O
Supremo Tribunal Federal acaba de inventar a sentença a la carte, ou sob
medida. A lei que se aplica a Lula não é a mesma que se aplica a Moreira
Franco. Os fatos fundamentais são os mesmos, ou seja, uma suposta tentativa de fugir
da justiça de primeira instância e ganhar foro privilegiado como ministro de
Estado, mas a decisão difere em razão da personalidade do paciente da ação. Os
detalhes jurídicos são de menor importância. Para a opinião pública, estamos
diante de um esbulho do sistema jurídico hipertrofiado.
O
que impressiona em tudo isso é que a decisão relativa a Moreira Franco parece
bem fundamentada. O chefe do Executivo tem todo o direito de nomear seus
ministros independentemente de sua condição jurídica. É uma prerrogativa. A
Justiça que se vire para transformar o acusado em réu, e réu em condenado. Um
simples indiciado em processo criminal merece, em todos os sistemas
civilizados, o benefício da presunção de inocência. O grande problema é: por
que esse mesmo princípio não se aplicou a Lula?
É
claro que, no caso do ex-Presidente, o Supremo cometeu um ingerência espúria em
outro Poder da República. Pessoalmente, não acredito que a nomeação de Lula
teria alterado muito o curso da história tendo em vista as forças formidáveis
que se juntaram em favor do impeachment. Contudo, pelo menos em tese, poderia
ter havido uma mudança de rumo. Nessa hipótese, uma decisão ilegal do Supremo
favoreceu descaradamente o impeachment em favor de um partido, concorrendo para
a instabilidade em que ainda nos encontramos.
O
que fazer quando a Suprema Corte viola as bases constitucionais que deveria
proteger? Se o derretimento de sua credibilidade se acrescenta ao derretimento
inequívoco da credibilidade do Executivo, do Legislativo, do Ministério
Público, estamos diante de uma situação que, nos livros textos, prenunciam uma
revolução. É uma perspectiva terrível, pois nada seria pior para o Brasil do
que uma nação fisicamente dividida, sem perspectiva de regeneração das
instituições republicanas e totalmente afastada de um pacto nacional.
Anos
atrás escrevi um livro, “O Atentado da Nova Era”, no qual considerava que na
era nuclear a única estratégia possível para países nuclearizados era a busca
da paz, tendo em vista os efeitos da dissuasão. E afirmava, no que diz respeito
a conflitos internos em nações com elevado grau de industrialização, que neles
havia uma espécie de segundo nível de dissuasão, tendo em vista os terríveis
estragos domésticos que o armamento dito “convencional”, aplicado no conflito,
poderia causar a pessoas e propriedades.
A
despeito disso, quando nos confrontamos com a ruptura institucional de cima
para baixo, muitos tem uma espécie de nostalgia revolucionária. Entretanto,
temos que resistir a isso. A revolução líbia instigada pelos Estados Unidos
(Hillary Clinton) mostrou que um país, mesmo armado de fora para dentro e sem
uma estrutura industrial interna, pode ser totalmente destruído em situações
revolucionárias. O mesmo aconteceria com o Egito, não fosse a reação dos
militares; e o mesmo acontece com a Síria, a despeito da intervenção russa.
O
Supremo atual é o escárnio, assim como o Executivo e o Legislativo. Nossa única
salvação é a busca de legitimidade do poder civil que seja capaz de restaurar
as instituições republicanas. Falo em eleição direta em 2018, mas falo também
na possibilidade, ainda que remota, de uma eleição indireta antes disso,
ancorada num processo que garanta a plena legitimidade do que vier a ser eleito
para completar o mandato de Dilma mediante um grande pacto político. Não é nada
fácil. Mas o pior seria uma intervenção militar ou uma guerra civil.
http://www.brasil247.com/pt/colunistas/esmaelmorais/280890/A-senten%C3%A7a-a-la-carte-nas-decis%C3%B5es-do-Supremo.htm
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