quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

UMA HISTÓRIA ANTI-NATAL, A DOS HOMENS MAUS DA MORALIDADE. Por Fernando Brito

Nos dias de Natal, tenho publicado aqui textos que tentem nos elevar da maldade, da mediocridade e da desumanidade que teimam em nos fazer perder o gosto do milagre de cada dia.

Neste, até agora, não dá.

Porque me chega aqui uma história que é o anticonto de Natal, escrita pelo colega Pedro Ferro, do portal Gazetaweb, de Maceió.

Conta um pedaço da história de Cícero e Laís. Ele, 50 anos, de  Girau do Ponciano, no Agreste. Ela, 21, de São Luís do Quitunde, da Zona da Mata.

Mas ambos não estão mais lá, como estavam, poucos meses atrás.

Estão nas calçadas de Maceió: ele, catando latinhas; ela, pedindo esmolas nas calçadas.

São, conta Pedro Ferro, dois dos 19 mil excluídos pela fúria moralizadora dos cortes no Bolsa Família.

Teriam de levar documentos para provar o que seus retratos já provam: são muito pobres, miseráveis mesmo, que precisa de uma mão que se lhes estenda e não que os esbofeteie mais ainda do que a vida já fez.

Documentos? CPF, para eles, só se for “Certidão de Passar Fome”, que sirva para algum tecnocrata pançudo lá de Brasília convencer-se de que são apenas miseráveis e não corruptos que se locupletam com 70, 80, 150 reais por mês,  menos do que estes filhos da puta gastam numa noite restaurante, vindo igualmente do dinheiro público.

Cícero agarra um santo e reza para a família ter o que comer no jantar. Laís fica à porta dos bancos e do comércio, pedindo para as filhas, troféus dolorosos que mostra que ela, como nós, se reproduz, embora no rosto de sua filha maior o que se veja é a dor que a menor ainda não descobriu e para a mãe, talvez já nem mais lhe consiga franzir o rosto, de tão “normal” sentir.

Vidas que secaram, como eram secas as vidas de Fabiano e sua família, que minha geração conheceu pela obra de Graciliano Ramos.

E me vem um pensamento mau, lembrando o céu que sonhou Baleia, a cachorrinha dos retirantes, na hora da morte, onde havia um borralho de fogão para espantar as pulgas e preás, preás, preás da abundância que nunca teve.

Pois eu agora tento espantar do coração o desejo de que aos desgraçados que fizeram isso a esta gente sem nada o desejo que não haja calor a lhes espantar as pulgas e que, em lugar de preás, lhes assombrem as imagens de Cícero, Laís e suas filhas, as vidas pobres que eles fizeram virar  miseráveis.

Que a maldição dos pobres os persiga para sempre.

http://www.tijolaco.com.br/blog/uma-historia-anti-natal-da-maldade-humana/


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