Da
prisão em que se encontra em Curitiba, o ex-ministro José Dirceu escreve ao
blog Nocaute, do jornalista Fernando Morais, e destrincha a entrevista
concedida à revista Veja pelo delegado Maurício Moscardi Grillo; segundo
Dirceu, a autonomia da PF reivindicada por ele serve ao corporativismo, aos
privilégios e regalias, à politização e partidarização da Federal; "A PF
perdeu sua função constitucional de Polícia Judiciária da União quando o STF
autorizou o MPF a investigar; converteu-se em polícia do MPF sem autonomia, sem
protestar com ênfase junto à atual cúpula da PF, abandonou a corporação na luta
por sua mais importante conquista na Constituinte: ser a Polícia Judiciária da
União e o MP o fiscal da lei", diz Dirceu
Por José
Dirceu, no Nocaute
Cartas de
Curitiba – IV
Em
entrevista às Páginas Amarelas da revista Veja (edição 2513, de 18/01/17), o
delegado Mauricio Moscardi Grillo fez, na prática, uma grave denúncia sobre a
Lava Jato. Sob a capa de uma entrevista para falar de Lula e de sua ilegal,
abusiva condução coercitiva – que ele desconhece – deita falação sobre o erro
do local de condução de Lula, passa por cima do abuso de autoridade e ainda
lamenta que "perdemos o timming" para, anotem, a prisão preventiva de
Lula.
Nas
entrelinhas, o culpado: o ministro Teori Zavascki, que avocou para o STF
tudo... referente a ele (Lula). Nem uma palavra sobre outro abuso de
autoridade, gravíssimo, sobre a divulgação de um telefonema da Presidente da
República com Lula (ex-presidente), da quebra de sigilo pelo juiz Moro,
restaurado em boa hora pelo ministro relator. Que, ao contrário do delegado,
advertiu o juiz Moro. Em qualquer país ele seria afastado do processo.
O
verdadeiro objetivo do delegado não era Lula e nem mesmo a Lava Jato. Era o MPF
– que excluiu a PF da delação da Odebrecht -, e, mais do que isso a PGR, que
proibiu a PF de participar, como ele mesmo admite! O motivo? Riscos de
vazamentos. O anexo vazou, lembra o delegado, causando "enormes prejuízos
às investigações, ficamos desapontados."
Podemos
concluir que o vazamento então é de responsabilidade do MPF. Mais
especificamente da PGR. O delegado não afirma, nos dá um caminho, diz
"...e se alguém proibisse o MP de participar de uma colaboração feita pela
Polícia...". O grave vem em seguida: respondendo a pergunta da revista,
sobre se ele vê "problema nas delações feitas só com o MP", o
delegado não vacila e desqualifica totalmente o MPF. Diz que "preocupa muito
a metodologia empregada em algumas colaborações, temos que evitar colaborações
que pareçam ter caráter político", e pergunta: "...se todos os
criminosos fizerem colaboração [delação] quem ficará preso...?"
Perguntado
se "há colaborações de caráter meramente político", o delegado não
vacila e dá nome aos bois: "As delações do ex-diretor da Transpetro,
Sérgio Machado, do ex-senador Delcídio Amaral e do Nestor Cerveró me parecem
exemplos de delações sem embasamentos jurídicos sustentáveis." Para depois
afirmar que [tais delações], encaminhadas à PF eram imprestáveis, não havendo
nelas elementos indicadores de prática de crime e mais: muito do que consta
nessas três delações não passa de disse-me-disse. O delegado prossegue:
"há uma personificação de parte de alguns procuradores como heróis na
força tarefa" e que é "um erro (...) nomeá-los representantes da
operação."
Moscardi
Grillo toma fôlego, faz autocrítica por ter processado um blog que o acusava de
ter privilégios na PF, mas logo volta à carga: defende a autonomia da PF,
critica a hipótese de mudança do Diretor Geral da PF ("isso atingiria em
cheio a coordenação da operação..."); autonomia que ele prioriza como
"total" ("...não há como um ministro da Justiça interferir numa investigação
policial"). Salvo, digo eu, nos casos do Alexandre Moraes anunciar
antecipadamente as operações, como ficou provado na prisão do Palocci.
Os
brios do delegado ao defender a autonomia da PF são puro corporativismo e
escondem verdades: a PF perdeu sua função constitucional de Polícia Judiciária
da União quando o STF autorizou o MPF a investigar; converteu-se em polícia do
MPF sem autonomia, sem protestar com ênfase junto à atual cúpula da PF,
abandonou a corporação na luta por sua mais importante conquista na Constituinte:
ser a Polícia Judiciária da União e o MP o fiscal da lei, a acusação, no máximo
com poder de controle externo da Polícia e portanto do MP.
A
partir da decisão do STF, o MPF investiga, acusa, denuncia... Só falta julgar –
o que hoje, com o apoio da mídia, já acontece, dado o temor de inúmeros juízes
de decidir contra pedido do MPF.
O
delegado falou que não há interferência nas operações mesmo se elas são de
conhecimento prévio da mídia – as organizações Globo à frente –, se há
vazamentos seletivos, se o sigilo é violado, se os investigados são
pressionados a delatar. Um escárnio.
Não
há interferência maior em um processo que a violação da presunção de inocência,
do devido processo legal, do contraditório, do direito de responder em
liberdade. Interferência para o delegado é o ministro Eugenio Aragão coibir e
exigir o fim das ilegalidades da (e na) operação...
No
final patético, o delegado nega a afirmação da própria revista de que
"delegados (...) foram flagrados na rua em atos políticos da
direita", o que dá uma medida do tamanho da farsa de que ele participa e
coordena pela PF.
Melhor
para o delegado Grillo seria que ele apoiasse a demanda dos agentes e demais
funcionários – cargos e funções – da PF pela progressão na função. Hoje 10% dos
membros da PF (os delegados) controlam a Polícia e ainda querem autonomia e o
poder de indicar o Diretor Geral numa lista tríplice.
A
pergunta sem resposta é: a quem serve a autonomia e independência da PF, a
partir da experiência do MP? A resposta é fácil: serve ao corporativismo, aos
privilégios e regalias, à politização e partidarização da PF como foi no MP.
São
lágrimas de crocodilo, a única e legítima luta da PF é a reconquista de seu
papel e lugar na Constituição e no Estado de Polícia Judiciária da União,
função usurpada e sequestrada pelo MPF/PGR sob os auspícios da Suprema Corte.
Hoje
por hoje a PF é a carcereira do MPF e capitão-do-mato do Judiciário. Eis a
verdade que não cala.
http://www.brasil247.com/pt/247/parana247/277367/Dirceu-PF-virou-carcereira-do-MPF-e-capit%C3%A3o-do-mato-do-Judici%C3%A1rio.htm
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