governa nunca foram
divergentes. Tanto é que todos os delatados tucanos e peemedebistas continuam
aí soltos, apesar das delações da Odebrecht. Relativamente a Lula, o que
importa é tirá-lo da disputa, e não criar um mártir perseguido e preso. Moro
tem pressa em exarar sua sentença condenatória para que o recurso de Lula ao
TRF-4 seja logo julgado, e assim, condenado em segundo instância, ele se torne
logo inelegível para o pleito de 2018.
http://www.brasil247.com/pt/blog/terezacruvinel/291608/Lava-Jato-recebe-a-encomenda-preciosa.htm
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